Nos termos do Código do Trabalho, o “procedimento disciplinar deve iniciar-se nos 60 dias subsequentes àquele em que o empregador, ou o superior hierárquico com competência disciplinar, teve conhecimento da infração”. Como na maioria dos casos, o empregador é uma sociedade comercial, os tribunais têm decidido que os 60 dias começam a contar apenas do conhecimento dos factos pelo conselho de administração ou pela gerência, sendo irrelevante a data em que os mesmos foram conhecidos por trabalhador da empresa. Neste entendimento, a “competência disciplinar” refere-se ao exercício do poder disciplinar “diretamente pelo empregador ou por superior hierárquico do trabalhador, nos termos estabelecidos por aquele” e implica a instauração do processo. Temos dúvidas. Ficam por regular as situações em que os superiores hierárquicos com deveres de denúncia disciplinar não os cumprem em tempo, e de demora da decisão da administração ou gerência.

E pode ocorrer delegação interna de atribuições inspectivas em entidades autónomas, não se aceitando uma investigação “ad aeternum” (ou para as calendas gregas), quando a duração máxima do processo disciplinar inclui o inquérito prévio. Não será o empregador responsável por estes atrasos e o dever de denúncia uma manifestação da competência disciplinar?

Neste acórdão, o STJ declarou, ainda, a licitude do despedimento de um motorista de profissão que, alterando a escala de serviço sem autorização, sofreu quatro acidentes em menos de dois anos, com veículos da empresa, apesar de ter sido advertido para adotar especial diligência. Acresce a aplicação prévia de duas sanções disciplinares de suspensão do trabalho, não impugnadas judicialmente pelo trabalhador, por factos semelhantes. Sem prejuízo da análise concreta, tendemos a acolher esta orientação.

Em suma, é conveniente que a empresa dê formação aos trabalhadores sobre organização e disciplina do trabalho, mas importa garantir a celeridade interna dos processos, evitando o avolumar de comportamentos desviantes e garantindo a oportunidade de atuação disciplinar. Esta política pode ter efeitos estabilizadores nas equipas de trabalho e contribuir para sustentar despedimentos em caso de reincidência.

David Carvalho Martins
Advogado responsável pelo departamento de Direito do Trabalho da Gómez-Acebo & Pombo em Portugal

Isabel Vieira Borges
Doutora em Direito e professora da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa