[weglot_switcher]

Eutanásia: Marcelo pondera veto e envio para Constitucional

Despenalização da eutanásia aprovada esta quinta-feira na Assembleia da República deverá ser chumbada pelo Presidente. Ideia é “ganhar tempo” e esgotar possibilidades.
21 Fevereiro 2020, 08h26

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, vai optar pelo veto político quando o diploma que prevê a despenalização da eutanásia chegar ao Palácio de Belém. Ao que o Jornal Económico apurou junto de fontes próximas do chefe do Estado, o veto presidencial vai servir para “ganhar tempo” e esgotar todas as possibilidades legais que Marcelo Rebelo de Sousa tem. Ou seja, se o veto não servir para demover a iniciativa do Parlamento, o Presidente deverá ainda pedir a fiscalização sucessiva do diploma pelo Tribunal Constitucional (TC), após a sua promulgação.

É o cenário que menos compromete Marcelo Rebelo de Sousa enquanto católico praticante e que terá menos impacto junto do eleitorado de centro e centro-direita de que vai precisar nas eleições presidenciais de 2021. O Chefe do Estado, que admitiu estar a ponderar entre o veto ou remeter a lei para o TC, deve optar pela primeira solução, sem excluir a segunda. A ideia, segundo fontes próximas da presidência, será vetar, no prazo máximo de 20 dias, o diploma e devolvê-lo ao Parlamento.

Caso haja uma maioria de dois terços de deputados que permita confirmar a lei, “o Presidente da República será obrigado a “promulgar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua receção”. Após a sua publicação em Diário da República, pode, no entanto, remeter o diploma para fiscalização sucessiva, enviando-o para o TC, sendo certo que há divergências entre os juízes das leis em relação à interpretação da lei. Contactada pelo JE, a Presidência da República não comenta a hipótese e reitera que Marcelo Rebelo de Sousa só se pronunciará sobre o assunto “no último segundo”.

O constitucionalista Jorge Miranda, considerado um dos pais da Constituição da República Portuguesa, diz que a eutanásia “viola” a lei fundamental que define a vida humana como algo “inviolável”. Ao JE, o constitucionalista defende que, assim que o diploma chegar às mãos de Marcelo Rebelo de Sousa, o Chefe do Estado terá apenas “duas opções”: a fiscalização preventiva ou o veto político.

Já o constitucionalista Carlos Blanco de Morais acredita que o envio do documento para o TC é “tempo perdido”, dado que há uma maioria de esquerda entre os juízes e “dificilmente o TC julgará em favor da inconstitucionalidade da lei”. A comprovar isso estão as declarações do presidente do TC, Manuel da Costa Andrade, que antes de ter chegado ao cargo máximo do Palácio Ratton defendeu que “qualquer uma das soluções é constitucional, tanto a admissão da eutanásia com a negação”.

Jorge Miranda e Carlos Blanco de Morais lembram, no entanto, que há outra possibilidade a considerar: um referendo popular. Se a iniciativa popular alcançar 60 mil assinaturas, toma a forma de projeto de resolução. A iniciativa deve ser discutida (não votada) no Parlamento. Depois disso, passa para as mãos da comissão competente, a quem cabe elaborar um parecer sobre a iniciativa e um projeto de resolução com o texto da iniciativa, após ser ouvido o representante do grupo de cidadãos responsáveis pela proposta. Caso seja aprovado, o diploma segue para Belém, cabendo exclusivamente ao Presidente da República a decisão final de convocar o referendo.

Os constitucionalistas contactados pelo JE sublinham que o referendo pode ser feito “a qualquer momento, mesmo que a lei que despenaliza a eutanásia já esteja aprovada”.

Maioria é a favor da eutanásia
Mais de dois terços dos portugueses concordam com a despenalização da eutanásia, prevista nos projetos de lei do PS, BE, PAN, PEV e Iniciativa Liberal que foram aprovados esta quinta-feira no Parlamento. A conclusão é de uma sondagem realizada pela Aximage para o JE, que revela que são os jovens e adultos até aos 50 anos, com mais escolaridade, aqueles que mais concordam que a morte assistida deve ser uma alternativa para os doentes que se encontrem em situação de sofrimento duradouro e insuportável devido a lesão ou doença incurável e fatal.

A sondagem, realizada entre os dias 14 a 18 de fevereiro, com 839 respostas validadas, mostra que 70,7% dos portugueses são a favor da eutanásia. Já 17,7% dos inquiridos discorda do recurso à morte assistida como forma de pôr fim ao sofrimento em casos incuráveis e terminais. Há ainda 11,6% dos portugueses que admitem não ter uma opinião formada sobre esta prática, que, em todo o mundo, é permitida, de forma ativa, apenas em cinco países: Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Canadá e Colômbia. O estudo revela ainda que 2,5% não sabem o que é a eutanásia.

A eutanásia é vista como uma prática aceitável sobretudo pelos portugueses entre os 18 e os 49 anos, com a taxa de aprovação mais elevada (83,5%) entre os 35 e os 49 anos. Os homens concordam mais com a eutanásia (73,4%) do que as mulheres (68,4%) e os cidadãos com mais do que a escolaridade obrigatória são os mais favoráveis à sua despenalização (77,5%).

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.