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Juros, um barril de pólvora?

O impacto dos juros e da inflação nas famílias poderá ser desastroso, especialmente naquelas que não tem capacidade para poupar parte do seu rendimento mensal.
10 Outubro 2022, 07h15

A recente conjuntura económica internacional tem provocado altos níveis de inflação que são anormais em contexto europeu. Face à impossibilidade de determinar a inflação, os bancos centrais utilizam a chamada política monetária convencional aumentando as taxas de juro diretoras, com o objetivo de arrefecer a economia e diminuir o ímpeto inflacionista, levando eventualmente a uma recessão económica. A problemática que daí decorre é precisamente a mexida nos juros, que tem inevitavelmente impactos em vários agentes económicos, nomeadamente nas famílias que possuam créditos à habitação, automóvel ou ao consumo.

No caso do crédito à habitação, a taxa de juro de referência nos contratos é a EURIBOR normalmente a seis meses. Desde os últimos anos até ao início de 2022 a EURIBOR adotava valores negativos, o que significava que as famílias tinham acesso a créditos “baratos”, com encargos financeiros baixos, levando a uma comercialização massificada deste tipo de serviço por parte dos bancos, traduzindo-se (não só por este motivo) num aumento generalizado dos preços da habitação. Hoje em dia as regras na contratação de crédito à habitação estão mais apertadas do que antes da última crise, com os bancos a emprestar regra geral 90% do valor de aquisição e a terem de ser cumpridos limites às taxas de esforço. Contudo as taxas de esforço quando são calculadas não tem em conta estes níveis de inflação, que se caracterizam por uma quebra acentuada do poder de compra (gasta-se muito mais para comprar as mesmas coisas).

O impacto dos juros e da inflação nas famílias poderá ser desastroso, especialmente naquelas que não tem capacidade para poupar parte do seu rendimento mensal. Vejamos o seguinte exemplo abstrato de uma família que contraiu um empréstimo de 100.000 euros, com um prazo de 30 anos, um spread (lucro do banco) de 1,20% e com EURIBOR a seis meses. No início do ano com a taxa a -0,539% esta família pagaria uma prestação mensal de 306 euros. Durante o mês de Setembro já com a taxa a 1,851% a prestação seria de 424 euros (mais 118 euros mensais). Caso a taxa chegue a 3,00% a prestação mensal passaria para 489 euros (mais 183 euros que inicialmente). Noutro exemplo com um valor de empréstimo de 200.000 euros, com as mesmas condições do exemplo anterior, no início do ano pagavam uma prestação mensal de 613 euros com taxa negativa, em setembro 849 euros, e caso a taxa chegue a 3,00% a prestação passaria para 978 euros, um incremento de 365 euros mensais.

As famílias que já conseguiram abater uma parte substancial dos juros dos seus créditos à habitação terão um impacto muito menor. Contudo as que contraíram os empréstimos há pouco tempo, terão impactos fortes, desde a perda de poder de compra a um aumento substancial da prestação da casa, para um salário nominal que se mantém igual, que poderão levar ao descalabro de muitas famílias. Se isto acontecer teremos alguma quebra no preço dos imóveis.

A mitigação deste problema passa sempre por falar antecipadamente com o banco de forma a tentar negociar outros termos que aliviem o encargo para as famílias.

Vivemos em tempos conturbados com muitas questões que pairam no ar. Até quanto é que vão aumentar os juros? Quando é que abranda a inflação? Iremos entrar em recessão? São maioritariamente questões de quando e quanto, porque sabemos que as economias são cíclicas com períodos bons e períodos maus, restando-nos enquanto sociedade arranjar formas para mitigar os maus.

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