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“Esperamos que a economia cresça mais e que reduza a dívida”

O investimento francês em Portugal continuou a aumentar durante os últimos anos e o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Francesa (CCILF) acredita na manutenção da tendência. “Temos sabido atrair pessoas e empresas francesas de diferentes dimensões e sectores” diz, em entrevista ao Jornal Económico. “Estou otimista”, acrescenta.
22 Setembro 2018, 16h00

O investimento francês em Portugal continuou a aumentar durante os últimos anos e o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Francesa (CCILF) acredita na manutenção da tendência. “Temos sabido atrair pessoas e empresas francesas de diferentes dimensões e sectores” diz, em entrevista ao Jornal Económico. “Estou otimista”, acrescenta.

 

Os troféus da CCILF fazem 25 anos. Como avalia o desenvolvimento desta iniciativa?

Eu atrever-me-ia a vaticinar que esta iniciativa irá celebrar os 50 anos em 2043! No ano passado, celebramos os 130 anos desta Câmara [de Comércio e Indústria Luso-Francesa], numa gala presidida pelo senhor Presidente da República.

A estabilidade e a relevância desta nossa instituição no desenvolvimento e na consolidação dos laços económicos e imateriais entre as empresas e os cidadãos destas duas velhas nações europeias, contribuem para que os troféus tenham tido uma adesão crescente de muitos – e não apenas em Lisboa e no Porto –, como candidatos, como patrocinadores, como membros independentes do júri, ou como simples participantes.

 

Neste quarto de século, como evoluiu a presença das empresas francesas em Portugal?

A Câmara [de Comércio e Indústria Luso-Francesa] acompanha, sobretudo, pequenas e médias empresas francesas que queiram estabelecer laços comerciais ou investirem em Portugal. E promove também a França junto de portugueses e empresas portuguesas interessados em implantar-se em França, de várias formas.

É do domínio público o forte incremento do investimento francês em todo o território de Portugal nos últimos anos.

O nosso país tem sabido atrair pessoas e empresas francesas de diferentes dimensões e sectores, que se instalam de forma estável e numa perspetiva de longo prazo.

A par com a Espanha e a Alemanha, a França ocupa uma posição cimeira no plano das trocas comerciais e do investimento em Portugal.

E fá-lo de uma forma continuada e sustentada. A presença francesa na nossa economia é bem mais antiga do que a deste último quarto de século e manteve-se mesmo em períodos mais conturbados da nossa história recente.

Os indicadores de que disponho permitem continuar a ser otimista quanto a essa presença crescente.

Para além das condições de vida muito favoráveis que o país oferece, e que são muito valorizadas pelos estrangeiros que nos procuram, a credibilidade do país em termos económicos tem vindo a acentuar-se: crescimento económico aceitável – ainda que insuficiente; défice público em acentuada queda; tendência descendente da dívida [externa], ainda que muito alta; redução acentuada do desemprego; dinâmica das exportações – sendo que a meta de representarem 50% do PIB é plausível nos próximos anos, quando em 2017 estão já perto dos 42%; e melhoria das perspetivas do país pelas agências de rating, são fatores que naturalmente contribuem para esse fundado otimismo.

 

E como evoluíram as relações entre os dois países?

Não sou analista político, mas a perceção dominante parece ser a de dois países muito homogéneos e próximos geograficamente, com passados históricos de que muito se orgulham, que convergiram e divergiram ao longo dos séculos, mas, presentemente, com uma visão e uma atuação alinhadas perante os desafios e as tensões que se colocam entre o sul e o norte e o oeste e o leste da União Europeia, e até já no seio da zona euro.

Parece haver sintonia entre as lideranças dos dois países, que vem de trás, e que tem sido, aparentemente, incólume às mudanças de cor política dos governos que se foram sucedendo em ambos.

E nunca é demais salientar a importância, consolidada ao longo de 60 anos, de gerações de luso-descendentes em França, que são um elo de ligação muito importante na concretização dos fluxos de trocas comerciais e de investimento entre ambos os países.

 

Como evoluiu o investimento estrangeiro em Portugal nos últimos anos e qual a tendência de desenvolvimento?

Sem dispor de dados precisos, nos últimos anos o investimento estrangeiro no nosso país tem crescido sustentadamente – e irá, tudo indica, continuar a crescer – e tem contribuído significativamente para o aumento das nossas exportações de bens, como já salientei.

Grupos estrangeiros, como o Grupo Volkswagen e os grupos franceses Renault, PSA, Faurecia e Eurocast, deram uma contribuição decisiva para que o sector dos veículos e outros materiais de transporte passasse a ocupar o primeiro posto das nossas exportações. Em dois anos, as exportações de veículos de passageiros praticamente duplicaram.

Noutros sectores, igualmente campeões das nossas exportações, como o aeronáutico – a brasileira Embraer e as francesas Lauak e Mecachrome –, o dos equipamentos mecânicos, material eléctrico, electrónico e informático, e o agro-alimentar e de bebidas – a Coca-Cola, a Nestlé e os grupos franceses Bel, Danone e Lactalis –, a presença de empresas estrangeiras é marcante.

