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Centeno diz que a decisão de sair “foi construída juntamente com o primeiro-ministro”

“Qualquer economista pode gostar” de ser governador do Banco de Portugal, admitiu. Sobre eventuais incompatibilidades com a função de governador, nomeadamente poder ter de decidir sobre temas que implementou enquanto ministro das Finanças, Centeno ironizou com uma pergunta: “depois de ser presidente do Eurogrupo e ministro das Finanças quais são os cargos que me reserva sem incompatibilidades nesse critério que acabou de elaborar?”.
12 Junho 2020, 00h35

No dia em que anunciou a saída do Eurogrupo, Mário Centeno deu uma entrevista à RTP3, onde abre o jogo em relação à sua disponibilidade para ir para Governador do Banco de Portugal. “Qualquer economista pode gostar” de ser governador do Banco de Portugal, confessou o ainda ministro das Finanças, ao mesmo tempo que admitiu que não existe qualquer incompatibilidade na passagem de ministro das Finanças para a liderança do Banco de Portugal. Centeno realçou mesmo que não existe nenhuma lei noutro país que impeça um ministro das Finanças de ir para o banco central.

Esta esta terça-feira, depois da demissão de Centeno, foi aprovada na generalidade, no Parlamento, uma lei que impõe um período de nojo de cinco anos para exercer a função de governador.

“Durante mais um mês serei presidente do Eurogrupo e voltarei ao Banco de Portugal”, disse Centeno que assim admite que só voltará ao Banco de Portugal depois de 13 de julho.

Mário Centeno disse na entrevista que o lugar de Governador do Banco de Portugal é um “cargo que é muito importante para o país”, que “não vai perder importância ao longo dos próximos anos” e portanto é um cargo que “qualquer economista pode gostar de desempenhar”. “Só estou a qualificar o cargo”, clarificou.

“Sou funcionário do Banco de Portugal”, disse Mário Centeno.

“A escolha de quem será o próximo governador do Banco de Portugal é uma decisão que compete ao próximo ministro das Finanças e ao Governo, não me compete a mim”, disse Mário Centeno em entrevista, admitindo que já falou do assunto com o primeiro-ministro. O ministro das Finanças que irá propor o sucessor de Carlos Costa é João Leão, que Centeno apelidou de “colega e amigo”.

Sobre eventuais incompatibilidades com a função de Governador, nomeadamente poder ter de decidir sobre temas que tratou enquanto ministro das Finanças, Centeno ironizou com uma pergunta: “depois de ser presidente do Eurogrupo e ministro das Finanças quais são os cargos que me reserva sem incompatibilidades nesse critério que acabou de elaborar?”.

“Não há nenhum país que eu conheça que tenha esse tipo de incompatibilidades escritas em normas, ser governante não é propriamente um cadastro”, disse Mário Centeno.

À pergunta sobre o que vai fazer com o capital político que acumulou, Centeno disse que não tem ambições políticas neste momento.

Sobre a saída agora disse que “eu estive concentrado em todas as tarefas que tive de executar até agora”, disse Mário Centeno cuja exoneração já foi aceite pelo Presidente da República. Centeno lembrou que esteve à frente do Ministério das Finanças durante 1.664 dias que acumula com 912 dias como presidente do Eurogrupo.

“É o fim de um ciclo” disse Centeno para justificar a sua saída nesta altura, ao mesmo tempo que lembrou que “teve um relevo e uma importância, ainda não devidamente reconhecido, o facto de o Ministro das Finanças de Portugal ocupar a presidência do Eurogrupo”. Centeno disse mesmo que “foi uma vitória em termos de reconhecimento e de credibilidade”.

Centeno falou da expressão “contas certas” e da importância disso para o reconhecimento de Portugal na Europa. As “contas certas” levaram Centeno à presidência do Eurogrupo em janeiro de 2018. Apresentou a sua saída de Ministro das Finanças no dia em que faz aprovar o primeiro e único orçamento suplementar (ou rectificativo).

“Hoje temos uma credibilidade na nossa política económica e na política orçamental que infelizmente não tínhamos há quatro anos e meio”, considera Centeno que invocou, mais uma vez, a “estabilização do sistema financeiro”.

