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Crise pode acelerar fusões e reestruturações

Um cisne negro chamado Covid-19 criou um cenário de disrupção económica. Com a crise, algumas decisões de investimento foram atrasadas. A resposta pode passar por reestruturações e fusões nos setores mais afetados.
  • Reuters
12 Setembro 2020, 19h00

O Jornal Económico celebra no dia 16 de setembro o seu quarto aniversário. Nos quatro anos, todos eles de crescimento, o jornal visou sempre noticiar os principais acontecimentos na economia, na política, e no mundo. O olhar mais importante foi sempre, no entanto, para a frente – o que é que vai acontecer a seguir?  Numa altura de incertezas devido à pandemia, decidimos marcar o aniversário com trabalhos sobre o futuro. Oferecemos aos nossos leitores análises sobre as perspetivas da economia, dos mercados e da política (nacional e externa). Temos uma grande entrevista com o presidente da AICEP e também um Forum no qual 33 líderes sugerem as receitas para ajudar Portugal sair de uma crise inesperada. Obrigado pela preferência!

 

A crise económica provocada pela pandemia da Covid-19 criou dificuldades inesperadas às empresas, mas poderá ser o detonador de uma onda de fusões, aquisições e de reestruturações. Essa é a análise que faz João Moreira Rato, economista, Sérgio Monteiro, Managing Partner do Fundo Horizon e Paulo Lameiras Martins, especialista na banca de investimento.

Contactados pelo Jornal Económico, estes gestores são da opinião que a crise pode impulsionar aquisições em setores especificos mais afetados pela crise. Enquanto Sergio Monteiro fala nos setores do imobiliário comercial e de escritórios, João Moreira Rato acredita que há margem para operações de M&A (Merger and Aquisition) nos chamados distressed assets. “Algumas empresas da área da hotelaria e turismo, e também empresas exportadoras que foram mais afetadas com a crise, ou empresas que já eram frágeis e por isso sentiram mais os efeitos da crise, estão entre os alvos potenciais de aquisições”, diz Moreira Rato.

Paulo Lameiras Martins, por sua vez, defende que os setores da restauração, do retalho comercial, e as atividades ligadas ao turismo de negócios foram os mais afetados pla crise e por isso poderão ser alvo de reestruturações ou de aquisições. O banqueiro de investimento lembra também o papel que terá o investimento público nos próximos anos na sequência da chegada do fundo de recuperação da União Europeia. Nos próximos sete anos, Portugal vai receber a fundo perdido 15,3 mil milhões de euros do Plano de Recuperação Europeu e outros 29,8 mil milhões por via do Quadro Financeiro Plurianual.

Por outro lado, Paulo Lameiras Martins lembra que o setor do oil & gas está já em transformação com a “revolução energética” e com as preocupações ambientais e cita os “write-offs que têm sido feitos no setor do petróleo”. A digitalização forçada da economia também criará outras oportunidades de negócio, defende.

Um setor que será dos mais afetados pela crise, será a banca, por causa do aumento do malparado após o fim das moratórias de crédito. Espanha já deu o pontapé de saída para as fusões na banca. Está previsto que o banco catalão CaixaBank (que desde 2018 é dono de 100% do português BPI) absorva o Bankia. “O novo banco que sair da fusão, se esta se concretizar, terá uma carteira de empréstimos mais equilibrada e, potencialmente, terá mais flexibilidade para lidar com provisões adicionais para perdas com crédito resultantes da crise da Covid-19”, defendeu a DBRS recentemente. Em Itália o Intesa Sanpaolo adquiriu o controle do banco UBI . E em Portugal? João Moreira Rato diz que “os bancos estão, no geral, bem capitalizados e por isso estão preparados para absorver o previsível aumento dos NPL (non-performing loans), com exceção de uma ou outra instituição”.

A queda do PIB, essencialmente provocada pela quebra do consumo, e o aumento abrupto do desemprego, consequências de um cisne negro na economia chamado Covid-19, abalou a confiança das empresas e das famílias. Como explica Sérgio Monteiro, “após um período longo de expansão económica mundial, em que o papel dos bancos centrais foi determinante para que as taxas de juro se mantivessem em níveis historicamente baixos e a liquidez fosse abundante para apoiar essa recuperação, o Mundo foi surpreendido com uma “paragem” da atividade económica, seguida de uma recuperação que, independentemente da letra que melhor descreve a forma dessa recuperação (fala-se em V, W, L, U, só para citar as mais comuns), o grande fator de receio dos agentes económicos é a incerteza”. O gestor do fundo de infraestruturas é da opinião, que “essa incerteza, que afeta uns setores mais do que outros, atrasa decisões de investimento das empresas e de particulares e, por essa via, atrasa a recuperação”.

“Mesmo que haja fundos comunitários para vários setores e projetos, só a crença numa solução de curto/médio prazo para a pandemia fará os empresários e os particulares comprometerem mais capital e eventualmente recorrer a mais dívida por conta de novos projetos”, diz Sérgio Monteiro.

“Há um outro fator curioso que temos estado a observar: as empresas parecem querer olhar para alternativas de financiamento que não sejam linhas bancárias (onde a monetização de ativos assume um papel potencialmente relevante)”, acrescenta o gestor. “ As linhas bancárias que têm sido contratadas [pelas empresas] são uma espécie de “apólice de seguro” caso a liquidez necessária às atividades core das empresas seja, ou se mantenha, afetada por longos períodos de tempo”, refere.

“Uma vez mais, alguns setores irão ser desafiados a olhar para soluções de capitalização ou reestruturação que não estavam nos seus horizontes antes da pandemia. A abundância de liquidez tinha retirado urgência em alguns processos que, acredito, possam agora ser retomados e isso potencialmente poderá acelerar processos de M&A de ativos e/ ou empresas ou a sua reestruturação”, conclui o gestor.

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