Fernando Faria de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), disse, numa entrevista ao programa da RTP3 “Tudo é Economia” que vai sair da presidência da associação na próxima Assembleia Geral que se realiza no fim de maio.
“Na próxima assembleia geral da APB deverei ser substituído”, disse Faria de Oliveira, que terminou o mandato no final de 2020.
O Jornal Económico já tinha avançado que Faria de Oliveira iria ser substituído da APB.
Na entrevista ao canal público, o presidente da associação de bancos disse que “temos a preocupação de evitar aquilo que se designa o efeito precipício à saída das moratórias. Ou seja tentar “evitar que empresas que são viáveis possam ficar pelo caminho porque ainda não estão em condições de pagar os créditos à banca, por não terem proveitos suficientes”. Do lado da banca, disse, “é preciso evitar que haja um aumento significativo de NPL (Non-Performing Loans)”, crédito malparado. O que é preciso fazer para evitar isso? “É necessário preparar uma saída ordenada do final das moratórias e tomar as medidas necessárias para apoiar as empresas no sentido de poderem pagar os créditos”, disse o presidente da APB.
“Temos ouvido falar muito que é indispensável não retirar, antes de tempo, os apoios do Estado. Mas eu vou mais longe, é preciso reforçar esses apoios”, disse.
Como é que isso está e pode ser feito? Faria de Oliveira falou do apelo que tem sido feito pelas confederações empresariais de invocar a possibilidade de prolongar as moratórias, lembrando que isso não está na mão dos bancos. “Depende das autoridades europeias [referindo-se à EBA] uma eventual autorização para estender a flexibilização do atual quadro prudencial e contabilístico”, disse.
Nas moratórias o risco corre exclusivamente por parte do bancos, lembrou ainda.
Fernando Faria de Oliveira não acredita no prolongamento das moratórias para lá de setembro. “Como a maioria dos países da Europa já terminaram as suas moratórias e há apenas cinco países que mantêm moratórias em vigor, não podemos confiar muito que isso possa vir a acontecer e então é essencial encontrar alternativas para a não prorrogação das moratórias e essas existem”, garante.
Essas medidas “têm vindo a ser trabalhadas intensamente, quer com o Ministério da Economia, quer com o Ministério das Finanças. Estamos a procurar encontrar soluções que permitam às famílias e empresas em solução difícil encontrar soluções. De facto há que separar a situação dos particulares e a situação das empresas”, disse ainda.
O impacto da pandemia vai sentir-se mais depois das moratórias, que acabam em setembro de 2021, reconheceu, lembrando que os bancos têm realizado provisões para acautelar esse impacto.
“É necessário encontrar medidas que permitam a sobrevivência das empresas viáveis no fim das moratórias”, disse Faria de Oliveira. São medidas para assegurar um “phasing out” ordenado, explicou. São medidas que permitem estender a maturidade dos empréstimos ou encontrar outras formas de as empresas estarem preparadas para pagar as prestações dos créditos.
Grande parte das medidas que estão a ser negociadas com o Governo “está relacionada com a recapitalização das empresas”, disse acrescentando que “são medidas de várias natureza que vão proporcionar um aumento de capital para as empresas terem tesouraria para cumprir com os créditos e continuar a receber financiamento”. Outra alternativa, disse, passa por “empréstimos especiais”.
“Mas estas medidas vão requerer ou garantia de Estado ou, em alternativa, que o Estado entre directamente nessas empresas através de ajudas directas ou no capital das empresas ou através de subsídios a fundo perdido, dependendo da dimensão das empresas”, disse Faria de Oliveira, que admitiu, no caso da garantia estatal, que esta possa vir a ter “um cap” (um tecto).
As moratórias de crédito à habitação que estão abrangidas pelo regime das moratórias privadas da APB terminam no dia 31 de março. A moratória pública acaba a 31 de setembro deste ano. A maioria das moratórias para as empresas acabam em setembro, disse.
O presidente da Associação Portuguesa de Bancos disse, no programa “Tudo é Economia”, que o fim das moratórias não é o fim da linha. Relativamente aos particulares, recomendou que, em face de dificuldades financeiras, contactem o banco antecipadamente para o banco encontrar medidas, caso a caso, para mitigar as dificuldades de pagamento dos créditos (períodos de carência, alargar prazos do crédito etc). Para a banca o unlikely-to-pay (crédito em risco) é muito diferente do incumprimento de crédito, explicou.
Portugal tem as moratórias mais generosas em termos de âmbito e de prazo da União Europeia, de alguma maneira para compensar o menor apoio por parte do Estado, que resulta naturalmente da situação das finanças públicas portuguesas, disse Faria de Oliveira. A banca tem tido indiscutivelmente “um papel chave” neste combate à crise pandémica, disse ainda.
