[weglot_switcher]

Inspeção do Banco de Portugal obrigou ao reforço de imparidades no Novo Banco

Durante o ano passado verificou-se uma redução “expressiva” da evolução dos créditos não produtivos (NPL) de 3,3 mil milhões de euros, disse António Ramalho. Eis o retrato de um banco que tem o seu rácio de capital protegido por um mecanismo milionário de 3,89 mil milhões.
  • António Ramalho, Novo Banco
2 Março 2020, 08h15

Entre as medidas de acompanhamento e supervisão do sistema bancário está o Programa de Inspeção On-Site (inspeção no local pelo supervisor bancário). Foi precisamente o que aconteceu com o Novo Banco em 2019, no âmbito de uma on-site inspection o regulador exigiu ao banco um conjunto adicional de imparidades. A explicação foi dada por António Ramalho na conferência de imprensa de apresentação dos resultados anuais, que foram negativos em 1.058,8 milhões, ainda assim 25% melhores que em 2018.

As imparidades e provisões cresceram 31,8% em 2019 para 935,4 milhões de euros (+225,5 milhões face a 31 de dezembro de 2018). Um peso ainda excessivo e que acaba por contribuir para os prejuízos. Cerca de 78% deste acréscimo (novas imparidades) está relacionado com os ativos que estão sob a alçada do Fundo de Resolução, através do Mecanismos de Capital Contingente (CCA).

Assim, as imparidades e provisões incluem 732,9 milhões relacionados com a atividade legacy, que representam 78% do total do Grupo.

“As novas imparidades não foram significativas, e das que foram constituídas em 2019, 78% fazem parte do legacy“, disse o CEO que acrescentou que este ano foi especial “porque tivemos um ligeiro acréscimo das imparidades, em resultado de ter havido uma on-site inspection que exigiu um conjunto adicional de imparidades”, explicou António Ramalho.

O montante afeto a imparidades e provisões, no valor de 935,4 milhões de euros em 2019, desdobra-se em 627,5 milhões de euros para crédito (o que representa um aumento anual de 364 milhões) e 308,1 milhões para outros ativos e contingências, dos quais 47,3 milhões respeitam a provisões para restruturação e 177,8 milhões de euros estão relacionadas com os processos de venda de ativos não produtivos (NATA II, Sertorius e Albatros) e da GNB Vida.

O banco destaca a “expressiva redução dos créditos não produtivos (NPL) em linha com a estratégia definida”. Assim deu-se uma redução dos créditos não produtivos em -3.308 milhões de euros, de 6.739 milhões para 3.430 milhões, face a dezembro de 2018. Este decréscimo fez com que o rácio de NPL caísse de 22,4% para 11,8% em 2019. Para isso, ajudaram as vendas de créditos e ativos – cuja dimensão das perdas pesou na chamada ao Fundo de Resolução, que é de 1.037 milhões.

A redução do ativo da atividade legacy em 57,9% (-6.176 milhões) em todas as categorias de ativos, é invocado pelo Novo Banco. Sendo que a venda da totalidade do capital social da GNB Vida teve um contributo de -4.076 milhões para o decréscimo observado.

A panóplia de ativos despachados em 2019 inclui ainda a redução na carteira de crédito líquida em cerca de -822 milhões (-35,9%), nos imóveis no valor de -832 milhões (-50,1%) e em outros ativos em -4.522 milhões (-67,4%) (é aqui que está incluída a venda da GNB Vida).

Em termos de qualidade do crédito, na atividade recorrente (sem o legado improdutivo do BES) o custo do risco de crédito, considerando as imparidades para crédito, foi de 91 pontos base. O Novo Banco diz que excluindo os reforços de imparidade extraordinários de 2019, o custo do risco recorrente estaria no intervalo de 55-65 pb.

No Novo Banco Recorrente, os indicadores de qualidade dos ativos recorrentes apresentam uma melhoria observável na redução do rácio de NPL para 3,6%, com as coberturas por imparidades a melhorarem 21,5 pp para 68,3%.

