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Governo avisa deputados para sigilo na divulgação de dados da auditoria ao Novo Banco

Na consulta à auditoria especial aos atos de gestão do BES/Novo Banco, os deputados vão estar impedidos de divulgar informação abrangida pelo segredo bancário. O alerta é feito pelo ministro das Finanças na carta que acompanhou o envio do relatório ao Parlamento, cujo documento foi classificado como “confidencial”. Parlamentares não poderão, por exemplo, divulgar os valores individuais e os nomes de quem contraiu dívidas junto do BES e do Novo Banco.
1 Setembro 2020, 14h19

O Governo enviou na madrugada desta terça-feira, 1 de setembro, à Assembleia da República  a auditoria da Deloitte aos atos de gestão dos últimos 18 anos do BES/Novo Banco e que revela perdas de 4.042 milhões de euros. Mas salvaguarda na carta que acompanha o relatório em suporte informático que estará impedida a divulgação de informação abrangida pelo segredo bancário. Em causa estão dados sob sigilo como valores individuais e os nomes de quem contraiu dívidas junto das entidades que foram alvo de análise na auditoria especial que foi classificada como “confidencial”.

“Sublinha-se que o relatório da auditoria especial contém informação sujeita a sigilo bancário que, não sendo oponível para efeitos de transmissão à Assembleia da República e ao Governo nos termos da Lei nº 15/2019 de 12 de fevereiro, vincula os destinatários do mesmo ao dever de reserva nos termos previstos nos artigos 78 e seguintes do regime geral das instituições de crédito e sociedades financeiras [RGICSF]”, lê-se na carta do ministro das Finanças, datada de 31 de agosto, dirigida ao Presidente da Assembleia da República que acompanha o relatório de auditoria enviado em suporte informático, a que o JE teve acesso.

João Leão sinaliza, assim, que os deputados da Assembleia da República, segundo o RGICSF, não podem revelar ou utilizar informações sobre factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações desta com os seus clientes.

O presidente da Comissão de Orçamento e Finanças (COF), Filipe Neto Brandão, revelou ao Jornal Económico que aguarda parecer dos serviços jurídicos desta comissão parlamentar e identificação por parte do Governo dos elementos do relatório que estão abrangidos pelo sigilo para poder desclassificar os restantes.

Recorde-se que em maio do ano passado, o Banco de Portugal (BdP) divulgou o relatório extraordinário sobre os maiores devedores da banca. Mas os números reportados pelas instituições financeiras ficaram “escondidos” num anexo, com o regulador a relembrar que está abrangido pelo segredo bancário, tendo apenas divulgado informação de forma agregada e anonimizada, a informação reportada pelas oito instituições de crédito abrangidas. Na altura, o BdP considerou que divulgar informação sobre as operações e os clientes ameaça a estabilidade financeira.

A entrega do relatório da auditoria especial da Deloitte aos atos de gestão do BES/Novo Banco entre 2000 e 2018, foi feita no início da madrugada desta terça-feira, 1 de setembro, ao presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, sendo o destino a comissão parlamentar de orçamento e finanças (COF). A decisão sobre o que vai ser tornado público deste documento deverá resultar da interação entre o Ministério das Finanças e o próprio Parlamento.

Tal como o JE avançou ao final desta manhã, está agora nas mãos do presidente da Comissão de Orçamento e Finanças (COF) definir em que termos e por quem poderá ser consultada a auditoria que Deloitte entregou ao Governo sobre os atos de gestão dos últimos 18 anos do BES/Novo Banco e que revela perdas de 4.042 milhões de euros. Documento será remetido pelo Governo à Procuradoria-Geral da República.

Deputados e funcionários do parlamento obrigados a sigilo

Segundo a nova lei, à disponibilização desta informação “não é oponível o segredo bancário e de supervisão”, mas os deputados e trabalhadores da Assembleia da República ficam sujeitos a duas restrições impostas no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, que estabelece que “ficam sujeitas a dever de segredo todas as autoridades, organismos e pessoas que participem nas trocas de informações” com o Banco de Portugal, e que o BdP “só pode comunicar informações que tenha recebido de entidades de outro Estado-Membro da União Europeia ou de países não membros com o consentimento expresso dessas entidades e, se for o caso, exclusivamente para os efeitos autorizados”.

O diploma diz também que o Banco de Portugal “pode, a título meramente indicativo e em documento autónomo, apresentar sugestão, segundo um critério de estrita e absoluta indispensabilidade e com fundamentação especificada, de quais os dados da informação relevante comunicada que estariam eventualmente sujeitos a segredo bancário ou de supervisão”.

A lei 15/2019 define as regras relativas à transparência da informação relativa à concessão de créditos de valor elevado e reforço do controlo parlamentar no acesso a informação bancária e de supervisão.

Nas exceções ao dever de segredo, a nova lei prevê que “os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo só podem ser revelados às comissões parlamentares de inquérito da Assembleia da República, no estritamente necessário ao cumprimento do respetivo objeto, o qual inclua especificamente a investigação ou exame das ações das autoridades responsáveis pela supervisão das instituições de crédito ou pela legislação relativa a essa supervisão”.

Auditoria revela perdas de mais de quatro mil milhões

A Deloitte entregou ao Governo a auditoria aos actos de gestão dos últimos 18 anos do BES/Novo Banco, nesta segunda-feira, 31 de agosto. Segundo as Finanças, a auditoria analisa 283 operações que geraram perdas de quatro mil milhões de euros. A auditoria será remetida pelo Governo à Procuradoria-Geral da República.

Segundo as Finanças, o documento evidencia que as perdas do Novo Banco se deveram “fundamentalmente” à exposição a ativos “que tiveram origem no período de atividade do Banco Espírito Santo” — tal como o Jornal Económico noticiou na semana passada — e que foram transferidos para o balanço do Novo Banco após a resolução do BES.

A amostra total da auditoria da Deloitte ao Novo Banco abrange 283 ativos, entre créditos, imóveis, títulos e operações com subsidiárias que tenham gerado perdas cobertas pelo Mecanismo de Capital Contingente (CCA). A amostra terá abrangido 100 devedores e outros que o Fundo de Resolução tenha decidido adicionar ao escrutínio da Deloitte.

Sobre o período de análise ao Novo Banco, entre 4 de agosto de 2014 (um dia depois da resolução do BES) e 31 de dezembro de 2018, a Deloitte concluiu que esta instituição de crédito incorreu em perdas líquidas de 4.042 milhões de euros em 283 operações.

Foram analisados três blocos de atos de gestão do Novo Banco praticados naquele período. Foram auditadas 201 operações de crédito que geraram perdas de 2.320 milhões de euros, 26 operações com subsidiárias e associadas, que causaram perdas de 488 milhões de euros e ainda 56 operações com outros ativos, que geraram perdas no valor de 1.234 milhões de euros.

Trata-se de um relatório “extenso” e que “descreve um conjunto de insuficiências e deficiências graves de controlo interno no período de atividade até 2014 do Banco Espírito Santo no processo de concessão e acompanhamento do crédito, bem como relativamente ao investimento noutros ativos financeiros e imobiliários”, frisam as Finanças.

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