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Da alimentação do futuro à realidade aumentada

Portugal Bugs, OnHistory e cooperativa Opuntia Alentejo levaram inovação ao Portugal Exportador e apontam a mira aos mercados externos.
22 Novembro 2020, 14h00

A inovação incorporada ou associada ao produto ou serviço, a qualidade deste, e, por vezes, também a sua raridade, são trunfos para tentar uma ‘aventura’ fora de portas. À partida, não será fácil, mas há um dado que ajuda: os mercados internacionais maduros estão ávidos de novidade, sobretudo se o produtor/fabricante oferecer garantias como biológico, sustentável, ético e étnico.

A Portugal Bugs, uma das muitas empresas que acorreu à 15.ª edição do Portugal Exportador, a primeira totalmente online devido à pandemia da Covid-19, reúne alguma dessas permissas. Mas com elas ou sem elas, os mercados externos são mesmo a única possibilidade que se vislumbra no horizonte. É que, ao contrário do que esperavam Guilherme Mendes Pereira e Sara Martins, que há três anos lançaram o projeto, Portugal tarda a produzir legislação que permita a produção e consumo de insetos comestíveis, um passo que vários países europeus, entretanto, deram. Ora, como o produto criado pelos dois jovens engenheiros alimentares é uma barra energética com incorporação de farinha de inseto, sem legislação, nada feito!

Neste momento, têm quatro produtos prontos para começarem a ser comercializados. “Estamos 100% virados para os mercados externos, sem alternativa”, afirma Guilherme Mendes Pereira ao Jornal Económico. Adianta ter recebido já “diversas manifestações de interesse”, com origem em países como a Holanda, a Bélgica, o Reino Unido e a Suécia.

Exportar e internacionalizar o projeto estão desde sempre no horizonte dos promotores da Portugal Bugs, mas não era suposto que as leis do país onde têm investido todos os recursos os obrigassem a isso. O natural seria que os primeiros passos na comercialização do produto fossem dados em Portugal, diz o empreendedor. E cada dia que passa, salienta, “é um dia a menos em termos de posicionamento numa área de vanguarda”, que se estima possa vir a valer 50 mil milhões de euros, em 2026.

A FAO, agência das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação, defendeu, em maio de 2013, que os insetos, consumidos anualmente por cerca de dois mil milhões de pessoas no mundo, constituem uma alternativa promissora à carne, com vantagens para a saúde e o ambiente.

“Não podia dizer que não, e felizmente que não o disse”, sublinha Guilherme Mendes Pereira, que impulsionado pelo professor Luís Cunha desenvolveu a barra energética como projeto final da licenciatura na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Por outras palavras: degustou tenebrios, grilos e gafanhotos desidratados e deu-lhes um destino.

Apesar das dificuldades atuais, este pioneiro mantém a meta traçada: “liderar a produção de insetos para alimentação humana a nível nacional e ser os primeiros a colocar produtos transformados de qualidade no mercado nacional”. Um objetivo ainda no papel e, para já, muito mais longe do seu alcance do que uma França ou uma Holanda.

 

Um cato à mesa do jantar
O figo-da-índia nasce de um cato e por isso sobrevive em condições adversas. Em Portugal, as regiões quentes do Alentejo e do Algarve são o seu chão. Para fomentar o cultivo, transformação e comercialização de figo da índia e seus derivados – palma e flor de figo da índia – foi constituída em 2019, em Serpa, a Opuntia Alentejo CRL. Esteve no Portugal Exportador para se dar a conhecer e “apalpar” terreno além das fronteiras nacionais.
“Queremos começar a cimentar a atividade”, explica Olga Gonçalves, da Planície Bio, um pequeno negócio familiar que integra a cooperativa, ao Jornal Económico. A Opuntia Alentejo CRL junta atualmente 11 membros, com o décimo segundo a caminho, sendo uma forma inteligente de ganhar dimensão e que permite sonhar com mais oportunidades.

Exportar é um objetivo? “Claramente, no nosso horizonte estão os mercados externos que valorizem o produto”, adianta Olga Gonçalves. Um primeiro passo nesse sentido foi já dado em direção à vizinha Espanha, adianta. A que outros mercados apontam a mira? “Depende de onde conseguirmos entrar”, adianta.
Como trunfos, Olga Gonçalves destaca a natureza biológica do produto, as suas propriedades, a sua versatilidade e a aposta na certificação.

Na Europa, a Itália, designadamente a Sicília, é o maior produtor de figo da Índia. México e Colômbia dão cartas a nível mundial.

 

Realidade aumentada
Alimentar o espírito é o propósito da OnHistory, um projeto turístico-cultural inovador que junta o património e a memória à tecnologia da realidade aumentada para permitir uma experiência imersiva, que além de prazer também proporciona conhecimento. A aplicação foi lançada em finais de setembro e será divulgada junto do grande público em janeiro do próximo ano.

Alexandre Cabrita Pereira, coordena o projeto, que também envolve Fernando Lopes, Solange Lourenço, Carlos Páscoa, David Roque e Duarte Neves. “Fazer da história um instrumento de desenvolvimento dos territórios é a nossa missão”, salienta Alexandre Cabrita Pereira ao Jornal Económico.

