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BFA responde a António Domingues e diz que cumpriu todas as normas do setor bancário

As administradoras do BFA, Maria Manuela Moreira, Otília Carmo Faleiro e o presidente da comissão executiva, António Domingues Catana, apresentaram renúncia, depois da demissão do ex-vice-presidente António Domingues, que alertou o regulador angolano para “grave incumprimento” das normas bancárias. O BFA responde agora garantindo que cumpriu todas as normas.
Cristina Bernardo
17 Julho 2020, 14h29

O Banco Fomento de Angola (BFA) enviou uma “nota de esclarecimento” sobre as razões que motivaram a renúncia do António Domingues do cargo de Vice-presidente do BFA.

“Relativamente às notícias que têm veiculado na última semana nos meios de comunicação sobre a renúncia de António Domingues, motivada pelo indício de incumprimento grave das normas aplicáveis ao sector bancário, em particular a Lei de Combate ao Branqueamento de Capitais e do Financiamento ao Terrorismo e do Código de Conduta do BFA”, o banco angolano que é detido em 48,1% pelo BPI, veio a público justificar que a “Administração do Banco no exercício das suas funções e responsabilidades tem pautado a sua actuação em estrito cumprimento da regulamentação aplicável, nacional e internacionalmente, com particular realce ao nível do Compliance e Transparência”.

“Em resumo, as suspeitas que o BFA poderia deter sobre as questões levantadas em 2017, relativas ao branqueamento de capitais, ficaram ultrapassadas com a confirmação do cumprimento por parte do BFA dos procedimentos necessários para este tipo de operações”, detalha.

O BFA disse que é “importante reafirmar que a Administração do Banco no exercício das suas funções e responsabilidades, tem inteira confiança no trabalho realizado pelos seus colaboradores e pauta a sua actuação em estrito cumprimento da regulamentação aplicável, nacional e internacionalmente, com particular realce ao nível do Compliance e Transparência”.

Uma análise interna do BFA, divulgada pela Lusa esta semana, feita pelo departamento que assegura o cumprimento das regras internas no Banco Fomento Angola, considerou que as operações bancárias, denunciadas pelo antigo vice-presidente do banco António Domingues, revelam “falta de rigor” e fragilizam o banco.

Em causa está um depósito de 21,8 milhões de kwanzas, no dia 20 de julho de 2017, assinado por uma estudante de 23 anos de Viana, e um outro depósito de 250 mil dólares, na conta de Manuel Paulo da Cunha (‘Nito Cunha’), antigo diretor do gabinete do ex-Presidente da República de Angola José Eduardo dos Santos, tendo ambos levantado suspeitas internas.

Estas suspeitas de irregularidades foram as razões apresentadas pelo vice-presidente do BFA, detido em 48,1% pelo BPI, António Domingues, a demitir-se do cargo na semana passada, alegando irregularidades cometidas em 2017 mas que só agora terão chegado ao seu conhecimento.

“É meu entendimento de que, como membro do Conselho de Administração do banco, ao deles tomar conhecimento tenho a obrigação legal e regulamentar de dar conhecimento às autoridades de supervisão nos termos da legislação aplicável”, escreve António Domingues, que denunciou o caso ao governador do Banco Nacional de Angola numa missiva datada de 2 de julho, na qual argumenta que “os factos e as suas consequências não prescreveram”.

Cronologia dos acontecimentos

Em comunicado, o BFA descreve todos os procedimentos de forma cronológica que foram tomados em relação às operações denunciadas por António Domingues, realizadas em 2017, e que levaram, de resto, o gestor português a abandonar o cargo de vice-presidente após se ter tomado conhecimento delas apenas três anos depois de terem sido detetadas.

O BFA informa no seu ‘site’ que António Domingues e Otília Carmo Faleiro, a seu pedido, cessaram os mandatos como membros dos órgãos sociais, com efeitos imediatos, a partir de 6 e 8 de julho, respetivamente.

A administradora do BFA que é visada numa auditoria de 2017 onde foram detetadas operações bancárias suspeitas que motivaram uma denúncia feita por António Domingues – Maria Manuela Moreira – e o presidente da comissão executiva, António Domingues Catana, apresentaram renúncia, depois da demissão do ex-vice-presidente António Domingues, que alertou o regulador angolano para “grave incumprimento” das normas bancárias. Mais especificamente a 10 de julho e António Domingues Catana, na terça-feira, que foi substituído por deliberação unânime do Conselho de Administração, no mesmo dia 14 de julho, por Luís Roberto Fernandes Gonçalves.

O banco angolano explica que foi elaborado um relatório em junho de 2020 que “concluiu essencialmente que o tema das operações suspeitas foi tratado em 2017 pela administração cessante do BFA”.

Segundo o comunicado “no mês de Agosto de 2017, a Direcção de Auditoria e Inspecção do BFA, produziu uma informação na qual versava sobre duas operações bancárias realizadas num dos seus Centros de Investimento, em que tiveram intervenção, directa e indirectamente, a responsável do Centro e a Administradora do pelouro, a data dos factos”.

