Em junho de 1992, depois da Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, ou Eco-92 ou Cimeira da Terra, no Rio de Janeiro, Carlos Borrego afirmou que depois do encontro do Brasil nada iria ficar com antes.
“Continuo a dizer que nada ficou com antes. Temos um conjunto de decisões que já foram tomadas e que podem ter sido importantes”, afirmou numa entrevista à Lusa, tendo como pano de fundo mais uma cimeira do clima, a COP28.
As COP, reuniões mundiais sobre o clima, algumas delas consideradas de extrema importância como a COP21 (Acordo de Paris), são as chamadas Conferências das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (UNFCCC, na sigla original), criada precisamente na primeira grande reunião internacional após a guerra fria, de 03 a 14 de junho de 1992.
Carlos Borrego era desde abril de 1991 ministro do Ambiente do governo de Portugal, chefiado então por Cavaco Silva.
Como recordou à Lusa, a conferência do Rio de Janeiro do ano seguinte foi desde logo uma das grandes prioridades, tanto mais que no primeiro semestre de 1992 Portugal assumia pela primeira vez a presidência do Conselho da UE.
Era preciso negociar a estratégia da UE e a forma de a conduzir, que não foi difícil porque a UE seguia a linha da ONU, e era preciso depois sensibilizar e negociar com outros países.
A equipa da UE, chefiada por Carlos Borrego, esteve em muitos países, dos Estados Unidos à China ou ao Japão. Mais complicado foi o grupo dos 77 países em desenvolvimento, G77, que tinha sede em Kuala Lumpur, na Malásia, mas que era presidido pela Indonésia, com quem Portugal não tinha relações devido à ocupação de Timor-Leste.
Mas porque “era importante articular com o G77” houve ainda assim uma reunião, “simples e cordata”, num andar de um hotel reservado só para isso. Como hoje, na altura a UE liderava já nas questões ambientais.
Engenheiro mecânico de formação, professor catedrático jubilado da Universidade de Aveiro, Carlos Borrego recordou os dias frenéticos do Rio a representar Portugal, mas também a UE, o problema que foi a adoção do conceito de desenvolvimento sustentável, um conceito que era novo e para o qual muitos países não estavam preparados.
E recordou os 40 capítulos da Agenda 21, precisamente para levar os países a serem mais sustentáveis. Lembrou as “intervenções tensas” na fase de negociações, a conclusão da convenção sobre a biodiversidade e da convenção quadro sobre as alterações climáticas, como também as negociações de última hora sobre a proteção da atmosfera, sem consenso até às 04:00 do dia do encerramento.
Mas tudo acabou bem, sem votos contra. Carlos Borrego não o disse, mas transparece do que conta o orgulho no trabalho final. E a deceção de a imprensa em Portugal ter desvalorizado a Cimeira da Terra e considerado que a delegação portuguesa nada conseguiu.
Em 1992 a área do ambiente estava “fora de contexto”, o país estava mais preocupado com a saúde, justificou, exemplificando com uma difícil reunião com o então ministro da Indústria para que houvesse por parte das empresas uma taxa de carbono de um escudo (0,00498 euros).
Mas hoje, Portugal incluído, na sequência da cimeira do Rio, há bons trabalhos a serem feitos. E sabe-se agora, o que não acontecia em 1992, o que cada país emite em termos de gases com efeito de estufa.
Mas falha-se no apoio à mitigação e adaptação, nos 100 mil milhões de dólares anuais para os países mais pobres, prometidos mas nunca cumpridos. “Impensável que não tenha avançado!”, considerou.
Afirmando que o Acordo de Paris é necessário mas não suficiente, Carlos Borrego falou também das “práticas incoerentes”, como as subvenções aos combustíveis fósseis, ou o financiamento público a infraestruturas com grande intensidade carbónica.
E considerou que a UE não é suficientemente ambiciosa, e que Portugal tem de robustecer a neutralidade fiscal, com os impostos ambientais.
Não se falava disso há três décadas, e nem as alterações climáticas ou a importância da proteção da biodiversidade eram motivo de preocupação. Carlos Borrego, com um dos principais papéis na Eco-92, voltou da cimeira da ONU muito confiante.
Não por Portugal, porque, afirma agora, a Cimeira da Terra, a mãe das COP, ainda não era para Portugal, a braços então com outro tipo de necessidades.
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