A Comissão de Trabalhadores da CGD decidiu enviar um memorando sobre a gestão do banco “para conhecimento de todas as entidades governativas e ao poder legislativo instituído na Assembleia de República”. Este périplo continuará, após as férias, com audiências nas Comissões Parlamentares e a expectável atenção quer do ministro das Finanças, tutela da Caixa, quer do primeiro-ministro de Luís Montenegro, promete a Comissão de Trabalhadores.
A justificação é que a CT entende que a Caixa Geral de Depósitos, como uma instituição do sector bancário pública, “tem de prestar contas, por via da tutela do Ministério das Finanças, aos poderes eleitos e ao país, englobando os clientes da Caixa e todas as populações, tecido da sociedade portuguesa onde o serviço público bancário é requisito obrigatório”.
A lista de acusações é vasta e é, antes de mais, o reflexo de uma “guerra aberta” entre a Comissão de Trabalhadores e a gestão executiva da CGD.
A Comissão de Trabalhadores (CT) fala em “assimetrias e ações discricionárias que se tornaram cultura imposta na CGD de hoje, ao contrário do olhar social e de solidariedade, bem como medidas não discriminatórias e transparentes que antecederam a supra mencionada liderança” e dá dois exemplos que considera “pertinentes”. Um é a política de distribuição de lucros que vigorou até 2016, onde, dizem, “não havia critérios opacos de elegibilidade geradores de descontentamento da maioria dos trabalhadores e outra é o facto demonstrativo da política salarial, de 2016 até hoje, onde se registou um aumento de custos para os órgãos sociais (220,3%) comparando com uma diminuição do custo de (-19,6%) no que respeita às remunerações destinadas aos trabalhadores, responsáveis pelo lucro atual na CGD”.
“Na sequência de pedidos de audiência, solicitados em 2022 e reiterados após a composição do novo quadro parlamentar em 2023, a CT reuniu com todos os Grupos Parlamentares e deputados únicos na Assembleia da República (exceto o PAN), bem como com a Presidência da República no sentido de expor a perspectiva dos trabalhadores da CGD sobre a vida interna da empresa e a postura da Comissão Executiva (CE), liderada desde 2016 por Paulo de Moita Macedo, abordando as suas implicações para a CGD e os seus trabalhadores”, aponta a CT.
A CT fala de uma “difícil situação de relacionamento entre os trabalhadores e esta gestão, a sua vertente desequilibrada e fracturante no que respeita ao ambiente social que se vive de forma agravada na CGD desde finais de 2016 até ao momento”.
A Comissão de Trabalhadores faz acusações tais como, a “informação de como os lucros são obtidos”. A CT diz que os lucros da Caixa são obtidos “sobretudo por via de operações financeiras (ROF), venda de pacotes mobiliários e imobiliários a baixo preço, reversões de imparidades contabilizadas acima das necessidades em exercícios anteriores, prestação de serviços de venda comissionada em produtos não bancários, operações de crédito alavancadas nas taxas mantidas em vigor pelo BCE e pela liquidez elevada que restringe financiamento a custos relevantes e ainda com racionalização de custo operacionais, de estrutura e sobretudo custos de pessoal baseados em remunerações complementares e prémios discricionários, sendo o salário o valor que mais é reduzido quando comparado com o ano transato”.
A CT diz que há degradação e diminuição da estrutura orgânica de agências a prestar serviço público bancário às populações e fala em “mapa elucidativo desta redução drástica e contínua, sendo que igualmente diminuída por via de processos de transformação de agências, com perda de todas as capacidades operacionais, em locais de trabalho sem condições de atendimento e baseados nos automatismos de utilização pelo cliente, mesmo em locais onde existem défices de literacia e dificuldades de manuseamento destes meios, sem olhar a fatores sociológicos e demográficos, como sejam a interioridade, a insularidade ou o analfabetismo que ainda atinge muitas dessas áreas geográficas diminuindo a coesão territorial”.
