No mês de Agosto, seja por falta de tema, ou pela curiosidade sobre o mesmo, surgiram em diversos órgãos de comunicação social declarações de um dos operadores económicos de maior peso no comércio alimentar, lamentando o excesso de actividade promocional no sector. Trata-se de uma evidência para qualquer observador, mesmo distante, já que uma das originalidades do mercado português é o facto de mais de 45% das compras do consumidor serem feitas em promoção. Tem por isso sentido reflectir sobre a real influência dos três principais intervenientes deste mercado: Comércio, Indústria e Consumidor.

O comércio alimentar português apresenta uma das mais altas taxas de concentração na Europa. Os dois maiores operadores representam 50% a 60% do volume de negócios. É uma situação resultante da rápida e excessiva desregulação fomentada pelas leis de 2003 (governo de Durão Barroso) e 2009 (governo de José Sócrates), intensificada pela atitude de um grande número de municípios, em troca de pequenos benefícios imediatos e conjunturais (rotundas, festas, desporto, etc.).

Atribuir culpas ao operador é um erro. Como se diz no futebol, uma equipa joga o que a outra deixa jogar. Assim, essas empresas limitam-se a gerir, e bem, os seus interesses, aproveitando o quadro legal que lhes era, e é, favorável.

A indústria de bens de consumo é provavelmente o actor com posições mais contraditórias. Por um lado, lamenta – e em geral com razão – as pressões dos grandes operadores de comércio, quer na área promocional quer em outras imposições, por vezes prepotentes. Esquece, no entanto, que foi um dos grandes defensores e responsáveis da actual desregulação,  na ilusão de que teria  ganhos com a divisão do comércio. Esqueceram-se que a realidade da economia sempre mostrou que, se o excesso de regulação é negativo, o excesso de desregulação gera um fenómeno de concentração, como se vê.

Será que o vencedor é o consumidor como alguns apregoam? Trata-se de um equívoco, pois por um lado, todos – mas em especial as PME da Indústria e do Comércio – são esmagados pela diminuição da sua capacidade de negociação e pela redução brutal das margens, com forte impacto no emprego. Encerramentos, estruturas cada vez mais pequenas, maior centralização, são os efeitos perniciosos desta situação. Por outro lado, as tabelas de preços são infllacionadas para compensar a pressão das acções promocionais, iludindo o consumidor, que acaba por comprar a um “preço normal” com a imagem de “preço baixo”.

Quais as saídas deste círculo vicioso?  Voltaremos ao tema.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.