A Administração Pública recorreu mais a recibos verdes em 2023 do que 2022. Convenhamos: não estamos propriamente surpreendidos.
Os dados fresquinhos da Direção-Geral da Administração e do Emprego Público, mostram as realidades por detrás desses números, das autarquias à Administração Central. Com uma constante: a hipocrisia, sobretudo perpetrada por quem ataca os empresários e profissionais liberais num espetro sempre negativo. No final, o maior empregador com falsos recibos verdes é o próprio Estado.
Nos Ministérios, o “campeão” é o Trabalho e Segurança Social, o promotor e defensor do trabalho digno. Ciência, Tecnologia e Ensino Superior tem 2.159 vínculos precários. Mas isto esconde desde situações que não são efetivamente precárias, até expoentes de indignidade. Por exemplo, os bolseiros investigadores são altamente fustigados, muitas vezes com muitos anos sem carreira, sem melhoria das condições remuneratórias e sem proteção social adequada na doença e parentalidade.
Mas tratar tudo como “precários” não é correto – por exemplo um projeto de investigação sazonal pode ser temporário sem ser sinónimo de precariedade. Quando se adota um discurso coletivista e moralista, não há como haver uma boa (re)solução.
De novo o “faz o que digo, não faças o que eu faço”. A política laboral tem de ser modernizada e numa ótica de proteção da pessoa, e não do emprego. A flexibilidade, por si, é positiva, e pode ser uma escolha; tal como a dinâmica de contratar. O problema não é o despedimento, é a falta de proteção à pessoa ou a falta de empregabilidade. É preciso responder a diferentes modelos, preferências e à dinâmica de mercado.
É tempo de relembrar a necessidade das Reformas da Administração Pública e do Mercado Laboral. Também é dia de lembrar os Profissionais Liberais e de como esta modalidade pode ser uma escolha, um desígnio, uma forma de vida e que merece tratamento digno.
Mas este texto é sobretudo um desassossego contra a hipocrisia e o moralismo. Porque no final da história, estamos perante um Estado que, como entidade patronal, não trata de avaliações de desempenho, nem de coerência ou competitividade nas carreiras, e que abusa nos falsos recibos verdes; adicionamos o contexto de burocracia, lentidão da justiça, asfixia de impostos e política laboral rígida e, afinal, os trabalhadores têm mesmo é de se proteger do Estado.