A CT aponta a “redução exponencial do quadro de pessoal onde, desde 2016 se encontram em vigor planos de saídas de trabalhadores por via de reformas antecipadas e rescisões (por acordo ou por iniciativa do trabalhador) num contexto em que a contratação e retenção de quadros é extremamente reduzida, tendo como principal consequência a situação insustentável dos locais de trabalho, sobretudo a rede de agências, que estão cada vez mais reduzidos e sem meios de dar resposta plena às necessidades dos clientes e das populações no acesso ao pleno serviço bancário a que o Banco Público, pela sua missão obrigatória atribuída pela Tutela e Governo, tem de dar resposta e garantia de cumprir”,
A Comissão de Trabalhadores, que manifestamente não gosta do CEO do banco e respetiva gestão executiva, fala ainda em “tipologias de assédio que persistem na CGD e que, não obstante a sua existência no passado, foi acelerada e diferenciada na sua prática de forma mais evidente e visível, refletida em procedimentos jurídicos de trabalhadores que sofrem no dia-a-dia da empresa por via das más práticas de gestão no que respeita à relação laboral que deveria ser transparente e sã, mas que por diversas formas impacta na vida profissional dos trabalhadores e não amiúde influencia a sua vida pessoal e familiar gerando um quadro de instabilidade, insatisfação, revolta e desmotivação que se tem como consequência por exemplo as baixas por doença e um número cerca de dez vezes maior de rescisões unilaterais por iniciativa do trabalhador comparativamente com as que se verificam com o acordo com a CGD”.
O memorando enviado ao Governo fala de “congelamento de carreiras dos trabalhadores da CGD (quatro anos entre 2013 e 2016) não tendo a CGD corrigido em 2017 esta ação, quando do descongelamento imperativo pelo Orçamento de Estado de 2017, considerando que este congelamento de progressões foi de imediato imposto aos trabalhadores da CGD, fundamentado pela aplicação imperativa dos OE de 2013 a 2016, mesmo sem instruções da tutela e sem questionar a condição de bancários da CGD, pois todos os outros bancos foram poupados a este “contributo” para o País e mesmo algumas empresas de capitais públicos também não foram englobados no esforço nacional”.
As “assimetrias de remuneração na CGD com preponderância para as remunerações complementares e as ambiguidades de remunerações ou benesses que não constam nem se enquadram no quadro legal do Código de Trabalho ou no teor dos Acordos de Empresa em vigor”, é outra das queixas da CT.
O memorando tem também “informação sobre o incumprimento reiterado e abusivo da legislação vigente que se encontra espelhada nas dezenas de queixas efetuadas à ACT (Autoridade das Condições de Trabalho) com diversas tipologias de violação da lei que vão desde o incumprimento dos direitos das CT plasmados na lei 7/2009, pela violação de normas do Acordo de Empresa acordado com a CGD pelas estruturas sindicais e até pela utilização do quadro de normativo interno em que se cumpre consoante o proveito para a gestão da CGD”.
A vasta lista de queixas da administração executiva da CGD à tutela, inclui ainda uma acusação de “violação dos direitos da Comissão de Trabalhadores emanados do Código de Trabalho e da Constituição da República Portuguesa, num quadro de desrespeito por décadas de relacionamento elevado entre as Comissões de Trabalhadores e as Administrações nomeadas para a gestão da CGD, retirando direitos e condições de exercício pleno da atividade da CT, no que respeita ao contacto com os trabalhadores e à verificação das condições de trabalho onde existe implantação e presença da CGD, no Continente e nas ilhas”.
A CT diz que sente “segregação dos trabalhadores eleitos para a CT no apoio e suporte à sua legitima intervenção, procurando interferir ao arrepio da lei e impedir o exercício das tarefas de controlo de gestão e dos incumprimentos variados que exerce de forma arbitrária sobre os trabalhadores nos locais de trabalho”.
A CGD não comentou.
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