“O Novo Banco fechou o ano com um resultado recorrente muito positivo e um crescimento do negócio acima dos 5%”, disse Ramalho. “Foi um feito. Mas também foi um feito fazê-lo em simultâneo com uma redução de 3,3 mil milhões de euros de NPL e uma redução acima de 50% do seu balanço legado”, concluiu António Ramalho, CEO do Novo Banco, nos resultados.

Novo Banco consolidado
Apesar do banco apresentar as contas de forma desagregada (Legacy e Recorrente), o banco só tem um balanço e uma demonstração de resultados, pelo que interessa fazer o retrato do Grupo NB que apresentou em 2019 um resultado negativo de -1.058,8 milhões, decorrente da combinação de uma perda de 1.236,4 milhões na atividade legacy e de um ganho de +177,6 milhões na atividade recorrente.

Recorde-se que é em resultado das perdas verificadas na atividade legacy no valor de -1.236,4 milhões, que refletem a prossecução do processo de deleverage de créditos e imóveis legacy que estavam no balanço do Banco em 2016, que o NB irá solicitar uma compensação de 1.037 milhões ao abrigo do Mecanismo de Capital Contingente, do Fundo de Resolução [entidade que em termos de contabilidade nacional está na esfera da administração pública] tal como estipulado no contrato de venda.

As perdas incorridas nos ativos protegidos pelo CCA totalizam 3,6 mil milhões de euros.

O valor das compensações solicitadas em 2017 e 2018 e a solicitar relativamente a 2019 totaliza 2,98 mil milhões. Sobram 910 milhões para o montante máximo de compensação estabelecido no CCA é de 3,89 mil milhões.

António Ramalho comparou a compensação de 2,98 mil milhões pedida ao Fundo de Resolução desde 2017, com as perdas estimadas quando o mecanismo foi criado no âmbito da venda de 75% ao Lone Star. “É o valor mais baixo dos três agregados solicitáveis para efeitos da capitalização da instituição: entre o valor contratual máximo de 3,89 mil milhões; o valor das perdas com os ativos do CCA, que se situa em 3,57 mil milhões; e o valor do capital necessário para o cumprimento dos rácios exigíveis que é de 2,98 mil milhões”, explicou o CEO do banco. Ramalho adiantou ainda que “este valor fica aquém do valor que estava previsto nos acordos públicos realizados ente o Estado português, o Banco Central Europeu e a União Europeia, em todos os cenários aí previstos”.

Os aspetos mais relevantes da atividade combinada durante o exercício prendem-se com o comportamento do produto bancário comercial (margem e comissões) que ascendeu a 864,1 milhões de euros (+12,5% em termos homólogos), influenciado pelo crescimento na margem financeira (+19,0%) bem como nos serviços a clientes (+3,1%).

Os resultados de operações financeiras foram negativos em -196,8 milhões de euros, “reflexo das perdas decorrentes da atividade legacy (-269,0 milhões de euros). Em oposição a estes resultados, as reservas de justo valor relacionadas com a carteira de títulos apresentaram um expressivo aumento”.

A evolução dos resultados de operações financeiras face ao período homólogo (-156,5 milhões) reflete os ganhos apurados com a venda e a reavaliação de títulos de dívida pública, as perdas com a reavaliação de instrumentos derivados, para além das perdas decorrentes da atividade legacy .

A carteira de títulos do Novo Banco em dezembro último ascendia a cerca de 12 mil milhões de euros e representava 26,6% do ativo. Da qual, 4,07 mil milhões era dívida portuguesa (-363 milhões de euros do que em dezembro de 2018). Estes são valores líquidos de imparidades.

Os outros resultados de exploração no consolidado incluem, para além de parte das perdas relacionadas com os projetos de venda de ativos não produtivos (-46,2 milhões), o custo com as contribuições para o Fundo Único de Resolução (22,5 milhões) e para o Fundo de Resolução Nacional (12,2 milhões de euros). O que soma 34,7 milhões de contribuição do NB para os Fundos que salvam bancos em caso de resolução.

Os custos operativos consolidados em 2019 apresentam uma redução de -1,8%, situando-se em 478,5 milhões, “reflexo das melhorias concretizadas ao nível da simplificação dos processos e da otimização de estruturas com a consequente redução no número de balcões e de colaboradores, tendo os custos da atividade legacy apresentado uma redução significativa”, anunciou o banco.

