Marina Gonçalves, deputada socialista e ex-ministra, reconhece que os pontos de “convergência” entre o PS e a Aliança Democrática (AD) em matéria de habitação “são muitos”, estando os dois partidos “muito alinhados” nos objetivos traçados. “No médio prazo, temos muitas condições para encontrar aquilo que o país precisa – consensos estruturais – desde que [a solução] seja verdadeiramente para a classe média, porque temos um foco e uma responsabilidade na política pública”, afirmou Marina Gonçalves esta segunda-feira na conferência “a Habitação depois de 18 de Maio”, organizada pelo Jornal Económico e pela CMS Portugal.
Ao longo do painel, no qual debateu com o deputado do PSD Gonçalo Lage, a antiga ministra da Habitação do PS sinalizou que os dois partidos divergem mais nas soluções para o curto prazo, embora reconheça que ambos concordam com a necessidade de se alargarem os apoios.
“Os pontos de convergência são muitos”, começou por dizer Marina Gonçalves, fazendo também uma autocrítica. “Nós, políticos, às vezes perdemos muito tempo a discutir quem fez mais, quem fez mais rápido”, quando na realidade PS e PSD concordam “em quase tudo” no que diz respeito à problemática da habitação em Portugal.
Depois de ouvir a secretária de Estado da Habitação na conferência, a ex-ministra socialista disse concordar “com quase tudo”, quer no diagnóstico traçado quer no caminho para resolver a crise, nomeadamente o reforço da habitação pública, o reforço das parcerias com os privados e as cooperativas, a necessidade de simplificar todo o tipo de procedimentos – “não apenas a camarária” , a estabilidade do financiamento e o “porquê de estarmos na situação em que estamos”.
“A verdade é que não estamos assim a divergir tanto, pelo contrário, diria que estamos muito alinhados no objetivo. O que acontece muitas vezes é que o alinhamento dos objetivos não se reproduz naquela que é a dimensão da discussão política e na forma como colocamos as coisas”, assinalou Marina Gonçalves, passando a enumerar três divergências com o atual Governo que revogou o programa Mais Habitação, do PS, para o substituir pelo Construir Portugal.
A primeira divergência prende-se com o facto de a AD dizer que no último ano garantiu o financiamento que não estava garantido. “Aí sempre tive uma divergência de fundo na forma como foi apresentado o Construir Portugal. O PRR [Plano de Recuperação e Resiliência] não foi o programa de habitação apresentado pelo governo [do PS]. O 1.º Direito é de 2018, a Bolsa de Arrendamento Acessível é de 2019, a pandemia foi em 2020, o PRR surge no âmbito da pandemia. Por isso, resumir e limitar a política de habitação ao PRR é errado politicamente porque não corresponde à realidade. O PRR financiou a 100%, obrigou a esta rapidez na execução, mas é uma fonte de financiamento que, no fundo veio substituir aquilo que estava previsto no 1.º Direito, e temos mais é que o concretizar”, argumentou Marina Gonçalves.
E referindo-se ao objetivo do objetivo da AD de garantir 59 mil casas até 2030, a deputada do PS lançou a questão: “Como é que respondemos às 130 mil [em falta] que estão identificadas pelos municípios?” – , respondendo de seguida com o desafio que se coloca e que exige união de esforços. “Temos de fazer o caminho pós PRR. O trabalho que temos de fazer em conjunto é garantir que este financiamento das políticas de habitação continua para lá das 59 mil habitações”, como, por exemplo, a proposta do PS de “usar os dividendos da Caixa Geral de Depósitos (CGD), para “garantir que temos dinheiro alocado às necessidades que os munícipios estão a identificar”.
Outra divergência com o atual Governo – “ou preocupação” – prende-se com o IVA a na construção. “A secretária de Estado já aqui disse que a medida que apresenta hoje não é a mesma que apresentava há um ano, já não é os 6% para toda a construção. Hoje olhamos para habitação a custos controlados, quer para venda quer para arrendamento e o IVA é a 6%, desde que seja para responder à classe média. Se falamos numa dimensão de desburocratizar o procedimento, também não precisa do Parlamento, podia já ter sido feito por via de portaria”. “Não é uma crítica, é uma dificuldade em perceber no que é que, afinal, estamos a divergir”, apontou a deputada, reconhecendo “complexidade em aceder” a estas medidas fiscais, como no IVA a 6%, que tem de ser melhorada.
O terceiro ponto mencionado pela antiga ministra da Habitação relaciona-se com o Alojamento Local (AL), onde os dois partidos têm “uma divergência de fundo”. Neste ponto, Marina Gonçalves lamentou que o PSD tenha criado a narrativa de que o PS “estava a culpar e a diabolizar o AL com as medidas do Mais Habitação”.
“Nunca foi essa a perspectiva, isso foi um aproveitamento político. Nunca se disse que é o AL o principal fator [da crise na habitação], mas também contribui e num momento de emergência em que temos de responder com medidas mais imediatas” como a limitação de AL. “Preferíamos que não fosse necessário pensar em medidas que são restritivas, mas é para nós uma responsabilidade pensar nisso” quando é preciso responder a uma necessidade de habitação para viver.
Apesar destas três dimensões, Marina Gonçalves fez questão de reforçar a tónica nos “pontos de convergência” entre PS e PSD. “O financiamento na habitação pública, a necessidade de simplificar e a necessidade de, em conjunto, encontrarmos parcerias e dar confiança para que o privado seja parceiro na política pública”. “O Estado não procura lucro, procura sustentabilidade do projeto, o privado obviamente que tem uma dimensão adicional”, continuou, rematando: “Temos de encontrar instrumentos para que seja salvaguardado o interesse do privado e salvaguardado o interesse do Estado – o interesse do Estado é a classe média.”
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