Há que adorar as avaliações que Bruxelas faz da execução dos fundos comunitários. Os governos dos Estados-membros já gostam de olhar para os números com óculos de lentes cor-de-rosa, vendo borboletas, unicórnios e cascatas de laranjada em cada canto, mas o executivo comunitário eleva o “wishful thinking” a um nível estratosférico.

Diz a Comissão Europeia que as “reformas” e os investimentos previstos em Portugal ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) podem, num prazo de seis anos, gerar uma riqueza adicional na economia portuguesa na ordem dos seis mil milhões de euros (entre 3% e 3,5% do PIB). Nada mau.

Agora as más notícias: essa riqueza adicional “só” se concretizará se a economia portuguesa fizer um pequenino ajuste, uma insignificância, um soluço impercetível que dá pelo nome de “produtividade aumentada”.

Ora, segundo números do Eurostat, no ranking europeu de produtividade Portugal está no fundo da lista, em 18º numa lista de 20 países na Zona Euro. A produtividade de Portugal representa 72,1% dos níveis registados na Zona Euro, liderada neste capítulo pela Irlanda (216,3%). Abaixo de nós só a Eslováquia (71,1%) e a Grécia (66,4%).

Mas isso pode melhorar agora, nestes seis anos, certo? Talvez não. É que este nível de produtividade de Portugal mantém-se praticamente inalterado, nos 72%, desde 2012, há mais de uma década. Isto apesar dos milhares de milhões de euros de fundos comunitários captados e executados por Portugal anos a fio.

Talvez a questão da produtividade seja demasiado enfadonha para ser introduzida nos debates dos candidatos a primeiro-ministro. Talvez seja mais fácil atirar críticas sobre o aumento ou o corte da carga fiscal. Talvez ninguém queira dizer algo que deveria ser um imperativo nacional: vamos fazer com que Portugal deixe de ser um país da coesão, que recebe fundos comunitários, e vamos torná-lo um país suficientemente produtivo para ser contribuinte.

Vamos estudar cada euro que chegou e verificar em quantos se multiplicou. Vamos ver que projetos foram pedras angulares e quais foram pedras na engrenagem. Vamos pedir responsabilidades e vamos escolher melhor no futuro.

Em vez disto estamos a discutir a avó da Mariana, a fórmula mágica do Paulo para subir os salários, as contradições do Pedro, os tabus do Luís e os rateres de mota do André. Também é necessário, claro, além de divertir. Mas nenhum deles é o ponto essencial.