Jorge Cardoso, CEO do CaixaBI, foi o protagonista de um painel, sob a forma de entrevista, na Advisory Summit 2025, que decorreu esta quarta-feira em Lisboa, na Universidade Católica.
Na entrevista, mostrou-se otimista em relação ao mercado de M&A em Portugal para o segundo semestre e para 2026, defendendo o papel dos novos projetos de infraestruturas para a economia do país e também para os bancos de investimento.
Defendeu ainda do papel do private equity na criação de dimensão nas empresas, bem como o papel do mercado de capitais como forma eficiente de alocação de recursos.
Sobre a venda do Novobanco, elogiou a entrada de um grupo francês na banca em Portugal.
O mercado transacional continua a cair em Portugal. Entre janeiro e maio, concretizaram-se 198 negócios de fusões e aquisições (M&A), o que representa uma queda de 25% em relação aos mesmos cinco meses de 2024. O que está a provocar a queda das operações de fusões e aquisições em Portugal?
Eu diria que o que está a acontecer no mercado português está em linha com o que se passa no mercado global. De facto, tivemos em 2024 um bom ano de aquisições. Tínhamos todas as expectativas de que 2025 seria ainda melhor. Na realidade, surgiram alguns sinais de alerta que se podiam ou não materializar e acabaram por se materializar com grande violência. Acredito que o principal factor foi a alteração da política dos Estados Unidos em relação às tarifas, no mês de abril, o famoso Dia da Libertação, que fez com que, nesse mês, o mercado fechasse. Quer se queira, quer não, o M&A tem por detrás a necessidade de financiar a transação e de gerir as expetativas e estas foram substancialmente alteradas. Já tínhamos tido um primeiro choque em março, quando os alemães anunciaram a necessidade de aumentar a despesa em defesa, e, portanto, as taxas de juro a longo prazo deixaram de descer (o que reduziria o custo de capital). O choque fiscal na Europa vai levar a défices em vários países e as taxas a longo prazo serão mais altas. Apesar de tudo, a boa notícia é que o mercado caiu mas não caiu quanto poderia ter caído e tem-se aguentado. Em Portugal, ainda acresce o tema da instabilidade política, com as eleições, que introduziram alguma incerteza.
Acabamos por assistir a algumas operações em Portugal, como a venda do Novobanco, mas também fora de Portugal, onde o Santander acaba de comprar ao Sabadell o britânico TSB Bank. Grandes operações estão a ser feitas; já os negócios mais pequenos, os negócios de oportunidade, aí sim temos o problema das avaliações não estarem a atingir os níveis desejados. Ainda no outro dia ouvimos que os fundos de private equity estão a enfrentar dificuldades na saída das empresas, porque as avaliações não estão a atingir os níveis pretendidos.
Mas eu continuo otimista quer para 2025, quer para 2026.
Quais os negócios que vão marcar a segunda metade do ano e 2026, na sua opinião?
Este ano tivemos, de facto, o anúncio de uma grande transação, a venda do Novobanco, que vai aumentar o volume de M&A, pois é a maior transação em termos de equity value que me recordo no mercado português.
A TAP avança este ano?
Vamos ter de aguardar, houve desenvolvimentos recentes com a entrega das avaliações e o processo está a avançar.
Olhando para as fusões na banca, os bancos estão hoje mais valorizados e a gerar um excesso significativo de capital. Isso é um catalisador de fusões no setor? Podemos dizer que as equipas de gestão dos bancos europeus têm agora mais motivação e os meios para se envolverem em fusões e aquisições estratégicas?
A banca é um setor um bocadinho diferente dos outros. Foi um setor que, durante muitos anos, não gerou retorno face ao custo de capital. Um setor onde tardou a haver criação de valor. Neste momento, a banca está a ter retornos normais, mas não acho que tenha um retorno excecional.
Foi um setor que fez o seu caminho e está finalmente a ser reconhecida a criação de valor.
