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Cinco maiores bancos tinham 22,6 mil milhões em dívida pública portuguesa em 2018

O FMI disse na semana passada que “num cenário grave, aumentos agressivos nas yields das obrigações dos governos iriam gerar perdas significativas para bancos da EBA [Autoridade Bancária Europeia] em Itália, Portugal e Espanha, em particular”.
  • Cristina Bernardo
15 Abril 2019, 07h42

Esta semana o FMI veio alertar para o excesso de dívida pública no balanço dos bancos portugueses. A dívida pública tem um grande peso no balanço das instituições financeiras nacionais, sendo que a grande maioria é dívida pública portuguesa.

Dizia a instituição liderada por Christine Lagarde que a ligação financeira entre o risco soberano e os bancos está reforçada em países mais endividados. O FMI constatou que “as carteiras de títulos do governo nos sistemas bancários domésticos, em percentagem do total dos ativos, são maiores em vários países, particularmente na Bélgica, Itália, Portugal e Espanha”, e alerta para o facto de num “cenário severo, as subidas acentuadas das yields das obrigações soberanas poderem gerar perdas significativas para os bancos em Itália, Portugal e Espanha, em particular”.

O alerta foi dado num relatório do FMI intitulado “Global Financial Stability Report: Vulnerabilities in a Maturing Credit Cycle”.

Segundo os últimos dados do Banco de Portugal a percentagem da dívida pública portuguesa no total de ativos dos bancos portugueses é de 8,8% e tem vindo a subir desde 2014.  O regulador do setor bancário adiantou no último Relatório de Estabilidade Financeira de 2018, que o ativo total do sistema bancário aumentou 0,2% face ao 3.º trimestre de 2018,  decorrente do aumento de 1% da carteira de títulos de dívida (em particular, títulos de dívida pública).

Quando se analisa o valor absoluto da carteira de dívida pública verifica-se que os cinco grandes bancos portugueses acumulavam 22,6 mil milhões de euros de títulos de dívida soberana portuguesa no final de 2018.

O Novo Banco em 2018 apresenta um aumento da carteira de títulos de dívida pública de 1,4 mil milhões de euros para 7,3 mil milhões (o que inclui dívida portuguesa). No que respeita ao investimento na dívida pública portuguesa, em 2018, o banco investiu mais 579 milhões, elevando o investimento na dívida pública nacional para 4,4 mil milhões.

Já o Santander Totta, na informação que data de 31 de dezembro de 2018, tinha em carteira 4.535 milhões de euros de dívida pública, das quais 4.233,5 milhões eram em dívida portuguesa e 301,5 milhões em dívida pública espanhola.

O banco revela ao Jornal Económico que essa exposição já desceu, e “à data de hoje [passada quinta-feira], a exposição do Banco à dívida pública é de 4.062,5 milhões (dos quais 3.761 milhões em dívida pública portuguesa e 301,5 milhões de dívida pública espanhola)”.

O maior banco privado português, o BCP, em dezembro de 2018, tinha em carteira 13 mil milhões em dívida pública (uma subida de 67% face a dezembro de 2017), das quais 6,6 mil milhões eram dívida portuguesa (o que traduz uma subida de 82% face à carteira em dezembro de 2017) e dentro desta, 5.755 milhões de euros eram Obrigações do Tesouro – OT (3.051 milhões em dezembro de 2017) e 853 milhões eram Bilhetes dos Tesouro – BT (dívida de curto prazo). O banco liderado por Miguel Maya subiu 89% o investimento em OT em 2018 e em BT aumentou 46%. As restantes dívidas soberanas eram de países como Polónia e Moçambique.

A CGD tinha em 2018 cerca de 6 mil milhões em dívida pública portuguesa, da qual 2.992 milhões era dívida de longo prazo e o resto em Bilhetes do Tesouro (curto prazo). A Caixa tinha ainda 3.577 milhões em dívida pública estrangeira.

