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Governo justifica requisição civil do Zmar por “falta de acordo”. Advogado dos proprietários diz que é “falso, nada foi discutido”

Tal como o Jornal Económico avançou, o Governo vai usar este empreendimento para isolar pacientes infetados com Covid-19 na região de Odemira. O Executivo diz que decidiu avançar para a requisição depois de não ter conseguido chegar a acordo com a unidade hoteleira. Mas advogado dos proprietários assegura: “isso só pode ser falso, porque não discutimos nada”.
30 Abril 2021, 18h20

O empreendimento turístico de Odemira, que atravessa um processo de insolvência, vai alojar pessoas infetadas com a Covid-19 que necessitam de confinamento obrigatório e isolamento profilático. Tal como o JE noticiou em primeira mão, o Governo avançou para requisição temporária do Zmar no concelho da região do litoral alentejano que apresenta uma das maiores taxas de incidência de casos ao nível nacional. A decisão do Executivo vem no seguimento da instauração das cercas sanitárias nas freguesias São Teotónio e Longueira-Almograve do concelho. E é justificada com a falta de acordo com o eco-resort da Zambujeira do Mar. Mas o advogado dos proprietários das casas do Zmar assegura que nada foi falado no sentido de um acordo, que não foi discutida qualquer indemnização, nem sequer foi dado tempo para identificar os proprietários uma vez que, frisa, qualquer requisição terá de ser a cada uma das pessoas e não do empreendimento na sua globalidade.

Nuno da Silva Vieira, advogado da Antas da Cunha ECIJA, representa 114 proprietários assegura: “quando o Governo vem dizer que não chegou a acordo co os proprietários ou com o empreendimento [Zmar] isso só pode ser falso, porque não discutimos nada nem sequer nos deram tempo para identificar os proprietários. Não foi discutida qualquer indemnização nem quando o Governo estava a ponderar avançar para a requisição”. Nuno Vieira acrescenta que “houve simplesmente um telefonema” seu ao representante do gabinete do ministro da Economia no sentido de saber mais sobre este processo e disponibilizou-se para o diálogo. “A partir daí não houve mais nada”, sublinha.

O advogado que representa 114 proprietários, donos de 160 casas, porque temos algumas pessoas que são donas de mais de uma casa, dá conta de que na quarta-feira passada, soube pelo administrador de insolvência, Pedro Pidwel, que o Governo tinha intenção de requisitar o Zmar e ficou ”preocupado com a situação”.

“Contactei o gabinete do ministro da Economia e disse que tínhamos um problema, porque o Zmar não é um hotel como os outros”, avança, explicando que o Zmar “é um conjunto de propriedades de várias pessoas e portanto qualquer requisição terá de ser a cada uma das pessoas e não do empreendimento na sua globalidade”.

Nuno Vieira da Silva revela que deu conta ao representante do gabinete do ministro da Economia que tinha um canal direto através da sua pessoa enquanto representante dos proprietários caso precisasse de falar sobre esta medida, tendo sinalizado desde logo que “não vai ser fácil porque as pessoas não estão para aí viradas”.

O advogado sublinha que não voltou a ser contactado pelo gabinete de Siza Vieira e a partir daí, garante: “não tive mais contacto nenhum”.

Requisição determinada por interesse público

Segundo despacho da Presidência do Conselho de Ministros e Administração Interna, ontem publicado em Diário da República, “a falta de acordo com a sociedade comercial supra indicada, fundamenta que, por razões de interesse público e nacional, com caráter de urgência se reconheça a necessidade de requisitar temporariamente o «ZMar Eco Experience» e os respetivos serviços, na medida do adequado e estritamente indispensável para a proteção da saúde pública na contenção e mitigação da pandemia no município de Odemira e nos municípios limítrofes, mediante a alocação do espaço à realização do confinamento obrigatório e do isolamento profilático por pessoa a quem o mesmo tenha sido determinado.”

