A atualização do coeficiente de localização, elemento utilizado para calcular o Valor Patrimonial Tributário (VPT) dos imóveis que serve de base ao Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), vai levar ao agravamento “brutal” deste imposto aplicado nas casas que mais valorizaram nos últimos anos sem que isso tivesse reflexo no valor fiscal registado nas Finanças. O alerta é do presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), Luís Menezes Leitão, que – em declarações ao JE – antecipa que a vai agravar-se a crise na habitação e o preço dos imóveis com a medida pretendida pelo Governo.
“O Governo não deve avançar com a revisão do zonamento para efeitos de IMI para não agravar este imposto. É um risco enorme. Estar a querer aumentar o valor fiscal dos imóveis só vai agravar o seu preço quando o que se pretendia era fazer descer o preço das casas”, avançou ao JE o presidente da ALP. Luís Menezes Leitão antecipa mesmo um “agravamento da crise da habitação” com a revisão do coeficiente de localização que será desencadeada “em breve”, segundo o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF). Isto, diz, “numa altura em que era preciso reduzir os impostos sobre os imóveis como o IMT, e mais ainda o IMI, e acabar com o AIMI”.
Menezes Leitão acrescenta que “muitas câmaras estão a lutar para reduzir o IMI”, cuja taxa varia 0,3% a 0,45%, para os prédios urbanos (casas para habitação e terrenos para construção), e “o governo continua com a voracidade fiscal sem limite”. Explica que o grande impacto que antecipa no IMI, por via da revisão do coeficiente de localização, deve-se ao maior peso deste coeficiente (que varia entre 0,4 e 3,5) na fórmula do VPT que leva em linha de conta outras variáveis como o custo médio de construção por metro quadrado; a área bruta de construção; o coeficiente de afetação (varia entre 0,35 e 1,20); coeficiente de qualidade e conforto (0,5 e 1,7) e coeficiente de vetustez (varia entre 0,4 e 1).
“Se a ideia do governo é aumentar o zonamento, acompanhando a valorização do mercado, tal vai resultar num aumento do valor fiscal dos imóveis, levando a um aumento brutal do imposto [IMI] a pagar”, conclui em reação à medida sinalizada pelo Governo com o SEAF, Nuno Félix, a justificar a revisão do coeficiente de localização com a necessidade corrigir “desalinhamento do VPT dos imóveis”, por forma a refletir a valorização do mercado, após a última revisão que ocorreu em 2015.
Segundo o SEAF, a revisão do zonamento para efeitos de IMI, que devia ter sido feita em 2020, ainda não aconteceu, o que faz com que o valor patrimonial tributário de muitos imóveis esteja desajustado. Nova revisão – que terá de ser feita dentro dos atuais intervalos de 0,4 a 3,5 destes coeficientes – será desencadeada “brevemente”.
“Existe uma comissão a este nível, que é a CNAPU, a Comissão Nacional para a Avaliação dos Prédios Urbanos, que reúne a AT, que reúne representantes dos municípios, dos avaliadores, dos mais diversos “stakeholders”, que têm agora um trabalho a fazer neste domínio ao nível daquilo que é o redesenho do zonamento, mas também ao nível daquilo que é olhar para o valor médio da construção”, sinalizou Nuno Félix em entrevista ao Jornal de Negócios nesta segunda-feira, 23 de outubro. “Um trabalho que a CNAPU desencadeará brevemente”, acrescentou.
O coeficiente de localização é um dos elementos que tem impacto na determinação do VPT de um imóvel, sobre o qual incide o IMI, mas a sua aplicação não é automática, pelo que as mudanças que resultarem do atual processo de revisão apenas serão tidas em conta nas avaliações de imóveis realizadas a partir da data em que se apliquem os novos coeficientes.
O JE questionou as Finanças sobre quando estará concluído este trabalho de revisão, mas até ao fecho desta edição não obteve resposta. Fontes próximas a este processo admitem, contudo, que face à complexidade deste trabalho, a revisão do zonamento para efeitos do IMI deverá estar concluída em 2024, levando a um aumento do imposto no ano seguinte sobretudo nos imóveis localizados na faixa litoral do país como em Lisboa e Porto, onde os preços aumentaram mais nos últimos anos, não refletindo o valor fiscal dos imóveis.
Recorde-se que o cálculo do IMI é feito através da multiplicação do VPT do imóvel pela taxa de IMI. Já as taxas do IMI, que variam entre e 0,3% e 0,45% para os prédios urbanos, são fixadas anualmente pelos municípios da área de localização dos imóveis e comunicadas à AT até 31 de dezembro de cada ano, para aplicação na cobrança do imposto no ano seguinte.
ANMP ainda não foi ouvida para atualização do coeficiente de localização
O JE contactou a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) sobre a proposta de revisão dos coeficientes de localização que foi entregue ao Governo em2019 e não chegou a avançar em 2020 com a pandemia, tendo fonte oficial avançado que a associação não foi contactada para aquela revisão no mandato da nova presidente da ANMP, Luis Salgueiro, que substituiu Manuel Machado, em dezembro de 2021.
A CNAPU é presidida pela diretora-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira e constituída por representantes da associação nacional de municípios, das associações de inquilinos, de proprietários e de construtores, das empresas de mediação imobiliária e ainda um representante dos avaliadores.
As propostas de atualização dos coeficientes de localização são apresentadas pela Associação Nacional de Municípios Portugueses à CNAPU, que as valida e submete à aprovação do Governo.
A alteração dos VPT em função de novos coeficientes de localização apenas ocorrerá para imóveis novos ou para os que sejam alvo obras de modificação ou reconstrução, de mudança de afetação ou ainda na sequência de uma nova avaliação.
Proposta de revisão concluída em 2019 não foi aplicada
Em 2019, foi concluída uma proposta de revisão dos coeficientes de localização, que servem de referência na determinação do VPT e que podem influenciar o IMI.
Na altura, a proposta da CNAPU chegou a ser submetida à apreciação do Governo e vários elementos representados nesta Comissão adiantaram que para várias zonas de concelhos situados na faixa litoral foi proposto um agravamento dos coeficientes de localização, sobretudo daqueles que se encontravam em valores intermédios.
Em Lisboa e no Porto houve vários casos em que se registou um agravamento destes coeficientes, por exemplo, em toda a zona ribeirinha – com destaque para a área da Expo –, na Baixa, nas Avenidas Novas, em Campo de Ourique e em Telheiras. E o mesmo sucedeu com algumas zonas de cidades limítrofes, bem como no Porto, haverá subidas, mas menos expressivas, nomeadamente na zona da Foz, Hospital de São João e Gaia.
Em algumas zonas do interior do país, pelo contrário, a proposta da CNAPU foi no sentido de reduzir alguns dos coeficientes de localização. Este desagravamento teve em conta o comportamento dos preços das transações de imóveis nestas zonas observados desde 2015. A proposta da CNAPU será agora submetida à apreciação do Governo.
O Código do IMI prevê que, a cada três anos, a CNAPU proponha ao Governo os coeficientes de localização máximos e mínimos a aplicar em cada município, tendo a última revisão ocorrido em 2015 e sido incorporada nas avaliações realizadas de 2016 em diante.
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