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Dos contactos virtuais à ‘big data’, tecnologia mudou M&A

A pandemia trouxe avanços tecnológicos acelerados pela necessidade de evitar contactos, mas o uso de novos métodos e ferramentas inovadoras na assessoria financeira vai bastante para lá dos avanços do último ano e meio. Desde a gestão de registos à cibersegurança, passando por temáticas como a inteligência artificial ou big data, a digitalização neste sector […]
5 Setembro 2021, 10h30

A pandemia trouxe avanços tecnológicos acelerados pela necessidade de evitar contactos, mas o uso de novos métodos e ferramentas inovadoras na assessoria financeira vai bastante para lá dos avanços do último ano e meio. Desde a gestão de registos à cibersegurança, passando por temáticas como a inteligência artificial ou big data, a digitalização neste sector era já bastante presente antes da Covid-19, especialmente no que toca ao backoffice, mas esta inovação deverá chegar cada vez mais aos pontos de contacto com os clientes.

Sendo um “negócio de pessoas”, como caracteriza Narciso Melo, head of Corporate Finance do Banco Finantia, o mercado de fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês) tem experienciado uma “redução de custos ao longo de todo o processo de consolidação e reorganização das empresas”, à boleia do maior recurso a meios tecnológicos.

“O avanço tecnológico, mais pronunciado do último ano e meio provocado pela pandemia, veio para ficar, embora não seja fator preponderante na ótica do comprador ou vendedor da empresa. O fator humano de um processo de fusão e/ou aquisição irá sempre continuar a depender dos decisores-chave, sejam eles acionistas único, herdeiros ou fundos de investimento”, explica, sublinhando o papel do assessor financeiro na “gestão de expectativas” destes processos.

Este fator humano é ainda algo que a tecnologia não consegue reproduzir, mas a proximidade dos assessores aos seus clientes manteve-se, ainda que não fisicamente, apesar da pandemia. Na verdade, houve “uma rápida adaptação dos players do mercado a estas limitações e restrições”, refere Acácio Matoso Rego, head of Corporate Finance & Financial Sponsors – Corporate & Investment Banking do Santander em Portugal ao Jornal Económico (JE). Exemplo disso é a expedita substituição de reuniões físicas por encontros virtuais ou híbridos, ou a assinatura digital de contratos de compra e venda.

Além desta dimensão da substituição dos contactos presenciais, a tecnologia ao serviço da assessoria financeira tem ganhado uma relevância crescente nas operações dos agentes do sector.

“As mais relevantes instituições de crédito e casas de investimento, nacionais e internacionais — quer com recurso a soluções próprias, quer com soluções tecnológicas desenvolvidas por start ups fintech em regime de outsourcing — socorrem-se sistematicamente de cloud computing, data analytics screen scraping, APIs ou IA, para as mais diversas fases e verticais da assessoria financeira”, detalha Diogo Pereira Duarte, sócio contratado da Abreu Advogados.

“É o que sucede na prestação de serviços de receção, transmissão e execução de ordens, consultoria para investimento e gestão discricionária de carteiras, com a utilização de smart order routers, robo-advisors ou agregadores de informação financeira (open finance)”, continua, acrescentando ainda o papel da tecnologia na “definição do perfil do cliente” e em matérias de compliance.

O papel das fintech como complementos na cadeia de valor da banca mais tradicional é algo que António Henriques, Deputy Chief Executive Officer do Bison Bank, também destaca.

“Hoje os bancos e as fintech já entenderam que não devem tentar competir entre si, devendo sim complementar-se em toda a cadeia de valor. Por um lado, os bancos não conseguem competir com as fintech na agilidade e na capacidade de adoção de nova tecnologia e, por outro, as fintech não conseguem entrar no mundo absolutamente regulado e de confiança, secularmente atribuído aos bancos”, explica o responsável da instituição financeira.

 

Tecnologia de uso interno e no fronto office
Ainda assim, estas aplicabilidades da tecnologia disponível ao sector passam, sobretudo, por processos internos das firmas. O caminho no futuro, antecipa Diogo Pereira Duarte, passará também pelo recurso a meios tecnológicos “nas áreas de front office e para o desenvolvimento de interações com clientes, sobretudo por canais digitais com diminuição de intervenção humana”.

“A generalização da utilização das tecnologias de registo descentralizado, smart contracts e ativos virtuais nas áreas tradicionais da assessoria financeira parece-me que será a grande inovação que poderemos esperar no futuro”, prevê, não deixando de lembrar os “novos riscos, em especial em matéria de resiliência operacional e proteção de investidores, que terão de ser analisados e enquadrados juridicamente”.

Parte desses riscos prendem-se com a sensibilidade da informação analisada nestas operações, que pode colocar riscos de privacidade aos clientes. Isso mesmo relembra Rui Almeida, CEO e managing partner da Moneris.

“No mundo atual, a informação e os dados são reis, sendo que as empresas que trabalham com informação financeira, como as de assessoria financeira, precisam de explorar como transformar essa informação em inteligência sem violar a confidencialidade do cliente, garantindo que conseguem dar melhor informação, mais tempestiva e relevante às empresas, garantindo um melhor suporte à sua tomada de decisão”, afirma, perspetivando neste aspeto um dos grandes desafios para este mercado no futuro.

Apesar das preocupações com cibersegurança que surgem destas novas capacidades e ferramentas, António Henriques antecipa fortes ganhos para o cliente de assessoria financeira.

“O conjunto de opções disponíveis (e ao alcance de um smartphone), associado ao conjunto de todas as tecnologias presentes ao longo da cadeia de valor, vão permitir democratizar os habituais serviços de gestão de patrimónios e de consultoria financeira, alcançando clientes que, no paradigma clássico, não teriam acesso”, projeta.

“Por outro lado, os processos de geração de ideias e de apoio à decisão vão melhorar substancialmente, apoiando quer o cliente diretamente quer o consultor para o investimento (esta função de consultor para o investimento irá passar, muito brevemente, a integrar as equipas de desenvolvimento de sistemas de informação e não tanto as clássicas equipas comerciais)”, conclui.

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