As cidades mundiais estão saturadas com tanto trânsito e as deslocações estão cada vez mais demoradas. Isto é um facto constatado num relatório da consultora McKinsey, sendo que a população se tem afastado, cada vez mais dos meios urbanos por estas mesmas razões. Posto isto, a pandemia trouxe uma certeza para quem a quiser aceitar: todos querem uma melhor qualidade de vida e os centros urbanos não estão preparados para a oferecer.
Estimando um crescimento exponencial da população até 2050, os analistas da McKinsey apontam no estudo ‘Tecnologia de infraestruturas: desafios e soluções para a mobilidade inteligente em áreas urbanas’ que as cidades têm de lidar com o volume de transportes que estão a colocar uma imensa pressão no espaço e estrutura disponível. Para os especialistas, a tecnologia é um grande auxílio que as cidades devem usar, uma vez que esta “alavanca a gestão da infraestrutura de transportes existente com eficiência e as cidades podem proteger ou reconstruir bairros para garantir que estes permaneçam a ser espaços vibrantes”.
De facto, a consultora denuncia que as cidades devem pensar em maneiras de “aliviar o congestionamento, diminuir emissões e salvaguardar os bairros e espaços verdes”, algo que permitirá melhorar a qualidade de vida ansiada pelos cidadãos que se querem manter nos centros urbanos mas só vêem a escapatória como sinal de descanso.
Então, mas qual a relação entre o trânsito e as smart cities? Toda. Com sistemas de trânsito tecnologicamente interligados às cidades, as novas formas de mobilidade ganham um espaço próprio e conseguem ficar conectados dentro do mesmo ecossistema municipal. Ao ligar todo o sistema num só, os municípios e cidades garantem o essencial: que toda a população fica ligada ao mesmo nível, não existindo discriminação, e fazendo com que os principais desafios desapareçam da equação.
É aqui que entra o novo paradigma da mobilidade, que agora engloba três novas vertentes: a mobilidade partilhada, os carros elétricos e os veículos autónomos. Estes serviços podem significar investimentos de até um bilião de dólares em 2030, um valor significativo, mas que nos leva a uma nova vida com foco numa mobilidade controlada pela infraestrutura.
Os analistas defendem que a tecnologia que permite a ligação já existe mas que o seu uso é insuficiente e pouco explorado. Fala-se da Internet das Coisas (IoT), cloud computing e data analytics. É na digitalização desta indústria que se tem focado a grande maioria das alterações para aquilo que se imaginam as cidades do futuro, integrando novas tecnologias e diferentes agentes, bem como fabricantes de equipamentos ditos tradicionais.
Dificuldade na implementação
Aaplicação das tecnologias à grande escalas das cidades traz desafios para as mesmas, porque existem vários envolvidos num único processo, e o mesmo plano dificilmente é aplicável a outras cidades com a mesma eficiência. Ou seja, os planos têm sempre de ser adaptados aos municípios em questão, aos desafios e metas pretendidas.
“Os exemplos internacionais mostram que os projeto de mobilidade urbana são únicos e não podem ser replicados diretamente”. O mesmo plano que resulta emLisboa não irá funcionar em outras cidades europeias como Madrid ou Paris. Os especialistas da McKinsey dizem mesmo que estes têm de ser “feitos à medida” de cada um.
A consultora evidencia dois principais players para que a adoção seja bem sucedida: aqueles que moldam o sistema (políticas, reguladores, municípios e cidadãos) e os responsáveis pela mobilidade em si (empresas de micromobilidade, transportes públicos, infraestrutura de carregamento de carros elétricos e aluguer automóvel).
As políticas têm de ser adaptadas às cidades mas também às necessidades dos cidadãos, que vão mudando ao longo do tempo, e por essa razão é importante ter uma infraestrutura coesa entre si.
Segurança 2.0
Uma metrópole do futuro é também uma metrópole mais segura – e com mais tecnologia, nomeadamente Inteligência Artificial (IA) – para intensificar essa segurança.
