O primeiro-ministro francês, François Bayrou, apresenta-se esta segunda-feira, dia 8 de setembro, a uma moção de confiança no Parlamento.
No centro da instabilidade política está a proposta orçamental de Bayrou para combater a dívida pública – que prevê cortes de 44 mil milhões de euros -, e que deverá levar à queda do Executivo minoritário, já que os três maiores partidos da oposição vão rejeitar o voto de confiança.
“Se tivermos uma maioria, o Governo é confirmado. Se não tivermos, o Governo cai”, afirmou o chefe do Executivo francês, quando anunciou a decisão de se submeter à moção de confiança, no final de agosto.
Segundo Bayrou, o “destino de França” é decidido no dia 8 de setembro. “Quase todos os franceses sabem perfeitamente que um país endividado é um país que já não tem a sua soberania, que já não tem a sua liberdade”, afirmou, em declarações à imprensa francesa.
No ano passado, o défice das administrações públicas francesas foi de 5,8 % do produto interno bruto (PIB) – acima dos 3% impostos pela Comissão Europeia -, tendo atingido 113% do PIB. No final do primeiro trimestre de 2025, a dívida pública ascendia a 3 345,8 mil milhões de euros, ou seja, 114 % do PIB.
França e Europa suspensas do equilibrismo político de Macron
A França está, mais uma vez, a caminhar num cabo estreito, esticado a muitos metros do solo, sobre uma realidade política e social em efervescência, num número de equilibrismo extremo protagonizado por Emmanuel Macron.
O primeiro-ministro, François Bayrou, apresentou uma proposta de Orçamento do Estado draconiano para o próximo ano para tentar pôr em ordem as contas públicas. Quer acabar com o feriado de Páscoa e, também, com o 8 de maio, o Dia da Vitória, o que foi entendido como um ataque à identidade social e histórica de França. Propõe um “ano branco”, um congelamento da atualização dos benefícios e escalões fiscais aos níveis deste ano, além de corte em despesas de saúde, nomeadamente aumentando a percentagem dos preços dos medicamentos que os franceses pagam. Reduz serviços e benefícios fiscais. No final, quer poupar 44 mil milhões de euros.
Estas propostas provocaram uma tempestade social, com manifestações nas ruas, e política, com promessas de chumbo da proposta.
“Há muito tempo que França é um caldeirão a ferver. Desde meados de 2024, e depois das legislativas antecipadas, que a instabilidade, uma crescente fragmentação partidária e sucessivos governos marcam o panorama político da segunda maior economia da União Europeia”, diz ao Jornal Económico Paulo Sande, professor na Universidade Católica Portuguesa e especialista em temas europeus. “Com uma Assembleia Nacional dividida entre a esquerda, o centro-direita e a extrema-direita, e depois da queda de Michel Barnier em dezembro, a sobrevivência do governo de François Bayrou parece igualmente estar por um fio”, acrescenta.
Bayrou deverá cair a 8 de setembro, quando apresentar uma moção de confiança, antes da proposta de orçamento ser discutida. Reuniu-se com todos os partidos políticos, mas sem sucesso. A França Insubmissa, o Partido Comunista e os Ecologistas, e até os socialistas, à esquerda, e a União Nacional, à direita, anunciaram que votarão contra. Lutará até ao fim, como prometeu. Seria um golpe de teatro se continuasse em funções.
O próprio Emmanuel Macron já começou a trabalhar no dia seguinte à saída de Bayrou. Esta semana juntou o ainda primeiro-ministro e os líderes dos partidos que suportam o governo: Gabriel Attal, do seu Renaissance, Edouard Philippe, do Horizons, e Bruno Retailleau, dos Les Républicains. Que formem um bloco coeso e que pensem numa base mais alargada, que inclua os socialistas, ressuscitados para a política nas últimas eleições. Os Republicanos já recusaram. “Não podemos ter um acordo governamental com o PS”, acrescentou o presidente do Senado, Gérard Larcher, nas colunas do jornal “Le Parisien”.
Do outro lado, o Partido Socialista veria com bons olhos voltar a nomear ministros, mas tem condições e o orçamento não será, nem por sombras, o de Bayrou.
No dia 9 de setembro, Macron será o alvo prioritário das oposições de esquerda e de direita. A exigência da sua demissão tem vindo a ganhar volume. “As consequências da dissolução surpresa da Assembleia Nacional, que decidiu em 2024, na sequência das eleições europeias, sentem-se ainda e ameaçam acabar mais cedo com o seu mandato”, diz Sande.
Três cenários perigosos
Chegados aqui, mostram-se três cenários para lidar com a crise do governo, “nenhum dos quais promissor”, diz Paulo Sande. Primeiro, a nomeação de um novo primeiro-ministro, o terceiro num ano. “Num parlamento dividido em três blocos irredutíveis e quase inconciliáveis, a esperança de vida de um novo governo seria certamente muito reduzida”, refere. Em segundo lugar, a dissolução da Assembleia Nacional, o que já é possível passado um ano sobre as últimas eleições legislativas, em julho de 2024. “Novas eleições e o futuro dependente do que decidirem os (fortemente descontentes) eleitores franceses”, aponta Sande, que considera este o mais provável.
O terceiro cenário é o da demissão de Emmanuel Macron, pedida pelos líderes da União Nacional, Jordan Bardella, e da França Insubmissa, Jean-Luc Mélenchon.
“Macron tem insistido que irá continuar o seu mandato até ao final, mas acho muito difícil que consiga tal coisa tendo em contra a geometria parlamentar adversa”, diz Tiago André Lopes, professor de Relações Internacionais na Universidade Lusíada. “Arrastar o mandato presidencial por nomeações sucessivas seria o pior cenário, que apenas galvanizaria a extrema-direita e a extrema-esquerda francesa. Um governo tecnocrata seria improvável, porque ficaria à mercê da volatilidade parlamentar e seria difícil encontrar alguém da sociedade civil que aceitasse ser esmagado pela dinâmica política francesa”, acrescenta.
Mesmo assim, considera mais provável que o Presidente francês tente mais um nome e que, falhada a sua confirmação parlamentar, então sim, haveria eleições antecipadas.
“A queda do governo de Bayrou obrigará Macron a agir com rapidez. A questão é saber para quê. Arriscará um novo governo sob a sua égide, arriscará dissolver a Assembleia Nacional sem que seja claro o que de novas eleições possa vir a emergir?”, questiona Sande.
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