Um estudo recente da Universidade do Minho sobre descentralização dá conta de que as empresas fornecedoras do Estado estão esmagadoramente sediadas na Área Metropolitana de Lisboa (AML). No período pós-crise financeira de 2008, 77% das compras de bens e serviços pela Administração Pública foram feitas a empresas da zona da Grande Lisboa, o que diz muito sobre as assimetrias que, a vários níveis, ainda subsistem no nosso país.
A concentração regional das compras públicas é, desde logo, um reflexo do centralismo do país. É difícil imaginar que só na AML existam empresas com a qualidade, fiabilidade, prontidão e preço (critérios habituais em processos de contratação pública) imprescindíveis à satisfação das necessidades de bens e serviços do Estado. Obviamente que no resto do país, em particular em regiões com tecidos empresariais mais dinâmicos, não faltam empresas com capacidade para prover a Administração Pública. Conclui-se, assim, que a escolha das empresas fornecedoras do Estado não é apenas ditada por critérios de interesse público, racionalidade económica e eficácia operacional.
Importa, pois, sabermos que critérios pesam, de facto, na avaliação e seleção dos fornecedores do Estado. É inadmissível que a proximidade geográfica aos centros de decisão possa ser um fator que favoreça as empresas em negócios com a Administração Pública. Não se trata aqui de bairrismo, mas sim de uma exigência cívica de equidade e transparência no tratamento dos agentes económicos por parte do Estado. Aos órgãos da Administração Pública são exigidos rigor e responsabilidade nas compras públicas, bem como uma cultura de accountability. Ou seja, de prestação de contas pelas escolhas feitas em processos de compra ou contratação públicas.
Conforme o estudo preconiza, importa rever o modelo de compras e contratações públicas. Se os números relativos aos fornecedores do Estado sugerem o favorecimento – estou em crer que maioritariamente involuntário – das empresas da AML, então há que introduzir mecanismos que promovam a transparência, a equidade e o rigor nas compras e contratações públicas. E se realmente queremos ajudar o interior do país, por que não discriminar positivamente as empresas destas regiões no fornecimento do Estado?
Da mesma forma que não me choca a discriminação positiva das PME portuguesas nas compras e contratações públicas, de forma a assegurar que uma percentagem relevante das aquisições e contratos da Administração Pública seja destinada às pequenas e médias empresas. O estudo aconselha, aliás, que se proceda à avaliação das “barreiras à entrada de PME no ‘mercado da contratação pública’”, deixando assim claro que há trabalho a fazer para que a generalidade das empresas portuguesas (as PME representam a grande maioria do nosso tecido empresarial) possam concorrer e ser competitivas em concursos públicos.