Ainda ninguém atirou a toalha ao chão, mas está cada vez mais difícil atingir a meta que a Associação Empresarial de Portugal (AEP) ambicionava para as exportações em 2023. Em vez de caminhar para os 60% do PIB, o peso das vendas ao exterior na riqueza produzida pelo país tem estado em queda — e as perspetivas para 2025 e 2026 que constam da proposta de Orçamento do Estado (OE2026) não são promissoras.
A primeira descida no período pós-pandémico ocorreu em 2023 (de 49,5% para 47,2%), seguida de uma outra para 45,8% em 2024 (após a revisão do INE feita em setembro passado). E para os anos seguintes, apesar de o Governo não detalhar no OE2026 qual o peso esperado, é possível constatar que a tendência de descida deverá continuar, uma vez que a evolução prevista para as exportações será sempre inferior à do crescimento do PIB (1,5% contra 2% em 2025 e 1,8% contra 2,3% em 2026).
“É verdade que Portugal está hoje mais longe da meta de exportar pelo menos 60% do PIB até 2030”, constata o presidente do conselho de administração da AEP, Luís Miguel Ribeiro, ao Jornal Económico (JE). Tudo porque há “uma conjuntura internacional adversa, marcada por instabilidade geopolítica, tensões comerciais e guerras”.
Luís Miguel Ribeiro diz ser “difícil, nesta fase, identificar qual poderá ter o impacto mais severo” para o país, mas identifica “um denominador comum: a elevada incerteza, que é o grande entrave a um maior dinamismo das exportações portuguesas”. O responsável refere-se à “falta de previsibilidade quanto às cadeias de abastecimento, à estabilidade dos mercados e às tarifas comerciais internacionais”, que conduz muitas empresas “a adiar decisões de investimento e de atuação nos mercados externos, o que acaba por limitar o crescimento do peso das exportações no PIB português”.
Trump agrava cenário
O diagnóstico coincide com o do Governo, que aponta no OE2026 para “uma incerteza particularmente elevada, causada pelas tensões geopolíticas e pelas profundas alterações da política comercial global, resultantes do aumento do protecionismo norte-americano”.
A guerra comercial “representa importantes riscos descendentes para a atividade económica mundial, para o comércio internacional e para o emprego”. O Executivo antecipa que o impacto das tarifas se faça sentir “sobretudo em 2026”, acreditando que “a procura externa dirigida a Portugal deverá abrandar para 1,9%”, depois de ter chegado aos 3,3% em 2025. E conclui que, embora a exposição direta ao comércio com os EUA seja “relativamente limitada”, os efeitos indiretos “amplificarão o impacto global, dado que as restantes economias europeias serão igualmente penalizadas”. Desta forma, o impacto na taxa de crescimento nacional pode rondar 0,15% do PIB em 2026, dos quais 0,06 pontos percentuais em impactos diretos.
No mesmo sentido, o economista Pedro Brinca assinala que as tarifas “vão gerar uma contração do comércio internacional mundial, tendo efeitos de abrandamento no crescimento das exportações para os EUA”, sublinhando que “o efeito indireto pesa muito aqui”. O professor da Nova SBE lembra, por exemplo, que “a maquinaria de transporte é um dos principais itens de exportação portuguesa, muito dirigido para a Alemanha” e que os germânicos têm na venda de automóveis a sua maior fonte de exportação para os EUA. O choque é em cadeia.
“O clima de incerteza sobre os fatores institucionais no comércio internacional é enorme”, afirma o economista, que não acredita que o peso das exportações no PIB em Portugal aumente muito nos próximos tempos.
Também o economista Daniel Traça antevê que “durante um ou dois anos estes números serão muito afetados pelo contexto internacional”. O diretor da Escola Superior de Administração e Direção de Empresas (ESADE) vê nos 60% do PIB “uma boa meta”, e até entende que Portugal devia “chegar mais longe”, mas reconhece que, neste momento, não é possível a aproximação porque às tarifas impostas pelos Estados Unidos junta-se a situação de “grandes mercados no centro da Europa que estão num período difícil, com risco de recessão”. No entanto, o economista tem “a certeza de que, passando este contexto, as exportações voltarão a recuperar”.
Exportações líquidas a descer
A marcha lenta das exportações é apenas parte do problema. As importações sobem a um ritmo mais elevado (4% em 2025 e 3,6% em 2026), pelo que o contributo da procura externa líquida vai continuar a ser negativo (-1,2% e -0,9%, respetivamente), depois de já o ter sido em 2024.
“É motivo de atenção”, avisa Luís Miguel Ribeiro, uma vez que a economia deverá acelerar ”devido exclusivamente à componente da procura interna”.
“A forte aceleração projetada para o investimento não é acompanhada por uma aceleração das exportações”, o que deverá estar “maioritariamente associado à conjuntura internacional bastante adversa”, salienta. Já a subida das importações “resultará, em parte, do dinamismo da procura interna, da execução dos fundos europeus, cuja intensificação é esperada nestes dois anos, e das perturbações no comércio internacional”.
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