O julgamento do caso BES teve início esta terça-feira, 15 de outubro, 10 anos depois do banco então liderado por Ricardo Salgado ter caído. A primeira sessão do maior processo da justiça portuguesa foi dedicada às exposições introdutórias do Ministério Público e da defesa dos arguidos, o mesmo se passará nas sessões desta quarta-feira.
A primeira sessão do julgamento do caso BES foi marcada por protestos realizados por vários lesados no Campus de Justiça, onde cerca de dois mil lesados reclamam 330 milhões de euros, assim como pela presença do antigo banqueiro, que ficou conhecido como o “dono disto tudo”.
O antigo presidente do grupo Espírito Santo, Ricardo Salgado, marcou presença na primeira sessão, depois do pedido da defesa para extinguir ou suspender o processo criminal contra o ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES) devido ao diagnóstico de Alzheimer ter sido rejeitado pelo tribunal.
A sua chegada ao tribunal foi acompanhada pela sua mulher e pelo seu advogado, Francisco Proença de Carvalho, tendo sido abordado por lesados, no entanto, o ex-banqueiro estava visivelmente alheado da realidade.
No início do julgamento procedeu-se à identificação dos arguidos, no entanto Ricardo Salgado, o primeiro a ser identificado, teve algumas dificuldades. Perante as complicações comunicacionais do antigo presidente do BES é lhe permitido que não esteja presente no restante julgamento, sem prejuízo de poder ser chamado em momentos específicos.
A defesa de Ricardo Salgado apresentou um requerimento para anular o início do julgamento, uma vez que considera que o tribunal não “pode julgar um arguido que sofre de doença de Alzheimer só porque o nome do arguido é Ricardo Salgado e aparece nos jornais”, avançou a “CNN Portugal“.
Ricardo Salgado é acusado de 62 crimes no âmbito do mega-processo “Universo Espírito Santo”, entre os quais associação criminosa, corrupção ativa, falsificação de documento, burla qualificada e branqueamento.
Além de Ricardo Salgado foram também identificados os arguidos Manuel Fernando Espírito Santo primo de Salgado, Amílcar Morais Pires, antigo administrador financeiro do BES, Etienne Alexandre Cadosch e Michel Charles Creton, cidadãos suíços com ligação à Eurofin, entre outros.
Nas declarações iniciais o Ministério Público defende que o governo do GES foi assumido de “forma autocrática” por Ricardo Salgado. A procuradora referiu também que “aquilo que o Ministério Público se propõe a provar é que os arguidos efetivamente executaram os factos da acusação”.
Já Raul Soares da Veiga, advogado do braço direito de Salgado, Amílcar Morais Pires, declarou que o seu cliente não cometeu nenhum crime, apenas irregularidades, que podem ser puníveis como contra-ordenações. Nas palavras do advogado, Amílcar Morais Pires era um “bombeiro de serviço”, uma vez que ia “apagar fogos”. “Mas não foi ele a atar o fogo, foi apagá-lo”.
José António Barreiros, advogado de Manuel Fernando Espírito Santo, referiu nas declarações iniciais que o seu cliente “foi um ingénuo útil” no processo que levou à queda do universo BES. Manuel Espírito Santo é acusado de oito crimes, todos de burla qualificada.
O primeiro dia de julgamento teve duas sessões diárias, uma às 9h30 e a outra às 14h30. Esta quarta-feira a sessão vai decorrer da mesma forma, sendo que faltam ouvir exposições de oito arguidos do processo, e está marcado para o fim da tarde a audição das declarações de Ricardo Salgado no inquérito.
Além de Ricardo Salgado, vão a julgamento Amílcar Morais Pires, Manuel Espírito Santo Silva, Isabel Almeida, Machado da Cruz, António Soares, Paulo Ferreira, Pedro Almeida Costa, Cláudia Boal Faria, Nuno Escudeiro, João Martins Pereira, Etienne Cadosch, Michel Creton, Pedro Serra e Pedro Pinto, bem como as sociedades Rio Forte Investments, Espírito Santo Irmãos, SGPS e Eurofin. No total o processo conta com mais de 733 testemunhas e tem agendadas 14 sessões, até 29 de outubro.
Ricardo Salgado sem consciência do julgamento
Visivelmente alheado da realidade, Ricardo Salgado chegou e saiu do tribunal agarrado à mulher, dando rosto ao que vinham sendo os alertas da defesa: o ex-presidente do BES não tem noção do que está a acontecer.
“O relatório médico, atual, é perfeitamente claro quanto à dependência do Dr. Ricardo Salgado para as tarefas mais básicas (higiene) e que a presença dele no tribunal seria irrelevante, porque não tem capacidade cognitiva para responder a questões complexas – e, como dizem os senhores jornalistas, este é o processo mais complexo da nossa história – e que a anterior sessão tinha tido efeitos negativos na evolução da doença”, explicou o advogado Francisco Proença de Carvalho, em declarações aos jornalistas.
Já diante do coletivo de juízes, Ricardo Salgado identificou-se perante a justiça, com o nome completo, porém ter-se-á enganado a dizer a morada, segundo a defesa. Também disse mal o nome da sua mãe e a data de nascimento e não percebeu quando lhe perguntaram se queria que o julgamento decorresse na sua ausência, de acordo com o “Jornal de Notícias”. À saída, o advogado de Ricardo Salgado lamentou que o tribunal tenha ignorado o relatório médico sobre a doença de Alzheimer, o que abre “uma página negra na justiça portuguesa, pelo menos, diante de todo o mundo”.
O quadro clínico de Ricardo Salgado não evitou o confronto com um lesado do BES, que se dirigiu ao principal arguido deste caso, por volta das 09h25, com críticas: “O senhor deixou um documento escrito a dizer que existia uma provisão. Onde é que está a provisão?”, começou por questionar este lesado do BES. “Estou sem o meu dinheiro. Exijo a provisão que é dos lesados. Muita sorte, estou por si mas alguém tomou conta da sua vida”. O episódio levou a que, depois, saísse fora do alcance das câmaras (e dos lesados).
Sobre o caso, Francisco Proença de Carvalho reiterou que “o BES não foi uma associação criminosa”. “Isso é uma invenção processual. Foi um banco com presença em muitos países, que ajudou muitas PME e pessoas, criou empresas e trabalho… Mesmo entre os lesados, não é unânime. É fácil culpar uma só pessoa”, defendeu, reconhecendo que “certamente, houve erros” da gestão do BES e do próprio Ricardo Salgado, mas também erros dos poderes públicos.
Calendário do julgamento:
16 de outubro | 17 de outubro | 18 de outubro | 22 de outubro | 28 de outubro | 29 de outubro | |
Manhã (9h30) | Exposições introdutórias | Identificação e declarações dos arguidos que as desejem prestar – Testemunhas: António Ricciardi (gravação com duração de 1h 30m) |
Pedro Queiroz Pereira (gravação com duração de 2h 15m) | .Fernando Ulrich .Sikander Sattar |
.Inês Neves | .Fernando Antunes .Sílvia Gomes |
Tarde (14h) | Exposições introdutórias | José Maria Ricciardi | Ricardo Pires | Continuação Sikander Sattar | Continuação Inês Neves | Continuação de Sílvia Gomes .Fernando Henriques |
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