A Diretiva 2022/2464 relativa à Comunicação de Informações sobre a Sustentabilidade das Empresas, conhecida pela sigla em inglês CSRD estabelece novas regras para as empresas visando proteger os diferentes stakeholders das práticas de greenwashing. A Diretiva é uma das pedras angulares do Pacto Ecológico Europeu e da Agenda para o Financiamento Sustentável, que prevê a obrigatoriedade das empresas comunicarem e publicarem informações pormenorizadas sobre questões de sustentabilidade.
Ana Jantarada, Responsável Pelo Centro de Sustentabilidade do BNP Paribas em Portugal, apresenta a Diretiva aos leitores do Jornal Económico, analisa as suas implicações e explica como é que as empresas se devem preparar para os desafios que ai vêm.
Que novas regras traz a Diretiva de Reporting – CSRD, sigla em inglês para Diretiva de Comunicação de Informações sobre a Sustentabilidade das Empresas?
A nova Diretiva de Reporte Corporativo de Sustentabilidade (CSRD no acrónimo em inglês) é vista pela Comissão Europeia como um novo passo no desenvolvimento do investimento sustentável. O executivo comunitário entende que colocará termo ao greenwashing, que permitirá reforçar a economia social de mercado da União Europeia e que criará as fundações das normas de informação sobre sustentabilidade a nível mundial. Em termos práticos, define critérios e requisitos mais rigorosos que as empresas deverão ter em conta na elaboração de relatórios de sustentabilidade e obriga as empresas a publicar informações sobre os seus impactos a nível ambiental, social, nos direitos humanos e em fatores de governação.
A CSRD vem substituir a anterior Diretiva de Reporte de Informação Não-Financeira (NFRD no acrónimo em inglês) e tem como objetivo aumentar quer a transparência quer a comparabilidade das informações em matéria de desempenho ambiental, social e de governança. Com esta diretiva, que entrará em vigor em janeiro de 2024, a sustentabilidade deixa de ser uma opção e passa a ser uma obrigação.
A que empresas se aplicam as normas?
A CSRD vai aplicar-se às grandes empresas na Europa em que se verifiquem dois destes três critérios: mais de 250 colaboradores durante o exercício, mais de 40 milhões de euros em receitas e mais de 20 milhões de euros em ativos. Aplicar-se-á às Pequenas e Médias Empresas (PMEs) com valores mobiliários negociados dentro de um mercado regulamentado da União Europeia também são visadas, bem como as subsidiárias de empresas fora do bloco comunitário com um volume de negócios líquido superior a 150 milhões de euros na UE e que tenham, pelo menos, uma grande filial na UE ou uma sucursal da UE que gere um volume de negócios líquido superior a 40 milhões de euros ou seja cotada. Igualmente visadas estão as empresas de seguros e entidades de crédito, independentemente a forma jurídica.
As filiais das grandes empresas poderão ficar isentas do reporte quando constam do relatório de gestão consolidado da empresa-matriz e indicam no seu próprio relatório de gestão. Por outro lado, as microempresas cotadas em bolsa e as PMEs não cotadas também estão de fora do campo de aplicação da Diretiva, mas são convidadas a cumprir as normas de forma voluntária.
Que implicações vão ter essas normas no dia-a-dia das empresas?
Esta diretiva terá um grande impacto no dia-a-dia das empresas. Vai ser necessário um maior detalhe por parte das empresas nos seus relatórios de sustentabilidade, incluindo temas como o ambiente, responsabilidade e direitos humanos, mas também no que diz respeito à governance.
As empresas terão de tornar o relatório público e publicar a informação numa secção dedicada ao efeito, normalmente no seu relatório anual. Além disso, terão de o digitalizar e disponibilizar através da futura base de dados do European Single Access Point (ESAP) da UE. Estas informações devem ser qualitativas e quantitativas, prospetivas e retrospetivas, com objetivos delineados a curto, médio e longo prazo. Para cumprir os requisitos da CSRD, as empresas poderão ter de melhorar a gestão de dados, para melhorar a disponibilidade, a qualidade e a recolha dos mesmos, de forma a acompanhar e comunicar com precisão os indicadores de sustentabilidade. Tal exigirá, sem dúvida, tempo e recursos significativos.
A CSRD também prevê a obrigatoriedade de um prestador de serviços de garantia independente para a elaboração de relatórios, com base nas normas de elaboração de relatórios de sustentabilidade, para garantir que a informação é exata e fiável. Para que terceiros possam efetuar procedimentos de garantia em conformidade com a CSRD, os conjuntos de dados devem estar bem organizados e devem estar disponíveis provas para apoiar as divulgações efetuadas, o que gera necessidades adicionais de recursos.
Apesar de demorar algum tempo, acreditamos que a CSRD irá transformar a forma como as empresas comunicam os seus progressos em matéria de ESG, tanto a stakeholders externos como internos, e que serão desafiadas a reforçar os seus compromissos e ambições.
O que é que as PME portuguesas que integram as cadeias de valor de empresas cotadas vão ser obrigadas a fazer?
A Diretiva prevê que as PMEs cotadas sejam abrangidas a partir de janeiro de 2026, mas o ano de publicação será 2027 (com dados FY 2026). Já as outras PMEs, embora não sejam diretamente visadas, também deverão ser impactadas, porque a nova avalanche regulatória exige das grandes empresas o mapeamento dos impactos ao longo de toda a cadeia de valor, a montante e a jusante, incluindo produtos e serviços, relações comerciais e cadeia de fornecedores, sempre que for relevante. Em termos práticos, as PMEs que adotarem estas medidas e que estiverem na linha da frente poderão ter uma vantagem competitiva, face aos consumidores cada vez mais eco responsáveis. Mas também terão de enfrentar custos adicionais para estar em conformidade com os requisitos e operacionalizar estas metas, o que vai requerer mais robustez financeira.
