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Da privatização à perspetiva de nacionalização. Tudo o que aconteceu à TAP de 2015 até hoje

Num efémero Governo de 19 dias, em junho de 2015, o segundo executivo de Passos Coelho privatizou a TAP, decisão que seria parcialmente revertida poucos dias depois já pelo novo primeiro-ministro, António Costa. Recorde tudo o que aconteceu à companhia aérea desde 2015 até hoje.
2 Julho 2020, 14h49

Em junho de 2015, o primeiro Governo de Pedro Passos Coelho, maioritário, anunciou a privatização da TAP ao ao consórcio privado Atlantic Gateway, formado pelo empresário norte-americano David Neeleman (Azul) e pelo empresário português Humberto Pedrosa (dono do Grupo Barraqueiro), que asseguraram a maioria do capital da companhia aérea nacional.

Poucos dias depois, a 13 de junho de 2015, António Costa, líder do PS, considera que “houve um suspeitíssimo secretismo” na sua negociação.

Já depois das eleições legislativas, em outubro de 2015, em que Pedro Passos Coelho perde a maioria, o seu segundo governo, de efémeros 19 dias, decide formalizar essa operação ao segundo dia do mandato.

António Costa, líder, após negociar acordos de incidência parlamentaer com o PCP e com o Bloco de Esquerda que lhe permitiram ser o próximo primeiro-ministro de Portugal, reage à operação de privatização da TAP. Mal assume o Governo, avança para a reversão do processo de privatização. Após várias semanas de intensas conversações, o Estado português passa a assumir 50% do capital da TAP, com representantes no conselho de administração, mas não garantindo a maioria da comissão executiva da empresa. Os privados, mesmo sem dominar o capital, controlam as decisões estratégicas de gestão da companhia. O CEO continua a ser Fernando Pinto.

Em maio de 2018, a Parpública, ‘holding’ do Estado que controla a participação pública no capital da TAP, lança um alerta no relatório e contas, considerando que, “apesar de deter 50% dos direitos de voto na TAP, SGPS, SA não detém o controlo, mas uma influência significativa”.

A 7 de junho de 2018, uma auditoria do Tribunal de Contas ao processo de reversão de privatização da TAP foi muito crítica e defende que o processo “não conduziu ao resultado mais eficiente”, porque “não foi obtido o consenso necessário dos decisores públicos, tendo as sucessivas alterações contratuais agravado as responsabilidades do Estado e aumentado a sua exposição às contingências adversas da empresa”.

A 11 de junho de 2018, é anunciada a saída de Fernando Pinto dos comandos da TAP a partir de 31 de agosto desse ano. Terminam 17 anos do gestor brasileiro à frente da TAP. “A meta que tinha imposto a mim e à minha equipa foi finalmente atingida”, disse na altura aos colaboradores da empresa. O senhor que se segue é outro gestor brasileiro que já fazia parte da administração da TAP, Antonoaldo Neves.

“Vou estar atento ao que a TAP precisa para se transformar numa empresa de ponta”, assegurava Antonoaldo Neves ao assumir os comandos. A TAP intensifica o processo de investimento na compra de novos aviões para renovar a frota, acompanhado pela abertura de muitas rotas, com aposta nos mercados do Brasil e dos Estados Unidos, assim como na contratação de novos colaboradores, elevando o quadro de pessoal da empresa para cerca de 10 mil colaboradores. A divulgação de resultados relativos a 2018, com prejuízos de 118 milhões de euros, faz soar novas campainhas. Surge pela primeira vez a polémica de atribuição de prémios a algumas chefias da empresa. No exercício de 2019, mais 105,6 milhões de euros de perdas. A TAP entra em plano inclinado, mas a decisão de nova atribuição de prémios é travada ‘in extremis’, pouco antes de a pandemia atingir a TAP em cheio.

Já com a Covid-19 em curso, a companhia aérea deixa quase toda a nova frota no chão, requer a adesão ao regime simplificado de ‘lay-off’ para os seus trabalhadores e pede ajuda financeira ao Estado. É solicitado um apoio de 1.500 milhões de euros para a ‘holding’ do grupo, a TAP SGPS, mas a Comissão Europeia recusa uma ajuda no âmbito das medidas de mitigação da Covid-19 para as companhias aéreas europeias, alegando que a TAP já se encontrava em sérias dificuldades financeiras antes do final de 2019.

Nessa altura, a TAP SGPS já apresentava capitais próprios negativos de cerca de 600 milhões de euros. Bruxelas aprova um pacote de até 1.200 milhões de euros para a reestruturação da companhia, cujos contornos ainda não estão definidos, mas que deverão implicar cortes significativos na frota, na rede de rotas e no número de empregados. David Neeleman não mostra disponibilidade para acorrer à injeção de capital. É indisfarçável o mal estar entre o ministro das Infraestruturas e os representantes dos acionistas privados da TAP. Pedro Nuno Santos acusa a equipa diretiva da TAP de “má gestão”. “A música agora é outra”, “o povo paga, o povo manda” e “temos que nos dar ao respeito” são as muletas em que o ministro das Infraestruturas se apoia nesta confrontação com os acionistas privados da TAP, mesmo que o primeiro-ministro António Costa pareça não acompanhar esta tática.

O impasse prolonga-se por semanas, o cenário de falência chega a ser colocado em cima da mesa, mas depressa o Governo sinaliza que não vai seguir esse caminho. “A TAP é demasiado importante para a deixarmos cair”, assegurou Pedro Nuno Santos. Sobram duas saídas: uma via negociada para a saída de um ou dos dois acionistas privados ou a ‘bomba atómica’ da nacionalização, numa corrida contra o tempo. Em entrevista ao Jornal Económico no início de abril, Humberto Pedrosa defende que “a nacionalização da TAP seria dar um passo atrás”.

Os rumores e a contrainformação multiplica-se, mas o processo negocial parece ter andado pouco, com posições extremadas de parte a parte. A última semana é assinalada por novo anúncio de prejuízos: mais 395 milhões de euros de perdas no primeiro trimestre, período em que os efeitos da pandemia na atividade da empresa foram diminutos. E David Neeleman quebra o silêncio de meses para garantir que “o nosso foco não é apenas garantir que a TAP sobreviva, mas que recupere a rota de crescimento que vinha percorrendo e que prospere para que possamos cuidar dos nossos trabalhadores e clientes”. António Costa promete uma “solução final” para a TAP, mas o futuro da empresa continua rodeado de incógnitas.

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