O projeto foi pensado em termos internacionais ao partilhar, logo à nascença, a língua mãe com a inglesa e no horizonte estão mais duas: castelhano e árabe, adianta-nos o coordenador do projeto.

No computador pessoal em casa, ou no dispositivo móvel ao ar livre nos territórios, o utilizador poderá, por exemplo, aprender como os romanos construíram a rede de estradas ou como o primeiro rei de Portugal, D. Afonso Henriques e as suas tropas combateram na batalha de Ourique. Mais simplesmente poderá entrar pelo castelo de Leiria adentro.

OnHistory, que tem como parceiro tecnológico a empresa de realidade aumentada Next Reality, conta com parcerias várias com autarquias e entidades ligadas ao património material e imaterial.

 

Digital, aposta ganha
O Portugal Exportador é uma iniciativa da Fundação AIP, desenvolvida em parceria com o Novo Banco e a AICEP Portugal Global e teve este ano como media partner o Jornal Económico. A pandemia obrigou a iniciativa a reinventar-se com formato híbrido e aposta digital, o que não impediu empresas, consultoras e empresários de virem a jogo. Antes pelo contrário. Fabricantes de produtos com forte cariz exportador e bem sucedidas nos mercados internacionais, como a empresa de topo mundial Renova, mas também a Revigrés, as conservas Ramirez e a Gelpeixe, ou marcas importantes no contributo aportado pela exportação de serviços turísticos, como os Hotéis Vila Galé e o Grande Hotel do Luso, apenas para referir os nomes mais icónicos, contam-se entre os participantes. A lista é vasta. Nela pontificam também nomes como Atlantigrama, que se dedica à compra de prédios rústicos, urbanos ou mistos para revenda e gestão de turismo no espaço rural, queijaria Eira da Vila, que conhecemos das prateleiras do supermercado supermercados ou a histórica Confeitaria Nacional com porta aberta na Baixa de Lisboa desde 1829.
Lado a lado com projetos inovadores e empresas consagradas de vários ramos de atividade estão as tecnológicas. Dois exemplos. Flow, que através da marca FoodinTech, é pioneira no desenvolvimento de sistemas MES (Manufacturing Execution System) para o setor agroalimentar e Quidgest, que usa a inteligência artificial e a modelagem para criar soluções críticas de software para empresas e os governos em todos os domínios essenciais no processo de transformação digital.

No geral, pode dizer-se que em comum, as participantes têm, pelo menos, dois verbos: exportar e internacionalizar. Nuns casos é conjugado de cor, noutros está tudo por aprender. Ou como explica Pedro Braga, diretor-geral adjunto da Lisboa Feiras Congressos e Eventos, ao Jornal Económico (JE): “O Portugal Exportador tem sido a expressão de um importante compromisso na sociedade e economia portuguesa que tem várias bandeiras: reforçar a cadeia de valor e alargar a base exportadora da economia; diversificar os mercados de exportação dentro da Europa e fora da Europa; e atrair investimento direto estrangeiro (IDE) relevante, para nos facilitar o acesso a cadeias globais de valor, como condição para sustentar ganhos de escala, já que as PME portugueses asseguram uma boa base de inovação, diferenciação e diversidade”.

 

Exportar e acautelar os riscos
Exportar é uma decisão que marca o rumo de uma empresa, mas para além da decisão de exportar e da escolha do produto ou serviço certos, é fundamental saber como o fazer, diz Ana Quartin, das Relações Internacionais da Fundação AIP e gestora do Portugal Exportador, ao JE. Jovens projetos como o da cooperativa Opuntia Alentejo CRL, por exemplo, encontraram respostas no workshop do certame “Passos para a Exportação”, desenhado com o propósito de ajudar quem pretende começar processos de exportação e internacionalização. A prospeção de mercado é um aspeto importante, mas tão ou mais importantes são os aspetos legais a considerar no ato de exportar e os riscos.

João Safara, administrador do Instituto de Soldadura e Qualidade (ISQ) foi categórico no conselho dado às empresas de todos os setores de atividade e de todas as dimensões, mas sobretudo às mais pequenas por muito interessantes que possam ser os seus produtos: “Não podemos arriscar sem planeamento”, afirmou, justificando: “ao longo dos anos temos visto empresas com grandes objetivos de exportação e de internacionalização que foram um fiasco. Os riscos estavam lá – estão lá sempre – infelizmente não foram vistos com detalhe, foram vistos apenas como meros acontecimentos que só acontecem aos outros”.

O seguro, por exemplo, é uma ferramenta que minimiza e mitiga esses riscos. Rui Tavares, Head of Marine Department (Transportes) na quase centenária e especialista em seguro de mercadorias transportadas VICTORIA Seguros, defendeu que o seguro “deveria ser uma condição prévia do próprio processo de exportação”, de tal forma é importante para o êxito da operação. Também o transporte e a logística são fatores críticos no processo de exportação de bens e mercadorias.

Além dos sapatos e dos têxteis, durante décadas marca das exportações portuguesas, o país afirma-se cada vez mais com produtos de maior valor acrescentado. Hoje já vende tecnologia e outros produtos e serviços com desenvolvimento tecnológico incorporado. Ninguém duvidará que é mais fácil exportar agora do que há sete ou cinco anos. As empresas nacionais têm feito o seu caminho e o Portugal Exportador é um marco nesse percurso.

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