Esta data de saída resulta de um diálogo com o primeiro-ministro, disse Mário Centeno que fez questão de esclarecer que as “leituras que têm sido feitas” da relação com o primeiro-ministro, “foram descontextualizadas”, pois “não houve nenhuma deterioração dessa relação, nem podia haver, nem seria sério”.

Até novembro de 2014 Centeno e Costa nunca se tinham cruzado pessoalmente, mas depois trabalharam intensamente, relatou o ministro demissionário. Sobre se há uma má relação com António Costa, Centeno disse que  “não há nenhuma possibilidade”, porque enquanto ministro das Finanças com o primeiro-ministro fizeram cinco orçamentos e agora o orçamento suplementar. “Obviamente que  os orçamentos têm escolhas que são feitas por quem lidera o Governo. O Ministro das Finanças limita-se a tentar enquadrar financeiramente escolhas que todos tínhamos decidido colectivamente”.

“Nada mudou do ponto de vista político, nada mudou do ponto de vista pessoal” sublinhou Centeno sobre a relação com António Costa. “Espero que não volte a acontecer em Portugal” uma situação em que o ministro das Finanças esteja de costas voltadas com o primeiro-ministro, salientou Centeno numa subtil alusão ao corte de relações entre Teixeira dos Santos e José Sócrates antes da vinda da troika.

Centeno defende que a relação de um ministro das Finanças com o chefe do Governo é uma relação “saudavelmente tensa”.

Sobre o episódio do Novo Banco, em que António Costa tinha dito no Parlamento que o empréstimo do Estado ao Fundo de Resolução, previsto no Orçamento, de 850 milhões só iria ser entregue depois da auditoria da Deloitte, que será concluída em julho, tendo o Ministério das Finanças feito a transferência em maio, cumprindo o que está contratado, Centeno disse que foi à Residência Oficial clarificar uma situação que estava a tomar grandes proporções públicas.

“Essa conversa decorreu de forma muito construtiva” disse rejeitando que tenha decidido sair nessa altura.

Sobre a intervenção de Marcelo Rebelo de Sousa, Centeno foi claro em dizer que “não tem uma relação profissional” com o Presidente da República, tem apenas uma “relação institucional que é operada através do primeiro-ministro”.

Recorde-se que quando foi anunciada a saída de Mário Centeno na página da Presidência da República, foi dito que o Presidente “recebeu do primeiro-ministro as propostas de exoneração, a seu pedido, do Ministro de Estado e das Finanças” .

“Tivemos sempre ao longo do tempo uma relação muito leal, muito franca e transparente, como não podia deixar de ser”, disse ainda. “Nesta vontade [de sair do Governo] também não divergimos”, referiu Centeno.

“Não está escrito em nenhum livro como se fecha uma economia, e muito menos como se reabre uma economia”, disse o economista Centeno, sobre a crise da pandemia.

Voltou a dizer o que já tinha dito sobre António Costa Silva que não o conhece e que nunca falou com o homem que o primeiro-ministro escolheu para elaborar o Plano de Recuperação da Economia. “Mas a decisão e a escolha  [de António Costa Silva] foi debatida dentro do Governo, onde eu participei, e no final todos concordámos”, disse. Costa Silva vai coordenar esse plano de recuperação que terá incidência “nos orçamentos seguintes”.

“Demonstrámos ao longo deste anos que não existe dicotomia entre economia e finanças”, reforçou.

“Os instrumentos que a Europa criou e a situação de partida de Portugal permite-nos ter a expectativa de que o trabalho possa ser concluído” sem austeridade, disse o ex-ministro que se gaba do primeiro excedente em democracia.

“Não podemos voltar a estigmatizar o setor público”, disse Centeno.

Sobre os 1,2 mil milhões para a TAP, Centeno falou das dificuldades que atravessam as companhias aéreas. A TAP recorreu ao empréstimo de emergência autorizado por Bruxelas, que tem de ser de maturidade limitada, e entretanto vão ter de estudar a melhor forma desse empréstimo vir a ser devolvido. O esforço deve ser conjunto com os acionistas privados, disse o ainda responsável pela pasta das Finanças.

Se o setor privado acompanhar este apoio não haverá alteração da estrutura acionista da TAP.

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