O sol já nos acaricia a pele e faz suspirar pela brisa do mar, pela areia dourada e pelos passeios à beira-mar. E lembra também a importância de um acessório, para nos protegermos do astro-rei. Não um guarda-sol, mas um chapéu. E, já agora, não um chapéu qualquer, mas um desenhado e entrançado por Maria João Gomes.
Falamos de quem? De Maria João Gomes, artesã que liga o passado utilitário da empreita com o design contemporâneo, e que se apresenta assim: “Ex-imigrante, cheguei a Portugal em 2010. Em 2015 fiz um workshop de empreita de palma e imediatamente fiquei muito interessada, já que a minha avó fazia empreita e a minha mãe também”.
Descende de uma família do Açafal, no concelho de Tavira, Algarve, e ainda miúda foi viver para Paris com os pais. Por altura do verão, nas chamadas “férias grandes”, regressava a Portugal e passava dois meses em casa dos avós. Era a época da apanha da palma, a folha da palmeira que, há muito, se tornou tradição no Algarve e ficou gravada na memória de Maria João Gomes.
A “palmeira da vassoura”, nome popular da palma que a artesã-designer utiliza, era muito usada antes de surgirem os sacos de plástico. E não servia apenas para fazer chapéus e alcofas, mas também vassouras e pincéis para pintar a casa. Antes de haver sacos de plástico, o que se produzia na região do Algarve era transportado em cestas feitas com esta palma. Com a entrada em cena do saco de plástico, a tradição foi-se perdendo.
Tudo parecia apontar nessa direção quando Maria João decidiu aprender as diferentes técnicas para trabalhar esta matéria-prima e incutir-lhes o seu cunho pessoal. Passo normal foi começar a visitar pessoas na serra algarvia para absorver todos saberes e segredos do entrançado. Especializou-se na “empreita de palma algarvia” – entrançados vegetais – e daí à criação da marca Palmas Douradas, em 2015, foram dois passos. Ou melhor, duas “tranças”, para entrar no espírito na empreita.
Utiliza, em exclusivo, matéria-prima da serra do Algarve. Aliás, é ela própria quem apanha as palmas na serra, assegurando-se que todo o processo de secagem e preparação decorre da melhor forma para, depois, começar a entrançar e dar forma às suas criações. As pessoas que ainda fazem empreita no Algarve usam palmas importadas, vindas de Marrocos, e Maria João quer, também, demarcar-se nesse aspeto. Cada peça realizada tem “Bilhete de Identidade”, e faz questão de, ao longo do processo, enviar fotografias ao cliente ilustrando o progresso da peça. Sim, isso mesmo, Maria João Gomes também aceita encomendas, sejam elas tapetes, mandalas, jarras, cestos, candeeiros e objetos vários, a acessórios de moda, como chapéus, bolsas e até colares.
Um talento reconhecido dentro e fora de portas
Em 2016, o mundo da moda veio ter consigo. Como? A equipa do designer de moda Filipe Faísca procurava alguém que trabalhasse a palma algarvia. Na altura tinha algumas peças expostas no restaurante Tertúlia Algarvia, em Faro. Filipe Faísca foi conhecer o seu trabalho, desenhou o que pretendia e Maria João fez. Resultado? As malas e chapéus da Palmas Douradas estiveram no desfile do estilista logo nessa temporada.
Em 2018, o designer francês de calçado, Christian Louboutin – sim, esse mesmo, o que patenteou a sola vermelha – foi o protagonista de uma nova parceria. A equipa do estilista visitou o ateliê de Maria João, localizado no Museu do Traje em São Brás de Alportel, e selecionou cerca de 40 modelos. Desafio? Criar um design único para a Casa Christian Louboutin. Assim nasceu um entrançado de raiz inédito que nunca renega este saber milenar, mas lhe traz novas abordagens, criatividade e arrojo.
Procurada por marcas e estilistas nacionais e internacionais, Maria João Gomes continua, acima de tudo, imparável na sua busca de inspiração e originalidade, elevando a arte de trabalhar manualmente a folha da palmeira, uma tradição esquecida, a uma expressão artística. Mas não só. Nos últimos 12 anos, não se tem dedicado apenas a “fazer”, mas também ao “saber fazer”. Transmitir conhecimento e contribuir para a preservação desta arte manual, através de workshops onde ensina a entrançar, é uma forma de manter viva a palma e de contagiar outros a descobrir-lhe novas vidas.
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