O crédito a clientes (bruto) no balanço consolidado registou uma quebra de -1.658 milhões de euros face a dezembro de 2018. A redução no crédito a empresas no exercício de 2019 teve especial incidência no crédito não produtivo da atividade legacy, que decresceu -2.841 milhões de euros. O Novo Banco realça que no exercício de 2019 foram adquiridos portefólios de crédito à habitação no valor de 0,6 mil milhões de euros, os quais tinham sido objeto de operações de securitização do Grupo.

A redução do crédito vencido há mais de 90 dias e do crédito não produtivo (incluindo disponibilidades e aplicações em instituições de crédito) impulsionou a melhoria dos rácios de sinistralidade que se situaram, respetivamente, em 4,0% e 11,8% em 31 de dezembro de 2019 (e que comparam com 12,1% e 22,4% em 31 de dezembro de 2018), descreve o banco.

Já a cobertura por imparidades do crédito não produtivo (incluindo disponibilidades e aplicações em instituições de crédito) situou-se em 56,2%.
A imparidade para crédito totalizou 1,9 mil milhões de euros, representando 6,8% do total da carteira de crédito.

Do outro lado do balanço, em 31 de dezembro de 2019 os recursos totais de clientes totalizavam 34,4 mil milhões, sendo de destacar o crescimento de 12,3% nos recursos de desintermediação.

Recorrente a melhorar desde 2017
O Novo Banco apresentou as contas do seu lado “bom”, a atividade recorrente, e nela destaca-se o crescimento do resultado antes de impostos de -311,4 milhões em 2017 para 175 milhões em 2019. Mas também o crescimento da carteira de crédito a clientes de 8% no Banco recorrente entre 2017 e 2019.

Na atividade recorrente em 2019 é de destacar o desempenho positivo da margem financeira (+104 milhões; +26,9% num ano), o crescimento do comissionamento (+11,5 milhões; +3,7%), o crescimento dos resultados de operações financeiras (+41,8 milhões) e a redução registada nas imparidades e provisões (-51 milhões; -20,1%), parcialmente compensado pela quebra nos outros resultados de exploração (-38,9 milhões).

Os resultados de operações financeiras no NB Recorrente ascenderam a +72,2 milhões, reflexo dos ganhos na venda e reavaliação de títulos, em particular os relativos a dívida pública.

Durante o exercício de 2019 verificou-se um crescimento dos volumes da carteira de crédito (empresas, habitação e consumo) e uma manutenção da receita. O crescimento da carteira de crédito recorrente (+5,6%; +1.303 milhões) para 24,2 mil milhões, registando-se aumentos nas carteiras de particulares e empresas, segundo o banco, confirma a tendência positiva alcançada no 1º semestre. No crédito a empresas, deu-se uma subida de +3,8%; na Habitação o crédito foi +8,3%; já no segmento de crédito ao consumo e outros, o aumento foi de +4,2%.

O NB destacou os depósitos estáveis e o aumento dos recursos totais de clientes (+0,8%; +262 milhões), nomeadamente nos produtos fora de balanço. “O Banco continua a manter uma forte posição de liquidez através do crescimento dos recursos na atividade recorrente”, refere a instituição.

O resultado líquido recorrente de +177,6 milhões compara com o prejuízo de -77,2 milhões em 2018. O resultado antes de impostos evoluiu de +2,2 milhões em 2018 para +175,3 milhões de euros em 2019.

O banco destaca o “produto bancário comercial (margem e comissões) recorrente de +811,9 milhões (a subir +16,6%), e a crescer em todos os trimestres, com a margem financeira e os serviços a clientes a apresentarem crescimentos de +26,9% e +3,7%, respetivamente.

O Novo Banco destaca ainda o “continuado enfoque no controlo dos custos, apesar do investimento no negócio e na transformação Digital”. Os custos operativos recorrentes foram de 460,8 milhões, o que traduz uma redução de -0,8% face a dezembro de 2018.

Plano Estratégico
António Ramalho afirmou na carta ao Parlamento que “o presente (2019) exercício representa um marco importante no processo de reestruturação encetado em 2017, dado ser o fim de um período em que o Novo Banco tinha de cumprir um conjunto alargado de compromissos que constam do acordo assinado entre o Estado Português e a União Europeia, por altura da sua operação de venda, o que dá a essa divulgação uma relevância especial”.

