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CMVM, Banco de Portugal e ASF na nova autoridade de resolução

A reforma da supervisão financeira inclui a criação de uma autoridade de resolução bancária que vai ter na administração dois membros do BdP, um da CMVM, um da ASF e um quinto, que virá de fora.
23 Fevereiro 2019, 16h00

A proposta de lei da reforma da supervisão financeira prevê a criação de uma autoridade de resolução bancária autónoma, tal como defendeu o Banco de Portugal nos seus últimos comentários ao modelo proposto pelo Ministério das Finanças. Mas ao contrário do que sugeriu o supervisor bancário, na primeira consulta pública, essa autoridade não será liderada pelo ministro das Finanças, mas continuará a ser liderada pelo Banco de Portugal, que é atualmente a autoridade de resolução em Portugal.

A novidade é que, segundo sabe o Jornal Económico, o conselho de administração dessa autoridade de resolução será composto ainda por um elemento da CMVM e por outro da ASF – Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões.

O conselho de administração da Autoridade de Resolução será também composto por dois membros do Banco de Portugal (um dos quais será o presidente)  e ainda por um quinto administrador que será cooptado por decisão do Conselho Nacional dos Supervisores Financeiros (CNSF).

Esta é a arquitetura que pretende salvaguardar a independência dos processos de venda de bancos que foram alvos de Resolução (em Portugal já foram dois, o BES e o Banif).

Ao contrário do que chegou a defender o Governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, as competências de resolução bancária e posterior venda dos bancos de transição ou dos seus ativos, não saem afinal da esfera do supervisor da banca, hipótese colocada em cima da mesa, no passado, quando foi anunciada a intenção de rever o sistema de supervisão financeira.

Assim, o BdP vai apenas deixar de tutelar sozinho os bancos ou veículos que resultem de resoluções bancárias, como o Novo Banco (que resultou da resolução do BES) e a Oitante (que ficou com alguns ativos do Banif).

O BdP vai passar a partilhar essa tutela com os dois supervisores financeiros.

Esta é a arquitetura final do modelo de supervisão que surgiu depois de um primeiro período de consulta pública, no qual vários supervisores deram pareceres. Essa consulta decorreu a seguir à apresentação das conclusões do grupo de trabalho (liderado por Carlos Tavares e que incluía ainda Siza Vieira, atual ministro da Economia), em setembro de 2017.

O BdP concordou, na altura, com a manutenção de três supervisores, assim como com a passagem da função de autoridade de resolução para um organismo independente, mas defendeu que devia estar num organismo independente, liderado pelo ministro das Finanças, que funcione junto do próprio banco central. Já a CMVM afirmou que quer estar envolvida em futuros processos de resolução de bancos, pelo impacto que têm no mercado financeiro, e mostrou-se contra a criação de uma nova entidade de supervisão financeira. A ASF, por seu turno, defendeu a manutenção dos três supervisores e a autonomização da supervisão macroprudencial e das funções de resolução e considerou que as soluções precisam de ter em atenção todos os setores, não demasiadamente focadas no setor bancário.

Esta Autoridade de Resolução vai ainda passar a liderar a gestão do Fundo de Resolução, competência que, atualmente, cabe ao vice-governador do BdP, Luís Máximo dos Santos.

O Fundo de Resolução foi criado em 2012 com a missão de prestar apoio financeiro às medidas de resolução aplicadas então pelo BdP, na qualidade de autoridade nacional de resolução. Atualmente, o fundo tem 25% do capital do Novo Banco e ficou responsável por suprir futuras necessidades de capital que resultem do impacto de perdas registadas em ativos mais problemáticos que foram destacados no balanço do banco, na medida em que essas perdas penalizem os rácios impostos pelo regulador.

O Fundo é também chamado a pagar despesas com comissões e juros de empréstimos anteriores, que foram contraídos para financiamento da medida de resolução aplicada ao BES e das medidas de resolução aplicadas ao Banif.

Novo modelo de supervisão: CSNF com presidência rotativa

A nova versão da reforma de supervisão financeira prevê a criação do Conselho Nacional  dos Supervisores Financeiros (CNSF), que será uma entidade de coordenação reforçada de colaboração e troca de informação entre supervisores financeiros. Esse órgão, contrariamente ao que foi veiculado, será presidido de forma rotativa pelos três supervisores, que assumirão a presidência por um ano.

O board do CNSF, que será uma entidade com personalidade jurídica, será composto por dois membros de cada um dos supervisores financeiros e ainda por um sétimo administrador, nomeado pelo Governo, e o único a trabalhar em exclusivo para esta entidade.

O CNSF terá recursos humanos e financeiros próprios, mas caberá aos três supervisores a responsabilidade de elaborar o orçamento e serão estes supervisores que decidirão como será financiada. Neste ponto, o mais provável é a criação de uma taxa a pagar pelas entidades supervisionadas para financiar essa nova entidade, que terão de ser aprovadas, por unanimidade,  pela CMVM, BdP e ASF.

O sistema português de supervisão financeira é constituído por três reguladores setoriais – Banco de Portugal (BdP, supervisor bancário),  Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (regulador dos seguros) e Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (regulador dos mercados).

O Negócios noticiou no passado que o Governo quer também impor um período de nojo, tanto à entrada (três anos), como à saída (dois anos) dos mandatos desempenhados em autoridades de supervisão. Isto impede que os administradores dos supervisores tomem decisões sobre entidades com quem tenham tido um vínculo contratual ou prestado serviços nos três anos antes. Também ficam impedidos, durante dois anos, de  ocupar cargos de gestão que impliquem tomar decisões sobre entidades supervisionadas.

O Governo quer também obrigar os reguladores a desfazerem-se de instrumentos financeiros relacionados com entidades supervisionadas. O Jornal Económico sabe que estas medidas mantêm-se na proposta que está atualmente nas mãos do supervisores financeiros e do BCE.

O ministro das Finanças, Mário Centeno, anunciou recentemente à Lusa, que “o Conselho de Ministros já fez uma primeira apreciação do processo, que dará entrada na Assembleia da República no fim do período de consulta aos três reguladores nacionais e ao BCE”. Centeno disse, na Comissão de Orçamento e Finanças sobre a Caixa Geral de Depósitos, que a “reforma do modelo de supervisão está na última fase do processo”, estando em curso uma nova consulta, quer aos supervisores financeiros nacionais, quer ao BCE, que tem a supervisão dos bancos sistémicos portugueses. O ministro disse também que “essa consulta durará até 11 de fevereiro”, sendo que depois disso a proposta irá a Conselho de Ministros para aprovação, seguindo para a Assembleia da República. Mas, tal como o Jornal Económico noticiou na semana passada, o BCE esta semana pediu mais tempo ao Ministério das Finanças para dar o seu parecer à reforma da supervisão financeira. O Governo vai ficar à espera do parecer do BCE, revelou fonte.

No início de 2017, o ministro das Finanças levou o tema ao Parlamento, defendeu que a coordenação entre supervisores fosse um dos pilares das mudanças a serem feitas no sistema português de supervisão do setor financeiro. Centeno expôs então os traços gerais do que deveria constar da reforma, nomeadamente a criação de uma nova entidade que ficasse com a responsabilidade da supervisão macroprudencial (que salvaguarda a estabilidade de todo o sistema financeiro e previne riscos sistémicos).

Artigo publicado na edição nº 1975 de 8 de fevereiro do Jornal Económico

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