O OE2023 fala num aumento de 36,9% no investimento público, que deve chegar aos 8,6 mil milhões de euros, mas este rácio deve-se ao falhanço do Governo com o valor orçamentado para esta rubrica em 2022, com uma execução 14% abaixo do previsto, e nem o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) deve alterar este cenário, especialmente com as dificuldades e atrasos em que tem estado envolvido.
A meta para o próximo ano é ambiciosa: o Executivo pretende ver 3,5% do PIB em investimento público, um objetivo que igualaria o registado em 2011. Para tal, o OE2023 prevê uma dotação de 8.618 milhões de euros, o que, de acordo com o documento aprovado pela Assembleia da República no final do mês de novembro, configuraria uma subida de 36,9% nesta rubrica.
No entanto, esse aumento resulta de uma execução em 2022 bastante abaixo do inicialmente orçamentado. No OE2022, o investimento público contaria com uma dotação de 7.317 milhões de euros, ao passo que o OE2023 aponta para 6.295 milhões aplicados este ano (menos 1.022 milhões de euros ou menos 14% face à meta inicial). Assim, caso se tivesse confirmado a projeção do Governo, o crescimento para este ano seria de apenas 17,8%, e não os 36,9% anunciados.
Parte desta diferença entre orçamentado e executado prende-se com as dificuldades vividas com o PRR, que regista já 100% de contratação nas várias dimensões, mas com valores pagos muito aquém do expectável.
As taxas de aprovações nos três pilares estão já acima de 50%, com 62% na dimensão da ‘Resiliência’, 53% na ‘Transição Climática’ e 69% na ‘Transição Digital’; em contraste, esta última rubrica conta com a maior taxa de pagamento, com 16%, seguida da ‘Transição Climática’, com 9%, e a ‘Resiliência’, com 4%.
Esta realidade tem levado a avisos de vários sectores, com destaque para a construção, que tem sido a mais condicionada pela subida rápida e inesperada dos custos intermédios, o que coloca em causa os contratos celebrados. Ao mesmo tempo, o Governo garante ter a plena noção da importância de um plano visto como tendo um potencial reformador da economia nacional.
Fernando Alfaiate, responsável pela Missão Recuperar Portugal, explica que os atrasos se devem a “uma nova metodologia”, focada em resultados, preferindo colocar a atenção na aplicação dos fundos e não na celeridade do processo. Ainda assim, reconhece, a probabilidade de Portugal receber o segundo cheque vindo de Bruxelas ainda durante este ano “é baixa”.
António Nogueira Leite, economista e professor universitário, sublinha a dificuldade política em conseguir adiamentos dos prazos de execução, até porque, sendo um pacote de resposta à pandemia, “será muito difícil daqui a oito ou nove anos justificar um programa desenhado para responder a um problema que já passou há tanto tempo”.
Inflação e mão-de-obra são problemas
Ao mesmo tempo, há outras dificuldades associadas, nomeadamente os problemas em termos de contratação pública e a inflação, continua.
Já Susana Peralta aponta à questão da “adicionalidade do PRR”, ou seja, se o envelope financeiro desenhado por Bruxelas “vai mesmo financiar novos projetos ou se vem ‘tapar buracos’”, como já foi sugerido por alguns agentes económicos. O mais recente, recorde-se, foi Rui Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto, que acusou o Governo de canalizar as verbas do plano para compensar os desequilíbrios criados pelo processo de descentralização.
Por outro lado, continua Susana Peralta, importa não esquecer que estes investimentos geram despesa futura, o que contará para os exercícios orçamentais seguintes, e aponta a “dificuldades de execução que vão para além da falta de dinheiro”.
Na mesma linha, Nogueira Leite diz-se “convencido que outros partidos no Governo estariam nisto momento a ser atacados pelos atrasos na execução do PRR”, isto porque o problema se prende sobretudo com o próprio processo de contratação e fiscalização.
“[Esta questão] depende fundamentalmente do ‘edifício’ que foi construído para tentar matar os problemas antes de existirem, na eventualidade de haver problemas, e que obviamente torna tudo muito difícil. Por outro lado, também percebemos que as pessoas não aprendem, e que há situações onde havia perfeitamente tempo e capacidade para fazer processos concursais, mas há esta tendência enorme do ajuste direto”, afirma.
Ao mesmo tempo, vários sectores debatem-se com uma falta generalizada de mão-de-obra e dificuldades de contratação, o que atrasa ainda mais os projetos. Estas dificuldades são transversais, afetando áreas de atividade críticas para o desenvolvimento da economia nacional como os têxteis, a indústria agroalimentar, a de componentes automóveis e a biofarmacêutica, todas elas incluídas nos investimentos previstos no PRR nacional.
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