No entanto, a parte mais interessante da entrevista veio logo a seguir, quando Mexia afirmou “que fique claro que estamos no período do fim da incerteza”. Não quero contrariar o poderoso CEO da maior empresa do país, mas atrevo-me a questionar essa certeza. Sim, a incerteza sobre a OPA deverá acabar nos próximos 45 dias, se não mesmo hoje. Mas se a oferta chinesa falhar, a incerteza que rodeia a EDP não morre com ela. Antes pelo contrário, até poderá aumentar.

Mas vamos por passos, pois esta OPA não tem nada de simples. Os eventos parecem caminhar para um óbito prematuro da oferta que foi anunciada a 11 de maio de 2018. O Fundo Elliott, que entrou em cena em outubro ao adquirir uma participação de 2,29%, deu um golpe de asa ao conseguir incluir no menu da AG uma espécie de sobremesa envenenada – a desblindagem do limite de votos, que neste momento está nos 25%.

Essa alteração dos estatutos é uma das condições de lançamento da OPA, e a inclusão na agenda obrigou a CMVM a esclarecer que se ela for chumbada representará o incumprimento de uma das condições, a não ser que a oferente prescinda dessa opção. Já esta semana, a estatal chinesa veio dizer que não abdica dessa condição, ou seja, se a desblindagem não for aprovada, a OPA morre. Mesmo se o limite de votos for levantado, a CMVM exige que todas as aprovações regulatórias sejam obtidas dentro de 45 dias.

Prognósticos sobre o resultado do ponto 9 da AG? Só depois da votação. Os acionistas da EDP são quase todos como túmulos, não falam. No entanto, parece que mesmo que a OPA sobreviva hoje, ficará nos cuidados intensivos até falecer daqui a 45 dias na mesa das autorizações dos reguladores.

Os EUA não poderiam ter sido mais claros: nunca os chineses vão controlar os ativos da EDP em terras do Tio Sam. Deste lado do Atlântico, é difícil ver Bruxelas aprovar a operação. Em qualquer caso, até agora não há sinal de a CTG ter sequer entregue os papéis necessários a esses reguladores, que têm processos complexos e que deverão durar mais de 45 dias.

De uma forma ou outra, a OPA parece estar condenada, portanto uma incerteza poderá mesmo acabar, mas deverá dar lugar a outra, ou várias outras. Na carta enviada à empresa esta segunda-feira, a CTG reiterou que vai permanecer como investidora de longo prazo na EDP. A intenção poderá até ser essa, mas será que a ambição chinesa (que ficou clara na OPA) ficará satisfeita mantendo as coisas na mesma? Poderá desistir do esforço e ceder a um eventual avanço de um fundo norte-americano ou um concorrente como a francesa Engie?

As agências noticiosas internacionais já começaram a elencar as opções. A Bloomberg diz que fundos americanos como a Blackstone cobiçam os ativos renováveis da EDP. A Reuters diz que a CTG e a EDP poderão avançar para joint-ventures na América do Sul, especialmente no Brasil, juntando as subsidiárias das duas empresas. O que acharão os outros acionistas deste casamento, uma espécie de OPA via cavalo de Tróia?

O Brasil está no cerne da questão do futuro da EDP. O Fundo Elliott recomenda a venda dos ativos no país, mas Mexia excluiu a hipótese dessa alienação no plano estratégico até 2022. Na entrevista à RTP até salientou que se há uma coisa que o ‘board’ da empresa partilha com a CTG é a visão sobre a importância desse mercado.

Essa parte final da entrevista fez-me pensar noutra incerteza. Como será a relação de Mexia com a CTG no período de luto da OPA? Será uma de visão partilhada? Ou haverá algum rancor devido ao desfecho da oferta?