As Pequenas e Médias Empresas que tenham necessidades de financiamento e relações comerciais com grandes empresas serão chamadas a avaliar e/ou melhorar o desempenho neste campo, tal como se discutiu no Sustainable Future Forum, o principal evento de sustentabilidade do BNP Paribas. A ida ou não a jogo ditará a sobrevivência ou eventual irradiação dos mercados globais uma vez que os “gigantes” com quem trabalham terão de selecionar os seus fornecedores com base em práticas ambientais, sociais e de governance (ESG). Para as PME’s será vital compreender as respostas que as grandes empresas com que trabalham terão de dar e as alterações que farão, por exemplo, em matéria de gestão. Embora não estejam legalmente obrigadas a reportar as boas práticas, os grandes clientes com que trabalham têm de fazê-lo, pelo que serão empurradas a caminhar na mesma direção.
No meio de tantos desafios vislumbra-se alguma oportunidade?
O Estado poderá desempenhar, certamente, um papel de apoio, mas também as grandes empresas que integram estas PMEs nas suas cadeias de valor. Apesar de poder constituir uma tarefa hercúlea para muitas PMEs, também poderá representar uma oportunidade não só para adotarem critérios ambientais, sociais e de governance mais sólidos, mas também incentivando a inovação, por exemplo, gerando valor de longo prazo, evitando penalizações ou até facilitando o acesso a financiamentos, uma vez que o setor da banca é, também ele, desafiado a privilegiar os investimentos e as finanças verdes.
O que vai acontecer às empresas que não cumpram os requisitos quando chegar a altura?
As empresas que, a título de exemplo, não cumprirem a promessa de baixar as emissões poluentes ou que venham a partilhar informações falsas nos seus relatórios de sustentabilidade arriscam-se a pesadas sanções. Cada Estado-Membro definirá as sanções a aplicar em caso de incumprimento. No seu projeto de proposta, a Comissão Europeia especificou que as sanções devem ser “efetivas, proporcionadas e dissuasivas”. Esta disposição é, de um modo geral, coerente com a atual diretiva NFRD.
Quantas empresas portuguesas serão afetadas pelas novas normas?
Estima-se que cerca de 50 mil empresas venham a ser abrangidas pela diretiva na União Europeia. Atualmente, estão sujeitas a estes requisitos 11.600 empresas. O Governo desenvolveu um plano de apoio aos empresários, pensado para ajudá-los na adaptação às novas normas, em articulação com confederações patronais, associações de diferentes setores ou câmara de comércio, por exemplo.
Há fundos comunitários para as empresas nesta transição sustentável?
A UE disponibiliza financiamento através de vários programas e fundos, como os Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI), que se centram em cinco tópicos e, designadamente, na gestão sustentável dos recursos naturais, na economia com baixas emissões de carbono e nas tecnologias digitais. Outro exemplo é o Horizonte Europa, um programa de financiamento da EU que aborda as alterações climáticas e a transição, facilitando a colaboração e reforçando o impacto da investigação e da inovação.
Em Portugal, no âmbito do programa “Energia para Avançar”, o Governo criou um apoio de 290 milhões de euros para acelerar a eficiência energética e a transição das empresas. Numa altura em que os preços dos combustíveis fósseis estão a subir, é importante que as empresas possam contar com o apoio do Governo na aceleração da descarbonização.
O que é que o BNP Paribas está a fazer junto dos seus clientes no sentido de minimizar os efeitos da aplicação da nova norma?
Os bancos podem desempenhar um papel crucial, ajudando os seus clientes a compreender os requisitos da Diretiva CSRD através de vários serviços e apoio. As instituições financeiras também precisam de integrar os requisitos da CSRD nas suas operações. Isto envolve não só a estratégia e a direção, mas também governance, a gestão do risco, bem como a quantificação e os facilitadores. A CSRD exige informações e explicações alargadas para mais de 20 KPI. Para as instituições financeiras, isto significaria que toda a carteira de um banco estaria sujeita a estes requisitos. Consequentemente, as capacidades atuais – incluindo a metodologia, os dados e os sistemas – têm de ser significativamente melhoradas, a fim de criar uma perspetiva ESG holística. Os bancos podem oferecer incentivos aos clientes que demonstrem um bom desempenho em matéria de ESG, de forma a encorajar as empresas a dar prioridade à sustentabilidade. Relativamente aos requisitos de reporte, os bancos podem ajudar os clientes a informarem-se sobre as alterações regulamentares, assegurando que se mantêm em conformidade com a evolução da regulamentação CSRD. Por último, as instituições financeiras podem ainda ajudar os seus clientes a navegar no complexo panorama dos relatórios de sustentabilidade, oferecendo soluções de recolha de dados e de elaboração de relatórios que ajudem os clientes a recolher, analisar e comunicar de forma eficiente as métricas de sustentabilidade.
No BNP Paribas apoiamos os clientes em todas as fases do seu percurso de sustentabilidade. A integração da CSRD não é exceção. Temos equipas de especialistas que ajudam os nossos clientes a compreender os requisitos, a sua maturidade, as necessidades de dados ESG e apoiamo-los na forma de os pôr em prática.
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