A história já vem desde os anos 70 do século passado. Conta-se que um dia Kissinger perguntou com quem devia falar, na Europa, quando precisasse de ligar. Nunca saberemos se a história é verdadeira (fontes próximas de Kissinger já a negaram por diversas vezes), mas a pergunta (ou mito) que ficou famosa nos meios diplomáticos não perdeu actualidade. Pelo contrário! Quando no próximo dia 1 de Novembro tomar posse a nova Comissão Europeia, haverá um novo conjunto de protagonistas (Presidentes da Comissão, Parlamento e Conselho) e o interlocutor do lado de cá do Atlântico não terá vida fácil.

Os próximos anos da União Europeia vão ser um enorme e exigente desafio. Para além do Brexit, há um conjunto de temas na agenda estratégica 2019-2024 que vão colocar à prova a Europa. O conjunto de questões, em aberto, é necessariamente vasto, mas a política externa (a Europa tem que ter um papel mais activo num mundo cada vez mais “bipolarizado” entre Trump e Xi Jinping), a digitalização da economia (continua sem haver uma só empresa europeia no top 15 das empresas tecnológicas – liderado pela Apple, Amazon e Microsoft), o ambiente (a consolidação do Acordo de Paris, assinado por 195 nações e que colocará a Europa no topo da sustentabilidade até 2030), a política orçamental, as políticas de estímulo ao emprego, a educação (o Programa Erasmus+ terá o seu orçamento duplicado), os migrantes (será necessário criar uma verdadeira política que até agora não foi conseguida), o controlo orçamental e a defesa, farão certamente parte das prioridades do novo ciclo europeu.

Para atingir as metas, terá que existir um enorme esforço diplomático sem precedentes, muitas vezes invisível, sem o qual a Europa não poderá avançar. Se a diplomacia sempre foi e será vital, nos tempos mais próximos será ainda mais importante. Muito do que será construído na Europa, nos próximos cinco anos, consistirá num enorme esforço de concertação entre países, que muitas vezes não andam à mesma velocidade e na mesma direcção, rumo ao mesmo destino. A construção europeia é porventura o maior desafio político, social e económico que temos pela frente. Progressivamente, teremos que deixar de ser um conjunto de países que cooperam entre si e convergirmos para um bloco de 28 países.

Claude Martin, ex-embaixador francês em Pequim e Berlim, que possui o raro título honorífico de Embaixador de França, dizia, em 2018, no seu livro, “A diplomacia não é um jantar de gala”. Tinha razão. Não vai ser mesmo.

 

O autor escreve de acordo com o Antigo Acordo Ortográfico