Numa carta datada de 11 de julho, dirigida a Virgílio Lima, presidente da Associação Mutualista Montepio Geral, o presidente executivo da seguradora Caravela, Luís Cervantes, fez uma “expressão de interesse” em iniciar “tão prontamente quanto possível”, um “procedimento de diálogo e análise conjunta da possibilidade de colaboração e eventual associação empresarial entre a Caravela Companhia de Seguros e a Lusitânia Companhia de Seguros”, sabe o Jornal Económico.
O presidente da Caravela e o administrador Gonçalo Ramos e Costa “propõem-se ser acompanhados”, nas negociações com a administração da Mutualista por Diogo Lacerda Machado, o negociador que representou o Governo em várias negociações difíceis.
Não foi possível apurar se Diogo Lacerda Machado estará nestas negociações a título pessoal, mas o advogado é, entre outras muitas coisas, administrador não executivo do grupo de Mário Ferreira, que por sua vez é acionista da Caravela com 7%, num bloco composto também pelo Grupo Violas e pelo Grupo Quintas, que no seu conjunto controlam 21% da seguradora.
Recorde-se que na última conferência de imprensa o presidente da Associação Mutualista abriu a porta a parceiros para a Lusitânia, mas disse que quer manter o controlo.
Confrontada, a Associação Mutualista Montepio Geral disse: “não temos nenhuma negociação em curso”.
Em 2019, de acordo com o Relatório e Contas, foram registados 14,8 milhões de euros de imparidades relativos à Montepio Seguros, num ano em que se contabilizaram prejuízos de 408,8 milhões. Mas as imparidades para a subsidiária de seguros (Montepio Seguros, que integra atualmente a Lusitânia e a Lusitânia Vida, depois da fusão da N Seguros) já superam 164 milhões em cinco anos.
O que propõe a Caravela e que argumentos invoca?
Desde logo propõe a possibilidade de uma aquisição/fusão entre a Caravela e a Lusitânia Seguros. A Caravela é uma seguradora focada nos ramos reais e tem como acionista a Toscafund Asset Management, com 48% do capital.
“Conhecendo o contexto desfavorável e as dificuldades que a Lusitânia atravessa desde 2012”, começa por contextualizar a Caravela na carta, salientando os sucessivos aumentos de capital, e o facto de a seguradora ter “500 colaboradores para um nível de negócio pouco superior a 200 milhões”.
Com este contexto a Caravela diz que pode ser o “interlocutor certo, uma vez que pode originar um operador relevante, dentro do TOP 5 do mercado português de seguros”.
A seguradora invoca ainda como “factores críticos de sucesso” da fusão o permitir “imunizar, no curto prazo, o risco de eventuais imparidades adicionais nas contas do Montepio Geral – Associação Mutualista”.
A Caravela propõe ainda “utilizar instrumentos de Tier 1 e Tier 2 para a concretização da operação, ultrapassando a necessidade imediata de realização de uma Due Diligence, que poderia levar à necessidade de registo de imparidades adicionais nas contas da Mutualista”.
A seguradora proponente reconhece também o valor da Lusitânia Vida e por isso sugere a manutenção a 100% desse ativo no universo da Associação Mutualista Montepio Geral, com a celebração de um acordo de distribuição de seguros vida. Mas a Caravela admite, caso a Mutualista assim o queira, fazer o negócio na Montepio Seguros e não apenas na Lusitânia Seguros, o que abrangeria assim também a Lusitânia Vida, que a Caravela diz ter “um problema real de sobrevivência a curto médio prazo sem um reforço de capital adicional”.
A Caravela propõe-se ainda a tentar a obtenção de um novo Acordo de Empresa que permita a mobilidade de funções para os colaboradores entre empresas direta e indiretamente relacionadas com a Companhia de Seguros. Isto para evitar despedimentos e garantir a manutenção dos empregos num eventual processo de aquisição/fusão.
A Associação Mutualista está a receber várias propostas e por isso está também a analisar a da Caravela.
Quem é Lacerda Machado?
Diogo Lacerda Machado como representante da Caravela na negociações com a Mutualista Montepio, é um trunfo da seguradora que foi criada por Diamantino Marques em 2014.
O negociador “amigo” do primeiro-ministro esteve na “reversão” da privatização da TAP, levando o consórcio Gateway (de David Neeleman e Humberto Pedrosa) a entender-se com o Governo (e vice-versa) – entretanto David Neeleman já saiu da TAP. E foi também o escolhido por António Costa para representar o Governo no grupo de trabalho que tinha como finalidade encontrar uma solução para os lesados do BES, que permitisse a recuperação de pelo menos parte do dinheiro investido em papel comercial do GES. O que acabou por acontecer com a viabilização de um mecanismo – um fundo de recuperação de créditos dos lesados do papel comercial gerido pela Patris que permitiu aos cerca de 2.000 clientes que investiram 434 milhões, recuperar 75% desse investimento.
Atualmente Diogo Lacerda Machado é administrador da TAP, presidente da mesa da Assembleia Geral da Pharol, e é também administrador da Geocapital, uma sociedade de investimento sediada em Macau.
Também foi interlocutor do Governo de Costa numa conversa, a propósito de um antigo conflito entre Isabel dos Santos, então a segunda maior acionista do BPI, e a administração do banco, que esteve na origem da saída da empresária angolana do banco e permitiu a venda ao CaixaBank.
Diogo Lacerda Machado é ainda o advogado que lançou os Julgados de Paz.
Atualizada a 22 de agosto, às 12h18m
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