O driver para ter escala acrescida é a entrada na tecnologia e na Inteligência Artificial. Acho que sim, é um setor onde estamos a assistir e acho que vamos continuar a ver alguma consolidação. Temos a OPA em Espanha do BBVA ao Sabadell, que, na minha opinião, vai acabar por acontecer.
Em termos de cross-border, assistimos à entrada de um grande banco francês em Portugal, o que eu considero positivo para a economia.
Os múltiplos inerentes à compra do Novobanco pelo BPCE são elevados, como disseram os bancos portugueses? Ou, pelo contrário, estão em linha com o mercado?
Sobre os múltiplos do Novobanco, eu diria que estão na banda alta, mas não são irrazoáveis.
A banca é um setor que evolui muito em linha com o que se passa no PIB de um país.
O Governo atual, que é o mesmo que o anterior, definiu projetos de infraestruturas rodoviárias considerados prioritários, nomeadamente o novo aeroporto, novos eixos ferroviários e rodoviários, e o túnel entre Algés e Trafaria. Nos próximos anos, podemos esperar um mercado dinâmico para a banca de investimento e assessoria financeira?
Os grandes projetos são boas notícias para o país e deverão ter um retorno relevante para a economia. O novo aeroporto é uma infraestrutura necessária. O novo hospital também, e a ferrovia é igualmente importante. Assim sendo, são boas notícias para os bancos de investimento e para os financiadores desses projetos.
Em Portugal, o tecido empresarial é composto essencialmente por PME, muitas delas empresas familiares. É fácil fazer operações de fusões e aquisições com PME num contexto de aumento da dimensão das empresas? Os fundos de private equity podem ter aqui um papel compensador pela falta de capital no mercado português? Há mais aceitação para os fundos de private equity ou continuam a ter o estigma de fundos abutres? Em Portugal, ao contrário de outras geografias, as empresas familiares ainda são avessas a deixar entrar fundos de private equity no seu capital porque consideram isso um sinal de falhanço?
Quando o capital está concentrado e há uma dimensão familiar onde o fundador é o dono, às vezes há alguma emoção envolvida, e não vale a pena escamotear, mas essa situação tem que ser gerida. Acho que, quando o fundador e o dono se confundem e quando há um tema familiar, essa emoção pode ser um bocadinho superior e pode complicar. Mas acho que se pode fazer M&A, não considero que o facto de uma empresa ser pequena ou familiar seja um impedimento. Já quanto aos private equities, acho que esse estigma de fundo abutre já passou ou está a passar. Já foi desmistificado esse estigma. Ter uma parte de uma coisa maior é melhor do que ter 100% de zero.
Salvam as empresas…
Exatamente. Acho que a designação de fundos abutres é um sinal de iliteracia financeira. No final do dia, o que interessa é se a empresa é recuperada. Essa ideia de que o empresário vê a entrada de um private equity no seu capital como um falhanço acho que já passou. Temos vários casos de sucesso. O falhanço é não saber sair a tempo ou não saber dar uma saída às empresas.
O ecossistema do private equity cresceu.
A Comissão Europeia tem o projeto de desenvolver mercados de capitais integrados – a par de um sistema bancário integrado – a União da Poupança e do Investimento. Bruxelas defende que a União da Poupança e Investimento pode estabelecer uma ligação eficaz entre as necessidades de poupança e de investimento. O que lhe parece este projeto da comissária Maria Luís?
É uma iniciativa muito meritória; vamos ver se da iniciativa à prática o caminho é feito. A Europa tem uma boa taxa de poupança, tem grande disponibilidade de capital, e uma grande parte desse capital ou é investido em outros mercados, como nos Estados Unidos, ou fica, de alguma maneira, em produtos que não são tão produtivos como podiam ser. Eu acho que essa iniciativa é positiva. Acredito genuinamente que o mercado de capitais é uma forma mais eficiente de alocar recursos.
O mercado de capitais não é especulação; é alocação de capital. Os investidores tomam riscos, que é o que têm de fazer. Sem investir, perdemos todos.
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