É sabido como a União Europeia, entre Bruxelas e Estrasburgo, prossegue os seus ritmos próprios, entre reuniões laterais, trilaterais, multilaterais, nas salas como nos corredores, por vezes parecendo exasperante o tempo demorado em torno daquilo a que, em inglês, se chama o “wording” final e que nós, portugueses, designamos correntemente como “juridiquês”.

Vem isto a propósito da Diretiva Europeia RED3, inicialmente anunciada como parte da agenda da reunião do Conselho dos Assuntos Económicos e Financeiros a realizar esta semana a 16 de junho, mas que acabou por ser retirada, alegadamente por pressão da Alemanha que negocia ainda alguns trade offs.

Aprovada politicamente nas suas linhas gerais no final do passado mês de março – com um objetivo geral mínimo definido de 42,5% de energia com fontes renováveis até 2030 – esta Lei europeia tem votação final prevista para o final de setembro no Parlamento Europeu. Mas, até lá, ainda ouviremos falar de introduções e alterações ao texto, à medida que os juristas da UE trabalham numa versão dos artigos capaz de conciliar os diferentes fatores em questão.

Isso mesmo aliás sucedeu muito recentemente, após uma fuga de informação reproduzida em publicações como o Biodiesel Market Report da empresa suíça SquareCo e que trouxe ao conhecimento dos interessados alguns dos conteúdos do texto em redação. Nomeadamente – e esta é uma boa notícia para o setor nacional dos biocombustíveis e para o ambiente em geral – que a incorporação real dos biocombustíveis deverá ser aumentada de 7% para 10%.

De forma consistente, a Associação Portuguesa de Produtores de Biocombustíveis tem defendido que existem condições para a redução a curto prazo da emissão de gases de estufa nos transportes rodoviários e que Portugal pode poupar até um milhão de toneladas em emissões de dióxido de carbono por ano. Para isso, é indispensável que Portugal siga a recomendação da União Europeia e aumente os níveis de incorporação real de biocombustíveis aquando do abastecimento dos automóveis e autocarros.

Segundo uma análise da APPB, com base em números da Autoridade Tributária e do Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), a incorporação real, em 2021, situou-se em cerca de 6%, devido ao elevado, mas indispensável, teor de matérias residuais utilizadas na sua produção e que beneficiam de dupla contagem para efeitos de medição.

Por isso mesmo, esperamos agora que a revelada alteração europeia seja confirmada oficialmente nesse sentido do aumento da incorporação real (ou física) e que, posteriormente, o Governo português não demore tanto na transposição desta nova diretiva como demorou a fazê-lo com a RED2, sua antecessora.

Numa nota adicional, também relacionada com a União Europeia, foi há poucos dias noticiado que a Comissão decidiu investigar a reclamação de um estado-membro (que a Reuters identificou como sendo a Alemanha) sobre uma possível fraude relacionada com as importações de biocombustíveis da China.

Este tema (recentemente abordado numa entrevista pelo presidente da APPB, Paulo Carmona) é da maior importância e a novidade revela que a Comissão Europeia se compromete a seguir o influxo de biodiesel à base de resíduos de origem chinesa que, no início deste ano, inundou os principais mercados europeus e foi acusado de prejudicar a produção doméstica de biocombustíveis convencionais e baseados em resíduos.

Segundo o comunicado oficial enviado à revista “Fastmarkets”: “A Comissão foi informada por um estado-membro sobre possíveis casos de fraude relacionados com as importações de biocombustíveis da China para a União Europeia. A UE leva muito a sério qualquer alegação de fraude e não hesitará em tomar as medidas apropriadas para proteger a integridade de seu mercado de biocombustíveis. Todos os atores económicos envolvidos no mercado de biocombustíveis devem cooperar plenamente e relatar quaisquer atividades suspeitas.”

Obviamente, do lado da APPB daremos toda a colaboração nesse sentido. Tal como outras congéneres internacionais, temos defendido que a importação de biodiesel deve ser acompanhada por uma monitorização eficaz da sua composição e origem e que devem existir práticas de auditoria e verificação consistentes, evitando quaisquer atividades duvidosas ou fraudulentas. Este é, assim, um tema que iremos seguir com toda a atenção.