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Gonçalo Leite Velho: “Penso que cumpri o propósito de defender os mais frágeis, o valor e a dignidade da profissão”

Despede-se esta sexta-feira, 18 de dezembro, da liderança do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup), onde cumpriu um mandato de quatro anos. Com ele, a ação sindical ganhou a prática e o rigor da investigação.
  • Gonçalo Leite Velho
18 Dezembro 2020, 18h05

Gonçalo Leite Velho nasce em Angola em 1975, mas cresce na Figueira da Foz. Em 1999 termina a licenciatura em Arqueologia pela Universidade de Coimbra, onde integra a Direção Geral da Associação Académica e toca bandolim numa das tunas coimbrãs. Dá aulas no Politécnico de Tomar desde o ano 2000. Primeiro nas disciplinas de Pré-história, Antropologia Cultural, Introdução às Arqueologia, Aplicações Informáticas ao Património e Projetos Europeus, depois, fruto dos projetos disciplinares, no curso de Cinema nas cadeiras com ligações à Antropologia (Antropologia Visual) e à Arte (Cinema Experimental), mais tarde, também, nas disciplinas de Projeto e Análise. Coordenou projetos europeus na área da Arte, Ciência e Tecnologia e participou em missões internacionais, incluindo escavações em Stonehenge, nos anos 2007 e 2008. Em Portugal, co-coordenou as escavações de Castanheiro do Vento, um emblemático recinto monumental da Idade do Cobre, em Foz Côa. Foi também diretor do Departamento de Artes, Design e Comunicação do IPT e Diretor do Curso de Vídeo e Cinema Documental da ESTA. Sindicalizado desde o ano 2000, quando iniciou a carreira académica, voluntariou-se para delegado sindical tendo sido eleito em 2006, mantendo toda a atividade académica e científica. Em 2016 foi eleito presidente do SNESup, sindicato que representa professores universitários, do politécnico e investigadores. Doutorado em Arqueologia, com o tema a Reconstrução, pela Universidade do Porto, frequenta, desde 2015, o segundo doutoramento em Governação Inovação e Conhecimento, na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. No futuro próximo gostaria de estar mais concentrado no doutoramento. Vai regressar à academia com muita vontade de investigar.

Esta sexta-feira, 18 de dezembro, é o seu último dia no Sindicato do Ensino Superior como presidente. Sai com a missão cumprida?

Foi um tirocínio. Quatro anos como Presidente é um exercício desgastante. Temos de lidar diariamente com injustiças, queixas, dificuldades. Mas penso que cumpri o propósito de defender os mais frágeis, o valor e a dignidade da profissão, orientado à comunidade e ao bem comum.

Como encontrou o ensino superior e a ciência e como os deixa?

Encontrei uma realidade fragmentada e algo opaca. Procuro deixar um legado mais formalizado, sobretudo em termos de contratos e regras, que procura inverter o deslaçamento das instituições. Deixo uma monitorização de dados, que permite transparência e um melhor conhecimento do sistema.

Resumidamente, que balanço faz do seu trabalho na liderança do SNESup?

Foi possível introduzir vários temas (os contratos, as leis, os saldos, os dados), com grande rigor. Sobretudo aplicar a prática de investigação para a governação, a negociação e a ação sindical. Há uma evolução na forma como se aborda agora o sistema.

Das causas por que lutou, qual foi a que lhe deu maior alegria no final?

Sem dúvida o Emprego Científico. Naquele momento sabíamos que estávamos a mudar estruturalmente algo na sociedade portuguesa. Acabar com a lógica das bolsas para instituir os contratos. Apostar numa geração e nas seguintes, dando futuro ao país.

Qual foi o que mais dores de cabeça lhe deu?

Lidar com algumas reclamações dos colegas, centradas exclusivamente no individual, nos egos, sem qualquer ideia de solidariedade, ou de bem comum. Uma tentativa de utilizar os sindicatos, como se fosse um serviço, incluindo de advocacia low cost. Muito difícil.

Que dossiês deixa em aberto para a sua sucessora?

A revisão das carreiras (docente e de investigação), a revisão do RJIES e o regime de carreira de docência e investigação no ensino superior privado.

Trabalhou de perto com dois ministros muito diferentes: Nuno Crato e Manuel Heitor. Que avaliação faz? Na sua perspetiva, qual serviu melhor o desígnio do ensino superior?

Nunca trabalhei com Nuno Crato. Apenas com os seus secretários de Estado, sobretudo com José Ferreira Gomes, com quem gosto de dialogar. Mas Manuel Heitor tem um lugar especial. Com ele honrei um princípio de amizade, inscrito no livro “O Amigo” de Giorgio Agamben.

Na hora da saída, que mensagem deixa aos professores e investigadores deste país?

Inscrevam-se na defesa da comunidade. O individualismo e a atomização institucional tem vindo a minar-nos politicamente. É fundamental defendermos a dignidade e o valor da nossa profissão. Juntos somos mais fortes e é para cumprir.

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