Para o diretor geral da Prosegur Security em Portugal, o mercado demonstra “apetência” por estas soluções digitais, embora todo o processo requeira uma “gestão de mudança”, para “fazer a tradução da tecnologia” em aumento da eficiência e produtividade. “Existe um fator dominante muito forte em matéria de IA ou machine learning que é a capacidade preditiva. Na atual conjuntura de riscos cada vez mais difusos e de origem muito diversificada, já não é suficiente possuir um modelo de gestão de segurança dinâmico com informação em tempo real. Temos de ter modelos preditivos, permitindo-nos antecipar eventos que possam colocar em risco as operações dos nossos clientes”, explica Gonçalo Morgado ao JE.
Estima-se que a China tenha mais da metade das cidades inteligentes a nível mundial e que, à medida que cresce o investimento em cloud computing, câmara e sensores mais desenvolvidos através da rede móvel de quinta geração (5G) acelere também a vigilância à base de algoritmos. Por exemplo, a cidade belga de Genk está a utilizar a plataforma “Scene Analytics” da Nokia para medir os níveis de ruído numa rua comercial e reportar aos moradores queixosos e Melbourne recorre a um sistema parecido para tentar combater os aterros sanitários ilegais, segundo relata o portal de notícias do sector “IFSEC Global”.
Por cá, esse trabalho de modernização da área da segurança, em prol dos cidadãos e das empresas, tem estado a ser feito por engenheiros informáticos e investigadores como Vasco Lopes e Bruno Degardin, da Deepneuronic. O sistema que os dois criaram emite alertas visuais e sonoros imediatos – em situações de acidente rodoviário, incêndio, objetos abandonados, agressões, tiroteios, assaltos, quedas, entre outras – e permite controlar o histórico de acontecimentos do local onde está instalado através redes neuronais profundas aplicadas à visão computacional. “É expectável que a aposta e investimento na IA continue a trazer benefícios para todos”, garante o cofundador e CEO da Deepneuronic, Vasco Lopes.
Em declarações ao JE, diz que a digitalização pode apoiar inclusive na retenção dos recursos humanos. “Permite melhores condições de trabalho para quem trabalha nesta área, enquanto reduz, de forma eficaz, o erro humano, permitindo atuar em tempo real numa panóplia de atividades perigosas”, crê. “Trata-se de um trabalho exaustivo e desafiador, tanto a nível psicológico como físico. Os sistemas atuais requerem uma atenção e monitorização constantes, o que provoca altos níveis de exaustão, sendo extremamente propenso a falhas e erros”, alerta Vasco Lopes.
Colaboração além-fronteiras
Mais do que investimento em tecnologia e mobilidade (ver pág. 30) e cumprimento de critérios de sustentabilidade, as cidades do futuro são também aquelas que colaboram entre si para criar sinergias em vários segmentos de atividade. Vejamos o caso de Lisboa e Barcelona, ambas conhecidas pelo triplo “S” – Sun, Sea & Startups (“Sol, mar e startups”). No início deste mês, as duas autarquias juntaram-se para apresentar o projeto ‘Plaça de Barcelona’, uma iniciativa da Câmara Municipal de Barcelona – para aumentar a sua projeção internacional e potenciar o talento digital, as empresas e os negócios locais – na qual Lisboa foi a primeira cidade do mundo a ser escolhida para a receber. A partir de um espaço interativo de conferências no festival de música Sonàr, a ideia é que se torne uma rampa para a entreajuda ibérica.
“É uma boa oportunidade para explicar a um país estrangeiro, vizinho, o que estamos a fazer. O nosso ecossistema nasceu há quase 20 anos, trabalhamo-lo enquanto associação há dez, mas agora estamos a estimular a internacionalização. Isto foi organizado pelo poder local, as câmaras, e nós somos uma organização privada e independente, que representa 1.300 empresas. Logo, temos aqui dois modelos muito diferentes de como fomentar o ecossistema, um exemplo de como a iniciativa pública pode colaborar com a privada”, sugere Mar Galtés, Diretora de Desenvolvimento Corporate na Tech Barcelona.
Para o diretor executivo da Startup Lisboa, “está na altura de deixarmos de olhar para Portugal como um ecossistema local e começarmos a olhá-lo a um nível mais alargado”. “Obviamente, entre Portugal e Espanha, esse é o primeiro passo mais natural”, conclui Gil Azevedo.
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