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Compliance Fiscal em operações de M&A – a diferença entre o fracasso e o sucesso

Pensar globalmente mas agir localmente será a chave do sucesso. Este é um aspeto essencial numa era global em que as multinacionais estão dispersas por todo o mundo, para não haver surpresas no momento de concretização de operações de M&A.
2 Novembro 2019, 19h00

Tradicionalmente as multinacionais tem usado operações de restruturação e de concentrações de atividades empresariais, como as fusões e aquisições (vulgo M&A) para aumentarem a sua escala num mundo cada vez mais global, ao mesmo tempo que reduzem gastos e conseguem sinergias.

Muitas vezes a definição estratégica destas operações ocorre a um nível global, mas os impactos locais devem depois ser analisados e antecipados por equipas pluridisciplinares cada vez mais diversificadas, não apenas na fase de planeamento, mas também aquando da implementação, para que as operações de M&A sejam concretizadas com sucesso, nas suas diversas vertentes, nomeadamente no que respeita ao cumprimento de obrigações fiscais.

Pensar globalmente mas agir localmente será a chave do sucesso. Este é um aspeto essencial numa era global em que as multinacionais estão dispersas pelo globo, para não haver surpresas no momento da concretização de operações de M&A.

Por exemplo, no caso português, os aspetos fiscais regulatórios são bastante específicos, e a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) tem sido pioneira na digitalização da função fiscal, pelo que é premente assegurar o cumprimento de todas as formalidades e prazos aplicáveis, sob pena de estas operações se tornarem mais onerosas do que o inicialmente estimado, ou de se criarem riscos fiscais facilmente detetáveis, ao invés de os mitigar.

A correta e atempada concretização e formalização das obrigações fiscais associadas a operações de M&A pode evitar muitos gastos desnecessários com coimas, juros ou outras penalidades, perdas de benefícios fiscais, de prejuízos fiscais reportáveis, de regimes de neutralidade fiscal, entre outros.

Por exemplo, antes da aquisição de uma entidade, é relevante que seja efetuada uma verificação do cumprimento das obrigações fiscais, sob pena de se estar a “adquirir” contingências fiscais referentes a anos que estejam abertos para inspeção. Face à cada vez maior quantidade de dados para analisar, a utilização de ferramentas tecnológicas nesta área de Compliance fiscal é determinante para a qualidade dos resultados alcançados.

Aquando da implementação de uma operação complexa, como uma fusão ou a extinção de uma entidade, existem prazos para entrega de declarações que são antecipados, prazos para pedir reembolsos de pagamentos especiais por conta ou reembolsos de IVA que podem ser “perdidos”, prazos para apresentar requerimentos ou fazer comunicações à AT, prazos e mais prazos, a cumprir por uma entidade local ou por um contabilista certificado (CC) em Portugal que podem nem ter estado envolvidos nestas decisões globais.

São vários os exemplos de operações M&A planeadas ao detalhe em que não se consegue fazer o registo do início de atividade de uma nova entidade junto da AT, porque não nomearam um CC, ou um representante fiscal.

Ou operações, em que uma decisão de última hora de transferência de fundos entre entidades para assegurar uma transação, tomada por uma tesouraria central que não esteve envolvida na operação, tem implicações significativas em impostos locais menos comuns, como é o caso do imposto do selo em Portugal.

Esta falta de coordenação entre equipas, ou a menor importância por vezes dada ao “compliance fiscal” – aspetos como o cumprimento de prazos ou o correto preenchimento de declarações fiscais – podem implicar, no mínimo, penalidades por falta de entrega de declarações ou por falta de entrega de impostos. A sistematização destas obrigações e a coordenação entre as entidades envolvidas é essencial.

Aliás, e já que focamos o papel do CC, há ainda a realçar que esta figura especifica de Portugal terá ainda responsabilidades relevantes em termos do reconhecimento destas operações nas demonstrações financeiras locais e há aspetos práticos bastante específicos que devem ser devidamente analisados. Veja-se uma operação definida globalmente, com base em contas consolidadas (IFRS ou US GAAP), e em que que não foram antecipados os impactos nas contas locais, preparadas de acordo com o normativo contabilístico SNC. E por exemplo, a avaliação de negócios adquiridos pode levar ao reconhecimento de um ativo intangível, que a empresa pode ou não depreciar nas contas locais (dependendo da natureza do mesmo) e tal terá impactos relevantes nos resultados da entidade local e no valor dos seus capitais próprios. Estes são aspetos que impactam a capacidade de distribuir lucros ou o cumprimento de rácios de capitalização relevantes em determinados setores de atividade e que, como tal, devem ser antecipados em conjunto com o CC.

E as particularidades do “Compliance Fiscal” estendem-se hoje em dia outras áreas menos tradicionais, como por exemplo os sistemas informáticos. É comum, por exemplo numa fusão ou numa integração de vários negócios numa única entidade, que se opte por não integrar os sistemas informáticos de suporte à contabilidade, sendo mantido durante um período transitório vários sistemas distintos, com uma integração manual das contas para assegurar a preparação de demonstrações financeiras. Ora, se tal reduz gastos com integração de sistemas e pode ser uma opção para não atrasar a concretização de uma operação, também pode ter implicações fiscais que não sejam antecipadas pela equipa de IT, como por exemplo a incapacidade de extração de um único ficheiro SAF-T PT anual do ERP onde a contabilidade em SNC é efetuada, conforme previsto na legislação.

Do mesmo modo que o cumprimento das obrigações fiscais correntes devem estar planeadas e calendarizadas ao longo do ano, também as operações extraordinárias como uma fusão, a interação de um negócio, o início ou o encerramento de uma atividade, ou externalização de áreas de “compliance” devem ter um planeamento e calendarização própria, e o acompanhamento por equipas pluridisciplinares que incluam equipas locais com responsabilidades na implementação.

Em suma, a coordenação entre as diversas áreas envolvidas, desde o momento da definição da estratégia até à efetiva implementação pode fazer toda a diferença entre o fracasso ou o sucesso de uma operação de M&A!

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