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Bom para lá, mau para cá

É ver os elogios ao rigor e boas práticas dos outros, verdadeiramente exemplares, e a inevitável constatação sobre a “bandalheira a que isto chegou” cá no burgo.
7 Fevereiro 2018, 07h15

Foi ontem anunciado que um membro do Governo Britânico apresentou a sua demissão após ter chegado atrasado 2 minutos ao Parlamento. Como é evidente sucederam-se nas edições online e redes sociais as maiores manifestação de júbilo, com elogios à seriedade, verticalidade e idoneidade do Político. O mesmo se passa quando, de tempos a tempos, há notícias de servidores da coisa pública, quase sempre nórdicos, que se demitem ou são demitidos por factos tão graves como a despesa excessiva em café por parte do seu gabinete, ou por ter tirado uma fotocópia para o trabalho da escola do filho.

É ver os elogios ao rigor e boas práticas dos outros, verdadeiramente exemplares, e a inevitável constatação sobre a “bandalheira a que isto chegou” cá no burgo. Nem escapa uma ou outra voz envergonhada a lembrar que “no tempo do Salazar isto não acontecia”, ou que “no PC não há cá essas ligeirezas”. O pior é quando os eventos se aproximam de nós. Já nem me vou referir ao súbito assomo patriótico, de até então conhecidos internacionalistas, quando esses mesmos estrangeiros exemplares tentaram que importássemos algumas normas de transparência procedimental, aquando dos anos da Troika, e à cascata de acusações de “intromissão” , “colonialismo” que se sucederam. Basta ver quando um Secretário de Estado gasta uns dinheiros a mais em livros e se esquece de os deixar no gabinete quando sai do cargo. Ou quando uma empresa energética que recebe rendas avultadas convida o tutelar governativo para ver a bola às suas expensas. Ou quando o Ministro pede uns bilhetinhos para ver o Glorioso, na mesma altura em que concede perdões fiscais de milhões ao eterno líder do clube. “Irra, também pegam com tudo!”. “Já não se pode gostar de bola!”. “É um ataque ao nosso Glorioso!”. “Foram só uns livrozinhos!”.

Confesso que me custa esta diferença de avaliações, entre os “exemplos” exteriores, saudados, e a benevolência face ao pequeno “jeitinho” da paróquia. Vejamos o caso de Centeno que, já agora, não tem nada a ver com o (também meu) Benfica. A questão dos bilhetes pouco me interessa. O fundamental é que, com ou sem bilhetes, faz algum sentido conceder um favorzinho a um empresário que tem vindo a ser anunciado como um dos maiores devedores ao antigo BES? E que até foi favorecido com uma solução no mínimo benevolente por parte dos atuais responsáveis pela instituição financeira, convidando o próprio filho do devedor a fazer parte de um fundo para gerir os ativos associados à dívida, cujo gestor será um homem de estrita confiança, e subordinado hierárquico, do devedor. Parece anedota. Centeno, entretanto ilibado de responsabilidades, soubemos igualmente ontem num processo de invulgar rapidez, mostrou total inabilidade, não pelos bilhetes, sublinho, mas por todo o envolvimento do caso.

Mas os defensores da demissão do Governante Britânico são os mesmo que acusam de demagogia e politização da justiça, ou justicialização da política, o caso Centeno. O mesmo sucede, na Madeira, com as sucessivas desculpas, algumas delas comprovadas mentiras, de Paulo Cafôfo, para fugir ao escrutínio político da Casa da Autonomia, a Assembleia Regional, relativamente à tragédia do Monte . Os mesmos que o desculpam, e que nem se ofendem com o facto da vereadora Idalina ter ignorado pura e simplesmente a convocatória para a audição parlamentar, são aqueles que se insurgiam colericamente contra o desprezo com que anteriores executivos regionais igualmente votavam a primeira instituição Autonómica. Talvez por excessiva proximidade e sintonia com os visados. Talvez por mais facilmente se colocarem na posição do “acusado”. “Podia ser eu”- pensarão –“ e não tinha mal algum”. Quem se regozija com os “2 minutos britânicos”, não pode ter outra bitola para o casos de trazer por casa.

Por fim quero assinalar o meu primeiro ano de colaboração, nestes escritos, com o Económico. É um gosto escrever nestas páginas.

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