O BPI apresentou em 2018 um investimento de dívida pública de curto prazo de 500 milhões de euros (Portugal), com maturidade média residual de seis meses, e de médio e longo prazo de 2,6 mil milhões de euros das quais, dívida de Portugal 34%; de Espanha 40% e de Itália 27%), com maturidade média residual de 2.0 anos.

Isto é, em dívida portuguesa (em ambos os prazos) a exposição do BPI era de quase 1,4 mil milhões.

Um trimestre antes, em setembro de 2018 o BPI tinha 686 milhões de dívida italiana, mil milhões de dívida espanhola e 1,7 mil milhões de euros de dívida soberana portuguesa” em carteira, afirmou o presidente do BPI, Pablo Forero, na apresentação dos resultados para os primeiros nove meses do ano. “É dívida de curto prazo. Ou seja, com maturidade inferior a três anos”, referiu.

O Banco de Portugal no seu Relatório da Estabilidade Financeira de 2018 já tinha lançado o mesmo alerta. “O sistema bancário português continua a concentrar uma parte significativa dos seus ativos em dívida pública
e em ativos relacionados com o setor imobiliário”, dizia.

Ao nível das vulnerabilidades, o BdP destacava que “continua a ser a elevada concentração do sistema bancário português em determinadas classes de ativos. Em particular, assinala-se a exposição a títulos de dívida pública (12,7% do ativo total dos bancos residentes em junho de 2018), sobretudo sob a forma de títulos emitidos pelo soberano doméstico (cerca de 9% do ativo total), que tem apresentado uma trajetória ascendente, continuando a destacar-se como uma das mais elevadas na área do euro”.

Desde 2011, o sistema bancário português tem também aumentado a sua exposição a títulos de dívida pública de outros países da área do euro, nomeadamente Espanha e Itália, disse o supervisor no mesmo relatório. A banca portuguesa tinha, em setembro do ano passado, cerca de dois mil milhões de euros em dívida pública de Itália, que foi alvo de downgrades de rating entretanto.

O Banco de Portugal alertava também que “num contexto de incerteza geopolítica e de potencial reavaliação dos prémios de risco, esta exposição representa uma vulnerabilidade para o sistema bancário português. Adicionalmente, e na medida em que as variações das yields dos títulos da dívida soberana europeia se encontram positivamente correlacionadas, os ganhos de diversificação poderão ser limitados. No mesmo sentido, tem-se observado um alongamento da maturidade média residual da carteira de títulos de dívida pública, aumentando também por esta via a exposição dos bancos ao risco de taxa de juro na ausência de cobertura”.

“A exposição à dívida pública dos bancos residentes [títulos de dívida e empréstimos] representa cerca de 15% do activo total, da qual 11,6% do activo total respeitando a títulos de dívida”, assinalava o Relatório de Estabilidade Financeira, de Junho de 2018, apresentado pelo Banco de Portugal. Apenas olhando para a carteira de títulos de dívida pública, a percentagem tem aumentado consecutivamente desde 2010. Em 2016, a percentagem estava em torno de 10%, tendo avançado perto de 1 ponto percentual no ano seguinte.

Aqui, o peso da dívida pública nacional é elevado, o que mostra uma “concentração” na dívida soberana portuguesa. O valor investido em dívida portuguesa correspondia a 8,4% dos activos totais das instituições nacionais, no final de 2017, dizia aquele relatório do BdP.

O FMI salvaguarda no seu relatório publicado na semana passado, que há alguns factores que lhe escapam na análise. Dos quais o mais importante é que alguns bancos poderão já estar a transferir os títulos do tesouro a longo prazo da sua carteira de disponível para venda (onde é exigido o mark-to-market do preço das obrigações) para a carteira  held-to-maturity (ou seja, em que a carteira de obrigações é detida até à maturidade), o que limita a perdas na carteira de títulos, apesar de também reduzir a flexibilidade dos investimentos.

Recorde-se que o princípio inerente à criação da União Bancária foi precisamente divorciar o risco soberano do risco bancário.

 

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