A COP28 deveria ser a COP da credibilidade. Esta deveria ser a COP dos compromissos políticos fortes alinhados com a urgência da crise climática, rumo à limitação do aquecimento global a 1,5oC e à eliminação dos combustíveis fósseis – já que os esforços neste sentido têm sido, lamentavelmente, insuficientes.
Depois de Copernicus (Serviço Europeu de Observação da Terra) anunciar que 2023 foi o ano mais quente da história, e de a ONU apontar no seu 1º Relatório do Balanço Global do Acordo de Paris que os atuais compromissos climáticos assumidos vão conduzir a um aumento de 2,5oC até ao final do século, os resultados da COP28 passaram a ser determinantes para demonstrar que (ou se) ainda podemos confiar nos acordos multilaterais.
Razões para duvidar não faltavam. Senão, vejamos: uma Cimeira do Clima nos Emirados Árabes Unidos, um dos maiores exportadores mundiais de petróleo; uma COP cujo presidente é CEO de uma empresa petrolífera e que, durante a Cimeira, desafia a paciência dos negociadores ao dizer que a proposta de abandonar os combustíveis fósseis não é baseada em ciência e que isso nos levaria de volta à era das cavernas; uma COP com recorde de presenças de lobistas do petróleo e do gás e com três vezes mais participantes deste setor do que em 2022, que já havia sido o maior da história.
Isto sem falar dos conflitos e crises humanitárias que estão a acontecer em Gaza e na Ucrânia, e que, entre muitas outras questões, também colocam o multilateralismo em causa.
Tínhamos, de facto, muitos motivos para duvidar da utilidade e eficácia da Cimeira do Clima da ONU. Mas o que era impensável a poucos dias do fim da COP28 aconteceu, e foi um verdadeiro ponto de viragem que marcou 30 anos de negociações e tentativas de consenso entre agendas climáticas.
O texto final aprovado pelo plenário convoca os países-membros a adotarem “a transição dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos, de uma forma justa, ordenada e equitativa, acelerando a ação nesta década crítica, de modo a atingir zero emissões líquidas até 2050”.
Ainda que a linguagem de eliminação gradual dos combustíveis fósseis tivesse a preferência de ambientalistas e cientistas, temos de reconhecer que, pela primeira vez em décadas, a menção clara a este tipo de combustível foi feita e de lá já não pode sair.
Existem ainda outros problemas na linguagem do acordo, como o uso de tecnologias de captura e armazenamento de carbono, que são extremamente questionáveis, e a inclusão do gás como combustível de transição. De facto, este não foi o acordo perfeito. Muitos pontos ficaram de fora, ou foram insuficientemente abordados, como as metas de adaptação, o financiamento do fundo de perdas e danos, entre muitos outros.
Neste momento, o aumento da temperatura média global já é de 1,2o C. Se quisermos garantir a sobrevivência da espécie humana num planeta com condições minimamente razoáveis, mantendo 1,5o C como meta, todos temos de trabalhar árdua e incessantemente para reduzir as emissões em 43% até 2030. Não será fácil, mas esta COP, e sobretudo os contínuos esforços da sociedade civil a colocar pressão nos governos, demonstraram que o impensável é possível.