A espaços surgem no espaço público estudos, relatórios, investigações, que avaliam a progressão, ou a regressão, da liberdade dos povos e dos regimes democráticos, neste mundo em temos todos que viver e, sobretudo, conviver.
Com diferentes critérios, partindo de pressupostos diferentes e, creio, todos bem-intencionados, são unânimes nalgumas conclusões:
- Há um recuo generalizado dos países em que os cidadãos gozam de liberdade plena;
- Mais de metade da humanidade vive em países cujos regimes políticos podem ser caracterizados como autoritários;
- Parece existir uma tendência para a instalação e perpetuação no poder de “homens fortes” que se socorrem de alguns instrumentos formalmente democráticos para se legitimar;
- As tentações de governar de forma autoritária não são um exclusivo de estados que habitualmente qualificamos como não democráticos.
Vivemos hoje em sociedades mais complexas do que aquelas em que os da minha geração se formaram. O mundo que porventura nunca foi a preto e branco, hoje é-o menos. É por isso mais exigente, exige mais de cada um de nós.
De cada um de nós enquanto cidadão que quer exercer a cidadania. Dos dirigentes políticos que não podem olvidar a sua dimensão de exemplo e de pedagogos da liberdade e da democracia.
É por isso que é tão perigoso ver países estruturalmente democráticos liderados por quem, sem pudor, se serve da mentira para fazer vingar as suas posições, quantas vezes posições autoritárias.
É por isso que é tão perigoso que a agenda pública seja absorvida por relevantes questões como o clima, a pandemia, ou a saúde, sem que os fundamentos do nosso modo de viver colectivo sejam discutidos. Pior, que não se diga claramente que sem estes, aqueles temas deixam de fazer sentido.
Ter a felicidade de viver num país livre, integrado na mais livre região do mundo deve ser o aguilhão que, a cada momento, nos desperta para as ameaças.
Os descontentes e marginalizados do desenvolvimento, os migrantes que procuram igualdade, a incapacidade de manter as relações sociais e familiares tradicionais, os guetos que povoam as nossas cidades, as pequenas ambições quotidianas que não se conseguem satisfazer, as periferias que de geográficas passaram a socioeconómicas, os territórios desertificados e progressivamente desumanizados.
Viver em liberdade, com a legítima ambição de construir e mudar a vida não é um luxo.
É o adubo e o suporte dos regimes democráticos.
Não há democracia sem diversidade e sem inclusão.
A liberdade impõe-nos que, como disse Churchill, os povos, todos os povos, se reconheçam, ou se reconciliem, com “o pior dos regimes, à excepção de todos os outros”.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.