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Quando Barbosa de Melo parou o plenário

No Governo de Cavaco Silva, em 1991/95, o então líder do Parlamento propôs alteração ao documento.
21 Outubro 2016, 08h49

Agora dedica-se ao trabalho na terra, concentrado em plantas e ervas aromáticas, mas, embora esteja afastado da vida política, não deixa de observá-la. “O poder dos deputados para mudarem o Orçamento é muito limitado. Isso só acontece quando há vontade e necessidade de criar consensos. Há aparentes discussões que não passam de entretenimento.” Daniel Campelo tornou-se protagonista na governação de António Guterres quando, à revelia do CDS e numa altura em que bastaria um deputado para fazer a diferença, aprovou Orçamentos a troco de medidas favoráveis à sua terra, em documentos que ficaram conhecidos como o do Queijo Limiano e do Mundo Rural.

Recusa falar sobre essa altura, mas diz que “cada Orçamento é uma realidade distinta e todos sofrem ligeiras alterações, alguns deles correções de última hora, por iniciativa do próprio Executivo”.

Augusto Mateus, antigo ministro da Economia, recorda que “a forma de elaboração de um Orçamento é opaca e corresponde à organização de trabalho no Governo”, sendo “difícil aos deputados uma visão global, pelo que o Parlamento faz ajustamentos pequenos e limitados”. Nada que Mateus considere negativo e argumenta: “Faz parte das democracias ter boas e coerentes políticas públicas, não podendo existir o risco de o documento se tornar uma manta de retalhos” e, para lá do que é a necessidade de consolidação orçamental, há “matérias mais finas em que uma sociedade aberta e democrática procura convergências”.

Agora, o antigo ministro identifica traços de “complicação do sistema fiscal com impostos sobre consumo, rendimento e propriedade” que podem implicar “perigos de resultado incoerente na mensagem para investidores, consumidores e cidadãos em geral”.

Duarte Pacheco (PSD) deixa vários exemplos e conta uma história: “No Governo de Cavaco Silva em 1991/95 havia a indicação de não serem aceites propostas de alteração. Barbosa de Melo, então líder da AR, foi aos Açores em deslocação oficial, viu um equipamento público em péssimas condições e deu a sua palavra de que, se não estivesse em PIDDAC, iria propor alteração. A situação não estava no Orçamento e Barbosa de Melo parou os trabalhos, só os retomando quando a alteração foi aceite.” Fala ainda sobre o Orçamento do queijo limiano e da antiga “existência do PIDDAC em que os Governos só anunciavam obras que podiam nem ter consequências”.

Dos últimos tempos recorda, “com a atual maioria, a gratuitidade dos manuais escolares no 1º ciclo; em 2015, a introdução, durante o debate, do IMI familiar com hipótese de descontos para famílias maiores; em 2014, a entrada de um coeficiente progressivo no IRS também pela dimensão familiar.” Muitas alterações chegam “dos gabinetes ministeriais, algumas relativas a gralhas, outras são grandes causas ministeriais não consagradas em Conselho de Ministros e que chegam ao debate na especialidade”. No fundo, “não há muitas aprovações de espontâneas propostas dos grupos parlamentares”.
João Almeida aponta “o limite às subvenções vitalícias dos ex-titulares de cargos políticos” como uma das medidas importantes aprovadas no contexto do Orçamento “em plena presença da troika” no país. “Fui um dos que promoveram essa mudança, mas o Tribunal Constitucional reverteu-a”, lamenta. Sobre as alterações em geral, o deputado do CDS-PP lembra que “são sempre muitas”, embora “só duas ou três assumam, de facto, caráter mais relevante”. O centrista explica que, sem maiorias absolutas, “há mais alterações quando está mais de um partido no Governo” e “as negociações são positivas, uma vez que incentivam o aprofundamento do debate”.

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