O BFA avança que em maio de 2020, 33 meses depois, por via do Presidente da Comissão Executiva do BFA, António Domingues Catana, a Administração tomou conhecimento dessa informação, e o Presidente do Conselho de Administração (PCA) do Banco, Rui Jorge Carneiro Mangueira, solicitou que fossem feitas as diligências necessárias e a elaboração de um relatório circunstancial a respeito do assunto.

O relatório elaborado em junho de 2020 “concluiu essencialmente que o tema foi efectivamente tratado no ano de 2017 pela Administração cessante do BFA, que tendo recebido de forma tempestiva os esclarecimentos achados necessários da Administradora, Maria Manuela Martins Moreira, visada na mencionada informação da Direção de Auditoria Interna, concluiu não existirem razões que levassem a duvidar, na altura dos acontecimentos, da sua idoneidade, decidindo-se pelo arquivamento do processo”.

Na sequência das conclusões do segundo relatório elaborado em Junho de 2020, o Conselho de Administração do BFA em sessão realizada no dia 6 de Julho de 2020, “deliberou pela não reabertura do citado processo”.

No entanto, no dia 6 de Julho de 2020, o Conselho de Administração do BFA tomou conhecimento da carta que António Domingues, Vice-presidente do Banco, “endereçou à S.Excia Governador do BNA – Dr. José Lima Massano, apresentando um relato sobre o incumprimento grave das normas aplicáveis ao sector bancário, em particular a Lei de Combate ao Branqueamento de Capitais e do Financiamento ao Terrorismo e do Código de Conduta do Banco, relacionados com as duas operações bancárias acima citadas e que tiveram lugar no ano de 2017”, diz o banco angolano em comunicado.

A sequência cronológica continua e o BFA relata que no dia 6 de Julho de 2020, o Vice-presidente do Conselho de Administração, António Domingues, em carta endereçada ao PCA do BFA, apresentou a sua renúncia como vogal do Conselho de Administração do BFA. E que em face desta situação, seguiram-se os pedidos de renúncia, com efeitos imediatos, da posição de vogais do Conselho de Administração do BFA por parte de Otília Carmo Faleiro, no dia 8 de Julho de 2020, de Maria Manuela Moreira, no dia 10 de Julho de 2020 e do CEO António Domingues Catana, no dia 14 de Julho 2020.

Antes, a 10 de Julho de 2020, o Departamento de Conduta Financeira do BNA, notificou o Banco de Fomento Angola, sobre o início de uma inspeção pontual a partir daquela data, “pelo que nesta altura assumimos já ter começado, esperando que os seus resultados confirmem as decisões tomadas em 2017 pela Administração do BFA, por não existirem dúvidas do rigor imposto pela Comissão Executiva do Conselho de Administração e pelos Colaboradores em geral, no cumprimento das normas de prevenção ao Branqueamento de Capitais e Financiamento ao Terrorismo”, refere o BFA.

No dia 14 de Julho de 2020, por deliberação unânime, o Conselho de Administração nomeou Luís Roberto Fernandes Gonçalves, “para exercer as funções de Presidente da Comissão Executiva do Banco de Fomento Angola – BFA, com efeitos imediatos”. O novo CEO “é funcionário bancário desde 1996, tendo desempenhado no Banco de Fomento Angola várias funções de direcção, foi Presidente da Comissão Executiva da BFA Gestão de Activos e Administrador Executivo do Banco BCS”.

Isto é, o BNA já instaurou uma inspeção ao BFA, que o banco espera “confirme as decisões tomadas em 2017 pela administração” do banco.

Na auditoria do BFA feita em 2017, é dito que uma gerente do Banco Fomento Angola (BFA) disse que depositou 250 mil dólares em notas na conta de Manuel Paulo da Cunha, ‘Nito Cunha’, antigo chefe de gabinete do ex-PR de Angola José Eduardo dos Santos a mando de Manuela Moreira. Essa mesma gerente esteve envolvida numa operação de depósito no valor de 21,8 milhões de kwanzas, cerca de 33 mil euros, na conta de uma estudante de 23 anos, sem razões para ter esse dinheiro. De acordo com o relatório de auditoria de 2017, as verbas são da agora ex-administradora Manuela Moreira, que terá instruído uma gestora e essa gerente do banco a utilizarem a verba para a aplicação no BFA Oportunidades, um produto financeiro disponível à época.

O BFA tem uma maioria de capital da operadora móvel angolana Unitel (51,9%), cabendo ao banco português BPI (48,1%) o restante.

Em 2019, a Unitel passou para as mãos da petrolífera estatal angolana Sonangol, afastando a empresária Isabel dos Santos do controlo da operadora.

Desse modo, a empresária, filha do ex-presidente angolano José Eduardo dos Santos, deixou de controlar indiretamente a gestão do BFA, culminando o processo com a nomeação do ex-ministro Rui Mangueira para presidente do conselho da administração, sucedendo a Mário Leite Silva, que renunciou ao cargo em janeiro.

 

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