No início da década de 2010, Portugal integrava um grupo de economias da periferia europeia que quase levaram à desintegração da zona euro como a conhecemos atualmente.

Essa impertinência levou a que se denominasse esse grupo de PIIGS (Portugal, Itália, Irlanda, Grécia, Espanha), que lido em inglês quer dizer “porcos” – uma espécie de bullying capitalista a nível internacional. Hoje, a nossa dívida a 10 anos paga juros mais baixos do que o que a dívida alemã da mesma maturidade pagava há um ano atrás. Isto traduz-se num potencial alívio tremendo para as nossas contas públicas, que é merecido devido ao bom trabalho que temos feito ao longo dos últimos anos.

Esse trabalho começou com um desconfortável “aperto de cinto”, não só nas contas públicas, mas também no resto da economia. Prosseguiu com a realização do nosso potencial enquanto destino turístico e de investimento estrangeiro no sector tecnológico. E culminou com um despertar de consciência dos eleitores relativamente à importância da disciplina orçamental, que levou um PS tendencialmente despesista a lutar por um défice de 0%.

O mérito de pagarmos juros tão baixos hoje em dia é maioritariamente nosso, mas engane-se quem acha que é nosso. A complementar o nosso mérito doméstico esteve um ambiente de política monetária altamente benevolente, com taxas de juro diretoras abaixo dos 0% e um programa de compras de ativos financeiros por parte do banco central suficiente para adquirir entre 10% a quase 30% do total da dívida de todos os países da zona euro.

Recentemente, a expectativa do mercado relativamente à dimensão desta benevolência estendeu-se ainda mais. Depois de um significativo abrandamento do sector exportador europeu, ao longo dos últimos meses, há quem preveja um novo Quantitative Easing (QE) e um corte das taxas de juro diretoras para -0,50% (não sei com que propósito visto que as taxas de mercado já se encontram pornograficamente baixas). Estas expectativas poderiam ser motivo para nós, portugueses, relaxarmos em termos orçamentais, mas é no mínimo imprudente mudar o rumo de um caminho que está a correr tão bem com base em flutuações de expectativas que podem ser meramente de curto prazo.

É de notar que o abrandamento do sector exportador europeu resulta das tensões comerciais e de um abrandamento da procura vinda da China. As tensões comerciais aliviaram-se na última reunião do G20 e a economia chinesa tende a surpreender os investidores ocidentais quando menos se espera dela (e na verdade já está a emitir alguns sinais de recuperação). A par disso, os indicadores relativos ao consumo, emprego e crédito da zona euro mantêm-se relativamente estáveis. O que significa que a probabilidade das atuais expectativas de mais benevolência monetária saírem furadas, daqui por uns meses, não é assim tão baixa quanto isso.

Seria uma pena se um PS quase maioritário resolvesse à última hora deixar cair uma campanha eleitoral em torno de responsabilidade orçamental, “só” porque as nossas taxas de juro de mercado estão perto de 0%.