O financiamento bancário para a compra de casa tem vindo a diminuir desde janeiro de 2018. Segundo dados do Boletim Estatístico de março do Banco de Portugal, o crédito concedido a particulares para habitação era, em janeiro de 2018, de 99.462 milhões de euros e em janeiro de 2019 já só era de 98.100 milhões (em dezembro de 2018 somava 98.171 milhões). Isto é, num ano o stock de crédito à habitação caiu 1,36 mil milhões de euros. Em janeiro de 2018 o crédito à habitação representava cerca de 71% do crédito a particulares e um ano depois pesava 69%. Sendo que o crédito a particulares em janeiro de 2018 somava 140.742 milhões e em janeiro de 2019 totalizava 141.323 milhões de euros.
O rácio de endividamento dos particulares para a compra de casa estava, em dezembro de 2018, em 48.7% quando em dezembro de 2017 estava em 51.2%.
A quebra do crédito concedido para a habitação contrasta com a curva da venda de casas. Dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística mostram que no ano passado as transações de casas somavam cerca de 24,1 mil milhões de euros. “Transacionaram-se 178.691 habitações em 2018, mais 16,6% que em 2017. As transações totalizaram 24,1 mil milhões de euros, aumentando 24,4% face ao ano anterior”, diz o INE.
O gabinete nacional de estatísticas salientou ainda que no 4º trimestre, “observou-se uma desaceleração do número das transações, que passou de uma variação homóloga de 18,4% no 3º trimestre para 9,4%. Em valor, as transações desaceleraram de 29,1% no 3º trimestre para 10,7% no 4º trimestre. Pelo segundo trimestre consecutivo o aumento homólogo nas habitações novas (15,0%) superou o das habitações existentes (9,7%)”.
A redução do crédito à habitação explica o aumento do crédito automóvel, diz presidente da Montepio Crédito
Em declarações ao Jornal Económico, Pedro Alves, presidente do Montepio Crédito, que esta semana deu uma entrevista ao Jornal Económico, de sexta-feira, explicou que “os primeiros indicadores do Banco de Portugal apontam para abrandamento do crescimento do crédito automóvel e do crédito ao consumo em geral, isto depois de um crescimento significativo. Se olharmos para o total de crédito concedido às famílias cresceu, chegou aos níveis mais baixos da última década em 2014 e 2015 e depois voltou a recuperar, mas não chegou aos níveis pré-crise que apontavam para um crédito ao consumo na casa dos 32 a 33 mil milhões de euros e fechou o ano de 2018 num total de 26 mil milhões de euros”. Mas para o responsável pelo crédito em pontos de venda (consumer finance) do Grupo Montepio, “o que é curioso é ver o comportamento no peso do crédito automóvel no total do crédito ao consumo, se em 2009 o peso do crédito automóvel no total do crédito ao consumo era pouco mais de 15%, no final de 2018 já ia a caminho dos 24% e mesmo no total do crédito às famílias” e isto é explicado pela redução do crédito à habitação”, diz o CEO.
“O crédito à habitação é que reduz significativamente no peso total do crédito às famílias. Ou seja, tem havido aqui uma transferência de parte do peso do crédito à habitação para o crédito automóvel”, diz Pedro Alves que acrescenta que “isto quer dizer que as necessidades iniciais do fim da década de 90 e inicio do século de habitação foram rapidamente preenchidas, houve uma forte retração do crescimento do crédito por via de uma forte contração do rendimento das famílias e das fontes de rendimento, nomeadamente com um aumento da carga fiscal sobre o rendimento, no princípio da crise financeira e portanto houve um adiar significativo do consumo por parte das famílias, nomeadamente no consumo mais importante, aquele que pesa mais no rendimento, que é a compra de carro”, disse.
“Em Portugal, no período pré-crise vendiam-se 220, 230 mil viaturas por ano no país este valor caiu para acima dos 100 mil em 2013, 2014 e no ano de 2018 o número de automóveis novos vendidos chegou a 273 mil”, explicou o presidente da Montepio Crédito.
