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CGD: Créditos para compra de ações? “Isso era uma doença”, diz antigo ROC

Antigo revisor de contas da CGD assegura que enviava relatórios às Finanças e BdP sobre análise de contas do banco público, onde constava informação sobre créditos para compra de acções que, diz Manuel de Oliveira Rego, “era uma doença” no banco público.
2 Abril 2019, 18h02

Antigo revisor de contas da Caixa geral de Depósitos (CGD) assegurou nesta terça-feira, 2 de abril que na informação que enviava relatórios sobre a situação do banco público,  trimestralmente ao Ministério das Finanças e anualmente ao Banco de Portugal. Nesses relatórios, Manuel de Oliveira Rego, adianta que ia informação sobre créditos para compra de acções. Uma prática que, diz, “era uma doença” na Caixa.

“Nesses relatórios consta esta informação. Apresentávamos uma lista das situações, com a exposição e colaterais desses empréstimos”, revelou Manuel de Oliveira Rego, Revisor Oficial de Contas (ROC) da CGD até 2016, na II comissão parlamentar de inquérito à gestão da Caixa, criada após a divulgação do relatório de auditora da EY que concluiu por créditos ruinosos superiores a 1,6 mil milhões de euros entre 2000 e 2015.

Quando questionado pelo deputado do PCP Paulo Sá sobre a constituição de créditos para compra de ações do BCP por parte da CGD, Manuel de Oliveira Rego ironizou: “Isso era uma doença quando os BCP [acções] estavam a 15/16 euros”.

Recorde-se que,  entre 2000 e 2015,foram vários os investimento da Caixa que acabaram por se revelar ruinosos para o banco estatal. Mas a aposta da instituição financeira no BCP acabou por ser a  fatura mais pesada  com o banco público a perder  559 milhões de euros.  De acordo com as conclusões da auditoria realizada pela EY a 15 anos de gestão da CGD, nem os dividendos na ordem dos 40 milhões de euros conseguiram compensar este investimento no banco privado.

“Não só detetámos como monitorizámos todas essas situações de uma forma discriminada, toda a vida desses empréstimos, a descida forçada desses colaterais e a constituição das respetivas provisões”, disse Manuel de Oliveira Rego, acrescentando que foi apresentada à tutela “uma lista das situações com a respetiva evolução que tinham”, tendo o Ministério das Finanças sido chamado à “atenção para a evolução dos colaterais desses empréstimos”.

“Nós fazíamos o nosso trabalho, está consubstanciado em relatórios trimestrais devidamente desenvolvidos, obrigatoriamente apresentados ao Ministério das Finanças, à secretaria de Estado do Tesouro, em todos os temas que podiam ter repercussões presentes ou futuras sobre o capital da sociedade” entre 2000 e 2007, disse Manuel de Oliveira Rego, da Oliveira Rego & Associados, na Assembleia da República.

No caso das informações enviadas às Finanças, o antigo ROC esclarece os deputados que eram analisadas “sistematicamente as datas do conselho alargado de crédito” e verificado “se a concessão de crédito percorria todo o processo previsto nas normas internas da CGD”.

Já sobre informação enviada ao BdP, Manuel de Oliveira Rego explica: “no âmbito da análise de sistemas de controle interno, fazíamos uma seleção de processos, dentro das regras de auditoria, e analisávamos um a um onde é que faltavam os documentos, porque efetivamente faltavam, por vezes”.

O ex-ROC revelou que em 2008 enviou um parecer ao Banco de Portugal “com oito anexos”, em que identificava “145 deficiências” nos processos internos da CGD.

Manuel de Oliveira Rego assegurou ainda aos deputados que o Banco de Portugal (BdP) nunca contactou aquele órgão de fiscalização na sequência de alertas para o risco de “fraudes e erros” na concessão de crédito, que surgiram em 2007, e que apontavam para “situações de excepção” que foram comunicadas ao supervisor em relatórios anuais.

“Diretamente nunca foi contactado. Depois soube por interposta pessoa que, nos últimos anos, [o BdP] contactou a administração da Caixa relativamente a algumas situações de excepção”, disse Manuel de Oliveira Rego, em resposta à deputada centrista, Cecília Meireles, sobre se o supervisor alguma vez contactou o antigo ROC que foi o responsável por aqueles alertas.

A deputada do CDS-PP pretendeu ainda saber qual foi “a interposta pessoa” que deu a informação ao antigo ROC sobre os contatos posteriores entre o supervisor e a administração da CGD na sequência das situações de excepção que foram assinalados nos relatórios enviados anualmente ao BdP por aquele órgão de fiscalização externa, mas a resposta surgiu com um “não me lembro”.

De imediato ouviram-se gargalhadas dos deputados, pois, momentos antes, Manuel de Oliveira Rego tinha assegurado que “aqui não há falta de memórias”, porque a sua  sociedade de ROC fez o seu trabalho. Uma garantia em referência ao controlo das normas internas que não eram cumpridas na concessão de crédito e que foram identificadas no relatório de auditoria da EY à gestão da Caixa entre 2000 e 2015, período em que os créditos ruinosos geraram perdas superiores a 1,6 mil milhões de euros.

 

 

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