[weglot_switcher]

Fernão Mendes Pinto e os carros chineses

O setor automóvel ainda resistia a avanços, mas a ascensão chinesa no carro elétrico promete conquistar o globo. O aviso chegou esta semana por parte da Stellantis, o conglomerado automóvel franco-italo-americano que tem investido fortemente na China.
FILE PHOTO: A man cleans a BYD e-SEED GT concept EV during the media day for the Shanghai auto show in Shanghai, China April 16, 2019. REUTERS/Aly Song/File Photo
16 Maio 2025, 08h35

Que carro conduziria Fernão Mendes Pinto se chegasse hoje à China? O português passou pelo Império do Meio nas suas viagens pelo Oriente, tendo sido soldado, diplomata, escravo, missionário, pirata, mercador, peregrino e náufrago.

Era um mundo às avessas, tal a diferença face a Portugal e à Europa, ficando surpreendido com a organização social chinesa, fosse no trabalho, na assistência social ou no sistema judicial.

Mas a sua missão não foi fácil, a Dinastia Ming impunha o isolamento do país face ao mundo exterior. A China foi a utopia de Fernão Mendes Pinto, que usou o Celeste Império para criticar o seu país no seu “documento humano”, como disse António José Saraiva.

Passaram vários séculos e a China normalizou a sua relação com o Ocidente. Apesar de governada com mão-de-ferro pelo opaco Partido Comunista Chinês (Dinas tia Ming 2.0?), Pequim abriu a sua economia a empresas estrangeiras.

Foi a moeda de troca para conseguir vender produtos para todo o mundo, incluindo de alta tecnologia. As marcas europeias não se fizeram rogadas: apostaram em fábricas no maior mercado automóvel mundial; um em cada três automóveis vendidos no mundo é na China.

Além do mais, os preços competitivos de energia, fornecedores e de mão de obra tornaram-no ideal para exportação. O avanço tecnológico chinês está imparável, como o mundo tem assistido a partir da primeira fila: Huawei, DeepSeek, Shein, Alibaba, ou BYD, entre outros.

O setor automóvel ainda resistia a avanços, mas a ascensão chinesa no carro elétrico promete conquistar o globo. O aviso chegou esta semana por parte da Stellantis, o conglomerado automóvel franco-italo-americano que tem investido fortemente na China.

“Fiquei chocado”, disse o líder da Stellantis para a Ásia, Maxime Picat, que está na calha para ser o próximo CEO, sucedendo a Carlos Tavares. O seu choque deveu-se ao avanço tecnológico dos carros chineses em todas as tecnologias, acreditando que o reduto europeu do motor térmico também não vai aguentar muito tempo. “Tem sido muito difícil para os produtores ocidentais manterem a sua quota na China”, disse ao “Financial Times”.

Em 2020, a quota de carros estrangeiros nas vendas superava os 60%. Este ano, anda pelos 30%. A BYD superou a Volkswagen e tornou-se na marca mais vendida. As marcas ocidentais estão agora a apostar mais em fabricar para o mercado chinês para concorrer com os gigantes locais.

Recuando novamente cinco séculos, um português ficou admirado com a sociedade chinesa, tal como o Ocidente está hoje admirado com a rápida ascensão económica de um país que fabricava produtos baratos e de péssima qualidade não há muito tempo, para um dos mais importantes centros tecnológicos mundiais: “ainda que muito hábeis e engenhosos em todo o negócio mecânico e de agriculturas, e arquitetos de engenho muito vivo e inventores de coisas muito sutis e engenhosas”. Fernão Mendes Pinto já topava bem os chineses há 500 anos.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.