No que se refere aos apoios do Estado, Faria de Oliveira distinguiu três fases distintas. Numa primeira fase (que está no fim do seu curso) tem a ver com o apoio à liquidez (linhas de crédito garantidas e moratórias). Depois há uma segunda fase que tem a ver com as medidas para a retoma das economia no fim das moratórias. Finalmente “vai haver uma terceira fase ligada à bazuca, ou seja, ligada ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), e que tem a ver com uma transformação qualitativa e quantitativa da estrutura produtiva nacional. A bazuca vai constituir uma oportunidade única para poder realizar essa transformação”, considera o presidente da APB.
Sobre o PRR e os fundos europeus que constarão do Portugal 2030, Faria de Oliveira disse que “constituem uma oportunidade única para proporcionar um salto qualitativo e quantitativo da estrutura produtiva nacional”.
A preservação da capacidade produtiva nacional é essencial, disse Faria de Oliveira. Os apoios do Estado são para as empresas, não para a banca, frisa.
O aumento da prosperidade depende quase exclusivamente de se conseguir um crescimento económico ambicioso, e de aumentar o PIB potencial, reconheceu.
“Nos vinte anos entre 1980 e 2000, são oitenta trimestres, em mais de metade (destes trimestres) Portugal cresceu acima de 3% e em mais de 25 (em 27) cresceu mais de 4%. Na década de 2000 a 2020 apenas em cinco trimestres ultrapassou os 3% de crescimento do PIB e nunca se atingiu o crescimento de 4%. Os crescimentos económicos em Portugal têm sido profundamente escassos”, lembrou Faria de Oliveira que frisou que o argumento de que crescemos mais que a média europeia não colhe porque “essa média está influenciadíssima pelo peso das grandes potencias europeias”.
A prioridade do país deve ser criar mais riqueza, disse ainda.
O presidente da APB defende que o PRR “devia privilegiar o investimento reprodutivo, aquele que gera receita”. “Mas quando olhamos para o nosso PRR vemos que maior a parte dos recursos está alocada a necessidades do Estado e investimento público que não geram receita e que até vão produzir despesa pública futura”, alertou.
Nas últimas décadas a economia portuguesa tem tido no sistema bancário o seu principal motor, referiu. “A nossa economia tem há muito tempo um problema de escassez de capital”, lembrou.
Sobre as receitas dos bancos, o presidente da APB lembrou que as margens financeiras estão esmagadas por causa dos juros baixos.
No lado dos custos, em 2020 saíram 1.620 trabalhadores da banca em Portugal, questionado sobre se poderíamos ter um número igual ou superior, Faria de Oliveira disse que depende do que cada banco decidir fazer no âmbito da resposta às condições do mercado, mas acredita que os despedimentos no sector bancário podem continuar face à crescente digitalização do sector.
“A redução do número de efectivos e do número de agências é incontornável e é uma prática que se estende a todo o sistema bancário europeu e não só, na medida em que houve uma confluência de factores que conduzem a essa necessidade. As tendências do clientes estão na origem da necessidade de redução de pessoal Os clientes usam muito os meios digitais o que reduz os segmentos de clientes que ainda precisam do atendimento presencial. Depois a tecnologia acelerou com a pandemia. Há ainda o facto de “a rentabilidade do sistema bancário estar sob fortíssima pressão”.
Sobre a consolidação do sistema bancário, referiu que esta se pode fazer de várias maneiras, não tem forçosamente de ser por fusões de bancos. Uma delas é por redução de ativos.
No que toca às fusões de bancos estas podem acontecer por iniciativa dos gestores e acionistas para ganhar sinergias e eficiência. Mas – disse também – outra maneira de realizar essas fusões “é por omissão”. Isto é, “quando uma instituição está em dificuldades as autoridades podem vir a procurar uma solução, como já aconteceu no nosso país, que venha a permitir essa forma de consolidação”.
“Não há dúvida que para haver fusão é preciso haver músculo financeiro e até agora o sistema bancário português passou por uma fase de recuperação muito intensa. Hoje em dia, em todos os rácios, os bancos estão bastante sólidos e é isso que lhes permitiu responder, de uma forma tão importante, fazendo parte da solução no combate à crise. Mas também é um facto que os desafios do sistema bancário ainda são imensos. O desafio da resposta à regulação, o desafio da rentabilidade, o desafio da reinvenção do modelo de negócio (digitalização, os critérios ambientais, sociais e de governance, e a reputação) e ainda a resposta à necessidade de uma retoma económica o mais intensa possível”, referiu o presidente da APB.
Faria de Oliveira concluiu dizendo que estes desafios são “inibidores” de fusões no curto prazo. A médio prazo admite que as fusões entre bancos possam acontecer porque “há alguma sobrecapacidade instalada em Portugal”.
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