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Ramalho diz que banca precisa de solução “biónica” e Meyrelles alerta para risco da política dos juros negativos para a banca

O tema é recorrente nos debates sobre o futuro da banca. Ao contrário do que se tem dito, as grandes concorrentes dos bancos não são as Fintechs, são as grandes cadeias de distribuição. Qualquer cadeia de distribuição que lança um cartão de crédito, por exemplo, está a concorrer com os bancos, lembram os participantes no debate.
9 Abril 2019, 00h16

Decorre a Finance Week da Nova SBE, desde esta segunda-feira, dia 8 de abril, até ao próximo dia 12. No final do dia de segunda-feira, um painel intitulado “Portuguese banking system: can it be more competitive?” juntou no auditório João Talone o Professor Samuel Lopes, com Pedro Pereira, da Boston Consulting Group, António Ramalho (CEO do Novo Banco); e Bernardo Meyrelles CEO do Deutsche Bank Portugal. Mas acabou a discutir-se a banca na era da digitalização, tema que agrada a uma plateia de estudantes da universidade especializada em economia e gestão. Uma antevisão do que será a banca no horizonte de 10 anos dominou a apresentação.

Bernardo Meyrelles defendeu que irão conviver os bancos grandes mais generalistas com bancos mais pequenos de nicho mas que estes têm dificuldade em cumprir com as exigências regulatórias, se estas forem as mesmas exigidas aos bancos grandes. Pelo que os reguladores terão de ajustar o ambiente regulatório à proporcionalidade da dimensão das instituições, para criar condições a estes bancos de nicho, que complementam bem a oferta e são desejados pelos clientes. Se assim não for só haverá lugar aos bancos maiores, com mais capacidade mas menor diferenciação, perdendo o consumidor.

O presidente do Deutsche Bank Portugal, alertou ainda para o facto de os juros negativos estarem a ser penalizadores para os bancos com grande liquidez (depósitos superarem os créditos), uma vez com os juros negativos perdem dinheiro. Bernando Meyrelles vai mais longe e diz que os juros negativos são penalizadores para a poupança. Por isso defende os juros neutrais (0%) porque assim, mantêm-se o expansionismo económico sem afetar os bancos e os aforradores.

As Fintech são mais ágeis e podem criar soluções espontâneas, mas não têm a marca e a credibilidade dos bancos e a base de clientes dos bancos, defenderam os participantes no debate que decorreu sob a forma de aula para os alunos da Nova.

Bernardo Meyrelles começou por defender que a grande mais-valia virá da simbiose das fintechs com a banca tradicional, uma vez que aquelas são complementares destas.

Na era da digitalização a banca precisa de uma solução biónica, isto é, uma solução física  e eletrónica em simultâneo, defendeu António Ramalho.

O tema é recorrente nos debates sobre o futuro da banca. Ao contrário do que se tem dito, as grandes concorrentes dos bancos não são as Fintechs, são as grandes cadeias de distribuição. Qualquer cadeia de distribuição que lança um cartão de crédito, por exemplo, está a concorrer com os bancos, defendem os participantes no debate.

António Ramalho defendeu ainda  que o que mudou na banca foi um alargamento dos meios de aproximação aos clientes. “A nossa regulação é muito conservadora”, explicou o CEO do Novo Banco que citou o caso dos grandes bancos britânicos e espanhóis que vendem produtos variados, incluindo produtos alimentares, coisa que a legislação do Banco de Portugal não permite, ao nível das “compliance rules”.

António Ramalho defendeu também que os balcões dos bancos vão ter formatos diversos e mudar de coreografia, como por exemplo passar a ser coffee shops, como no mais recente balcão do Santander Totta.”Por último ter balcões é uma vantagem competitiva face aos bancos que não os têm. O “how to use de branch”, é que é o desafio.

Depois disse, e nesse aspeto concordou com os colegas de painel, que o uso de balcões  não é uma vicissitude dos clientes mais velhos, porque a verdade é que abaixo dos 45 anos os clientes vão aos balcões, e que só a faixa etária dos 45 a 55 anos vai menos aos balcões. Por fim, citou o caso do banco digital Banco Best que deve o seu sucesso à presença física em balcões, tal como de resto o ActivoBank do BCP. Sobre a questão da digitalização ir fazer desaparecer os balcões físicos ninguém concordou com essa tese.

O responsável pela BCG disse mesmo que os balcões não vão desaparecer porque servem as empresas e os particulares.

Depois António Ramalho aproveitou para citar que a maior rede de balcões é do Crédito Agrícola, mas em segundo lugar vem o Santander, em terceiro o BCP e só em quarto vem a CGD.

Em relação à questão posta pelos alunos relativa à confiança na banca digital, num cenário em que os bancos não têm suporte físico, Bernardo Meyrelles respondeu que essa credibilidade depende do que se vende. A marca do que se vende impõe-se à credibilidade do distribuidor. António Ramalho citou o caso de sucesso da venda de um fundo do JP Morgan.

Já no que toca aos depósitos, diz Bernardo Meyrelles, esses sim são mais dependentes da credibilidade do banco.

“De início a marca precisa de estar acoplada ao vendedor, ao produtos, ou ao distribuidor, porque caso corra mal os clientes precisam de uma porta onde ir bater”, diz o CEO do Deutsche Bank em Portugal.

António Ramalho falou de um paradoxo. Por um lado os portugueses são os mais desconfiados do e-commerce, mas aceitam pagar por ATM os seus impostos, e é uma relação bilateral com a Autoridade Tributária. Pelo que “a percepção de confiança é relativa”, diz.

“A qualidade dos serviços nas ATMs é superiormente elevado em Portugal. Exemplo é o facto de em certos pagamentos fiscais o cliente interagir com a ATM”, disse António Ramalho, que lembrou que na ATM é pedido um código (9 dígitos) e a máquina responde com o valor a pagar. O que significa um diálogo com o sistema”, e isto não acontece em nenhum país.

O normal é apenas um monólogo, o cliente isere um código, insere o montante e dá a ordem. Sem a máquina responder.

Os bancos compram e  vendem risco e a confiança é  base da industria, defendeu ainda o CEO do NB, noutro contexto.

Sobre a fintech Revolut, Ramalho disse que o Novo Banco a acompanha com curiosidade e defendeu que se trata de “um exemplo muito interessante” em termos da evolução de um serviço gratuito para um serviço pago, e lembrou que os bancos tentaram fazer isso com o multibanco e não conseguiram.

Mais tarde o tema virou para as fusões e aquisições na banca. Bernardo Meyrelles defendeu que para além das fusões intrapaíses europeu, haverá fusões cross-border no futuro. Isto porque os bancos europeus vão precisar de ganhar dimensão global para competir com os Estados Unidos e a China, e que isso não se consegue apenas com fusões intra-países.

Recorde-se que neste momento se discute a fusão do Deutsche Bank com o Commerzbank.

Já António Ramalho disse que os bancos europeus são orientados para segmentos (affluent, mass market, etc), mas que os bancos dos Estados Unidos e do Reino Unido são “product oriented“, o que significa que cada clientes pode ter vários bancos, em função dos produtos que precisa.

A este propósito o professor Samuel Lopes, lembrou que o busílis desta questão está no facto de os EUA serem um país integrado e a Europa ser um processo em construção, com 28 jurisdições e 28 países.

Por exemplo uma operação de crédito em Portugal cujo colateral está em Espanha, no Reino Unido ou na Alemanha, é um problema porque se tem de lidar com diferentes legislações. Por isso a limpeza dos balanços nos bancos europeus é muito mais morosa do que nos bancos americanos.

 

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