Na apresentação dos resultados fez um balanço dos compromissos assumidos com a Comissão Europeia em 2017 e a evolução do banco até 2019.

Assim, o Resultado Operacional Core ajustado (Produto Bancário Comercial deduzido de Custos Operacionais ajustados) passou de 91 milhões para 400 milhões, cumprindo com o assumido com a DG Comp (Concorrência) de Bruxelas. Já a rede de balcões caiu 18%, de 473 em 2017 para 387. O banco regista ainda uma redução do quadro de pessoal de 11% para 4.869 colaboradores, ou seja, uma redução de 619 pessoas desde 2017. O banco apresentou também uma melhoria do rácio de eficiência (cost-to-income) de 32 pontos percentuais (de 85,8% para 53,7%) entre 2017 e 2019.

“Durante este período foi possível proceder ao derisking do balanço, reduzindo a atividade não core, o Legacy e os ativos problemáticos”, disse o CEO.

A evolução do Ativo Total do Legacy desde 2017 traduz-se numa redução de 70%, de 14,7 mil milhões para 4,5 mil milhões. A carteira de imóveis que o banco tinha por dação em cumprimento de crédito caiu 37%. Hoje o banco tem imóveis com valor líquido de 1,1 milhões em balanço.

Os activos que estão cobertos pelo mecanismo viram o seu valor diminuir 62% para 3 mil milhões de euros. E o stock de malparado caiu 66% para 3,4 mil milhões de euros, desde 2017.

A redução dos créditos não produtivos (NPL) de -6.700 milhões comparativamente a dezembro de 2017 representa um decréscimo de cerca de 58% no rácio de NPL. O rácio de NPL era de 28,1% (em 2017) e em 2019 fixou-se em 11,8%.

O capital do Novo Banco

O presidente da instituição financeira lembrou que a recapitalização do Novo Banco  já custou 4,5 mil milhões de euros. Aos 2,98 mil milhões de euros já pedidos, que incluem “o capital necessário para o cumprimento dos rácios exigíveis”, adicionam-se os 1.000 milhões injetados pela Lone Star no processo de venda e os 500 milhões de euros obtidos no processo de troca de obrigações LME [‘Liability Management Excercise’].

O banco explicou, ainda ao nível da capitalização, que o requisito mínimo para fundos próprios e passivos elegíveis (MREL), estabelecido pelo Single Resolution Board, do BCE, com base na informação financeira e prudencial de 31 de dezembro de 2018, foi fixado em 17,61% do total do passivo e dos fundos próprios do NB. O requisito MREL representa 26,01% do montante total da exposição a riscos e deve ser integralmente cumprido até 31 de dezembro de 2023.

O banco diz que “o requisito está em linha com as expectativas e consistente com os planos de financiamento”. De realçar que este requisito (MREL) estará sujeito a revisões por parte do regulador, dependendo da sua avaliação da evolução dos negócios, a qual poderá alterar o perfil de risco dos ativos e passivos do banco.

É de lembrar que o Novo Banco tem os seus rácios de Common Equity Tier 1 (CET1) e Tier 1 protegidos em níveis predeterminados até aos montantes das perdas já verificadas nos ativos protegidos pelo Mecanismo de Capital Contingente.

Em 31 dezembro de 2019 o rácio CET1 foi de 13,5% e o rácio de solvabilidade total de 15,1% o que significa um aumento face ao final de 2018.

O BCE, na sua análise (SREP) anual, melhorou as exigências de capital ao NB em função da sua exposição ao risco, em 25 pontos base. O requisito de Pilar 2 a vigorar a partir de 1 de janeiro de 2020 é de 3% comparativamente aos 3,25% exigidos em 2019.

A administração do banco está numa cruzada para absorver a totalidade do Legacy e prevê que essa absorção ocorra este ano. “O turnaround está perto, pretendemos realizá-lo no ano de 2020″, afirmou António Ramalho. “O turnaround é precisamente a absorção total do Legacy”, disse o CEO do banco.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.