Isto, diz, “tem a ver com a devolução dos rendimentos e com a melhoria significativa da taxa de desemprego. Depois tem a ver com a redução significativa da taxa de juro, libertou disponibilidades das famílias, nomeadamente das famílias que tinham encargos com o crédito à habitação. Isto é, “há uma transferência da disponibilidade das famílias em termos de crédito à habitação, por via da redução da taxa de juro, para a aquisição de automóvel com recurso a crédito”.
O Banco de Portugal desde 2013 que publica taxas máximas para o crédito ao consumo, e a última publicada foi a mais baixa desde esse ano.
Segundo Pedro Alves, já se está a verificar um abrandamento significativo da evolução da produção de crédito automóvel, “porque a disponibilidade das famílias por via do alívio dos juros do crédito à habitação e por via da reposição dos rendimentos está esgotada. Foram repostos os adiamentos que as famílias foram fazendo em termos de crédito automóvel. Hoje o sector, nomeadamente a ACAP, diz que o mercado terá uma taxa de crescimento próxima de zero em termos de vendas. Em termos de financiamento automóvel não esperamos que seja diferente”, revelou.
O facto de os bancos não estarem em regra a financiar as casas a 100% pode ajudar a explicar os números. A entrada inicial a pagar ao banco encontra-se diretamente relacionada com o loan-to-value, na medida em que este último irá ditar quanto é que o consumidor terá de pagar. Assim, imaginando que o loan-to-value é de 80%, o cliente deverá pagar 20%. No caso do crédito habitação financiado a 100% não é necessário dar entrada inicial, pelo que o loan-to-value corresponde a 100%. Aqui, o risco de emprestar dinheiro é mais elevado para o banco e, por isso, é mais difícil obter financiamento sem entrada inicial e os bancos mas não o concedem a todos os clientes. Os jovens que pedem dinheiro ao banco com empréstimos a 30 anos, não têm a vida facilitada no crédito à habitação.
O loan-to-value é o rácio entre o valor de avaliação do imóvel e o valor da garantia que é dada ao banco. Corresponde à percentagem de financiamento que é efetivamente concedida pelas instituições financeiras.
Dados do INE dão ainda conta que o valor médio de avaliação bancária feita no âmbito de pedidos de crédito para a compra de casa foi 1.239 euros o metro quadrado em fevereiro, mais 13 euros que o observado no mês precedente. Este valor representa um aumento de 1,1% relativamente a janeiro e de 6,8% face ao mesmo mês do ano anterior, segundo outros dados do INE.
“Quando comparado com janeiro, o valor médio de avaliação dos apartamentos subiu 22 euros, para 1.310 euros/m2. Nas moradias, o valor médio de avaliação manteve-se em 1.125 euros/m2”, escreve o INE.
A nível regional, a maior subida para o conjunto da habitação registou-se no Algarve (2,8%), e as menos acentuadas na Região Autónoma dos Açores (0,5%) e na Área Metropolitana de Lisboa (0,6%).
Em comparação com o período homólogo, o valor médio das avaliações cresceu 6,8%, tendo o valor de apartamentos e de moradias aumentado 8,0% e 5,2%, respetivamente. A taxa de variação homóloga mais elevada para o conjunto das avaliações verificou-se no Algarve (12,9%) e a menor na Região Autónoma dos Açores (4,3%).
BdP: no período 2019-21 antecipa-se que o investimento em habitação continue o processo de recuperação
O Banco de Portugal, no seu Boletim Económico de março, avança que “no período 2019-21 antecipa-se que o investimento em habitação continue o processo de recuperação, dada a manutenção dos principais fatores de crescimento – aumento da procura de residentes e não residentes e acesso a financiamento com baixas taxas de juro.
Contudo, deverá ocorrer uma progressiva desaceleração no mercado da habitação, para a qual também contribui o menor ritmo de crescimento da atividade económica face aos últimos anos, refere o banco central.
Neste contexto, o peso da FBCF – Formação Bruta de Capital Fixo (investimento) em habitação no PIB deverá manter-se relativamente estável em torno de 3% até ao final do horizonte de projeção, diz o BdP no boletim económico de março.
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