No que respeita ao agro-alimentar, é imperativo o desenvolvimento paralelo da nossa agricultura, atraindo o investimento estrangeiro para as grandes explorações agrícolas do sul do país – criando emprego, combatendo a desertificação das zonas rurais e reduzindo o défice alimentar do nosso país. E o Governo português está disso ciente.

Portugal tem procurado diversificar os seus parceiros comerciais e as suas fontes de investimento estrangeiro para fora da UE, como os EUA, a China, Angola – que dá bons sinais de recuperação e de normalização das relações bilaterais, condicionadas por eventos recentes já ultrapassados –, e o Brasil.

É de assinalar a presença, já há anos, de volumoso investimento chinês em empresas-chave da nossa economia, bem como, mais recentemente, o crescente interesse de fundos de investimento norte-americanos por importantes ativos portugueses, como os do Novo Banco – ele próprio maioritariamente detido por um desses fundos.

 

O sector do imobiliário tem recolhido um grande volume de investimento. Continua a ser dominante? Pela vossa experiência, o que explica o investimento em imobiliário em Portugal?

Não sei se será “dominante”, e eu espero bem que não. Desejaria que o investimento imobiliário andasse, de par em par, com o investimento estrangeiro na indústria, na agricultura, na economia digital, no saber e nos serviços, e em particular com o turismo de qualidade.

Sendo, naturalmente, sempre muito bem-vindo, porque tem contribuído decisivamente para a renovação urbana e a recuperação de um vasto património histórico degradado, sobretudo em Lisboa e no Porto, como há muitos anos não se via. Excessos regulatórios serão, claramente, de evitar.

Há um consenso de que regimes fiscais favoráveis, bem conhecidos de todos, explicam em grande parte esse afluxo de investimento estrangeiro no nosso imobiliário.

Mas os naturais encantos do nosso país, a estabilidade social, o clima, a segurança, a qualidade de vida, a afabilidade dos meus compatriotas, os preços razoáveis (mas que tendem a aumentar de maneira preocupante) e as infraestruturas, também contam.

O meu desejo é o de que, a prazo, franceses, e não só, permaneçam em Portugal sobretudo pelo somatório dessas qualidades intrínsecas do país e pela, espero eu, crescente prosperidade da sua economia e solidez das suas instituições, e menos por vantagens de outro tipo.

 

Portugal continua a saber acolher o investimento francês? Os constrangimentos detetados têm sido ultrapassados?

A nível interno, há constrangimentos e riscos de que os investidores – e os governantes – estão certamente conscientes.

É o FMI que recomenda uma melhoria da competitividade do país, com contenção dos custos do trabalho e melhoria da produtividade – em queda –, com mais investimento na formação e na inovação.

Custos da energia, complexidade burocrática nas relações com a Administração Pública – ainda que com significativas melhorias em muitas áreas – e falta de mão-de-obra fluente em francês são constrangimentos frequentemente apontados.

 

Na sua opinião, a saída do Reino Unido da União Europeia afeta a posição relativa de França e de Portugal? Em que medida?

O Reino Unido, mesmo fora da União, é um parceiro muito importante para esta – e a União para o Reino Unido –, não só no domínio da economia mas também nos da segurança, da defesa/militar e das relações externas, nomeadamente na relação com os EUA e com alguns dos países mais importantes do Commonwealth.

Parece haver uma convicção crescente de que um acordo de saída é possível, nesta fase em que as negociações vão entrar numa fase decisiva e aparentemente final. E de que a senhora Theresa May será capaz de convencer os seus pares conservadores mais renitentes e cépticos, e de ter o apoio de uma maioria na Câmara dos Comuns que ratifique o acordo. Com o risco, pouco risonho para a Europa, de o seu Governo cair e a Grã-Bretanha passar a ser governada pelo senhor Corbyn.

 

O que espera a CCILF da economia portuguesa este ano e no próximo?

Numa palavra, porque a verdadeira resposta seria muito longa: que cresça mais e que reduza progressivamente a dívida.

E que não surjam fatores externos inesperados desfavoráveis que a condicionem.

 

Como tem evoluído a CCILF em números de associados e em iniciativas organizadas?

A CCILF continua a ter cerca de 600 associados. E continuamos a realizar a nossa missão fundamental de apoio às empresas francesas e portuguesas que queiram estabelecer laços comerciais e implantar-se nos dois países.

Seminários, conferências e almoços ou pequenos-almoços debate são, igualmente, parte da nossa atividade de ‘animação’.

Com regularidade, temos reunido, ou vamos reunir, pessoas e oradores no tratamento de temas como a indústria automóvel, a indústria aeronáutica, o emprego/recrutar em Portugal, as energias renováveis, como investir em Portugal e o imobiliário/turismo. E estamos sempre à procura de novos temas e de novas ideias que sejam atuais e úteis para os nossos participantes.

Os troféus continuarão a ser um dos nossos acontecimentos marcantes. Acrescentámos, a partir deste ano, mais um troféu, o “Troféu Start-Up”.

Temos procurado alargar a nossa atividade, ou pelo menos o conhecimento da mesma, a outras cidades e regiões do país, que não apenas Lisboa e Porto.

E renovámos a nossa sede em Lisboa, na Avenida da Liberdade, por forma a torná-la mais acolhedora e funcional.

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