“É decretada a requisição temporária, por motivos de urgência e de interesse público e nacional, da totalidade dos imóveis e dos direitos a eles inerentes que compõem o empreendimento “ZMar Eco Experience”, sito na Herdade A-de-Mateus, em Longueira-Almograve, Odemira”, pode-se ler no documento.

Tal como o Jornal Económico revelou nesta quinta-feira, 29 de abril, em primeira mão, o Governo decidiu avançar com esta medida perante o surto de casos registados neste concelho do litoral alentejano entre os trabalhadores de explorações agrícolas.

Contra esta decisão de requisição do empreendimento está mais de uma centena de proprietários dos bungalows do eco-resort, localizado na Zambujeira do Mar, que tem uma componente de alojamento turístico temporário, mas também uma componente imobiliária, onde há casas que pertencem a terceiros, no âmbito de contratos de direito de ocupação.

Para os advogados dos proprietários esta decisão do Governo terá “fortes implicações”, já que “o investidor que na passada terça-feira, no Tribunal Judicial de Odemira, se disponibilizou para investir na recuperação do Zmar, não o fará nestas circunstâncias, uma vez que a requisição civil destrói qualquer possibilidade de disponibilizar o Zmar aos turistas neste verão”.

A unidade inaugurada em junho de 2009 garantiu recentemente que iria reabrir “em breve”, cumprindo com todas as normas de higiene e de segurança da DGS para receber os seus hóspedes nas habituais férias na Costa Vicentina”. Uma posição assumida a 5 de abril ao JE pelo administrador de insolvência, Pedro Pidwell da Silva, que afirmou que, depois da assembleia de credores, o objetivo é voltar a reabrir as portas do eco camping resort, cuja dona e gestora do empreendimento – denominada Multiparques A Céu Aberto – foi declarada insolvente em março.

O Zmar tem 160 Zmontes (casas) que pertencem a privados, incluindo algumas figuras públicas como Sara Matos e familiares do ator Pedro Lima.

Incidência em Odemira não é real, diz autarquia

No despacho, o Governo aponta que a situação no município de Odemira apresenta uma “particular gravidade, com uma incidência cumulativa a 14 dias superior a 560 casos por 100 mil habitantes à data de 28 de abril”.

A autarquia reconhece este cenário e mantém as críticas ao atual modelo de avaliação da pandemia. Diz que a incidência calculada em Odemira não é real, uma vez que muitos dos casos de infeção são registados em população migrante, que chega ao concelho no período das colheitas e que não está recenseada na região que foi um dos concelhos que foi obrigado a recuar no desconfinamento.

O despacho dá conta de que Odemira conta com uma população relevante de trabalhadores sazonais do sector agrícola “cujas condições de habitação dificultam a realização dos períodos de confinamento obrigatório e isolamento profilático determinados pelas autoridades de saúde, torna-se necessário encontrar instalações adequadas para a realização de tais períodos”.

O Executivo aponta que o Zmar “é um estabelecimento que apresenta as condições aptas e adequadas para a realização de confinamento em isolamento por pessoa a quem o mesmo tenha sido determinado pelas autoridades de saúde”.

Devido à “situação epidemiológica, particularmente grave no município de Odemira, bem como a falta de acordo com a sociedade comercial supra indicada, fundamenta que, por razões de interesse público e nacional, com caráter de urgência se reconheça a necessidade de requisitar temporariamente o “ZMar Eco Experience””.

Segundo o Executivo, esta medida é “estritamente indispensável para a proteção da saúde pública na contenção e mitigação da pandemia no município de Odemira e nos municípios limítrofes, mediante a alocação do espaço à realização do confinamento obrigatório e do isolamento profilático por pessoa a quem o mesmo tenha sido determinado”.

De acordo com o documento, o município de Odemira vai ficar responsável por gerir o empreendimento com o apoio da autoridade de saúde e da Segurança Social.

“Fica também estabelecido que o” pagamento de indemnização pelos eventuais prejuízos resultantes da requisição” é “calculada nos termos do Código das Expropriações, com as necessárias adaptações”, sendo “responsabilidade do Ministério das Finanças”.

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