Cheio de orgulho e de si, António Costa foi à cerimónia em que o Governo encenou desejar um Bom Natal à Evita de Belém e anunciou aos jornalistas que tinham tido o infortúnio de serem escalados para cobrir as festividades que o défice de 2017 será “inferior a 1,3%”. Na manhã seguinte, o despertador e a TSF acordaram-me com a notícia de que os manuais escolares grátis que Costa e os seus acólitos usaram para efeitos de propaganda não foram ainda pagos às papelarias e livrarias que os entregaram aos pais e alunos. Juntas, estas duas notícias são bem reveladoras da natureza do Governo.
Há dias, uma moça de simpatias laranja que por vezes me atura explicava-me a sua falta de simpatia pelo executivo socialista com o “despesismo” por ele praticado e as consequências negativas para todos que, mais tarde ou mais cedo, dele nascerão. Curiosamente, muitos – incluindo eu – acusam o governo de ter mantido a “austeridade” que finge ter terminado, apenas tendo mudado a forma como a aplica e a identidade dos sobrecarregados com esse fardo. Por estranho que possa parecer, estas duas críticas não são contraditórias: como todos os governos portugueses, independentemente da cor partidária, o executivo de Costa têm de ser “despesista” para alimentar as clientelas e grupos de interesse que o sustentam, e para isso, ser “austeritário” com os restantes. A única coisa que muda é a forma como o é.
Depois do governo de Sócrates o ter sido através do endividamento brutal que implicou impostos mais altos no futuro, e de o de Passos Coelho ter juntado aos impostos entretanto trazidos para o presente alguns cortes na despesa em determinadas áreas, Costa tem apostado nas “cativações”: para conseguir apresentar em Bruxelas um valor do défice que permita ao país estar dentro da bolha dos títulos de dívida pública que o BCE está a soprar, e assim financiar o despesismo com que compra simpatia e votos, o Governo retém nos seus cofres as verbas para o pagamento de uma série de bens e serviços que se comprometeu a pagar. Para pagar às suas clientelas na Administração Pública, e comprar ao PCP uma relativa “paz social” (o BE vende-se barato), o governo não dá a hospitais, escolas ou, como se soube na sexta, livrarias e papelarias, o dinheiro que para eles orçamentou, e com o qual estavam a contar.
Por outras palavras, o governo comporta-se como um burlão, que promete algo aos pobres incautos que acreditaram na sua palavra (supostamente “honrada” uma vez “dada”), usufrui do que recebeu em troca, e depois desaparece, deixando as suas vítimas de mãos a abanar e contas para pagar. Para piorar as coisas, algumas dessas contas são devidas ao próprio burlão, que quando chega a hora de cobrar, usa a ameaça da força e das complicações burocráticas em que a Autoridade Tributária se especializou para extorquir o devido e o indevido aos infelizes que caiam na sua malha. No fundo, segue os métodos de uma organização abundantemente retratada em filmes e séries, raramente vista como exemplo para o que quer que seja. O problema é que, a crer nas sondagens, parece que há muita gente que gosta desta “coisa nossa”.