“O que ouvimos é uma tristeza introspectiva lenta e delicada, quase um desespero, excepto de Elvin [Jones, baterista], que se ergue ao fundo como um elemento sobrenatural, um trovão a formar-se, uma nuvem de tormenta, um grito de guerra. Como um todo, é um assustador retrato emocional de um lugar – os sentimentos desses músicos.”
Este excerto do texto sobre o disco saído do espetáculo ao vivo de John Coltrane no Birdland e a música “Alabama” dá bem a nota sobre a beleza que se pode encontrar deambulando por Nova Iorque e pelos seus clubes de Jazz, lofts e cafés, experiência a que um viajante pela Grande Maçã não deve escapar. Sem ela, não se conhece Nova Iorque, não se conhecem os EUA.
“Música Negra” é um dos mais livres e radicais exercícios de crítica musical. Nesta reunião de ensaios, recensões, crónicas e considerações pessoais, Amiri Baraka retrata a florescente cena do free jazz norte-americano dos anos 60. Num registo vívido e eletrizante, Baraka traduz em palavras a liberdade de improvisação de um género que só pode ser entendido enquanto expressão de uma atitude sobre o mundo, e não apenas como uma forma de fazer música.
É dessa expressão única e autêntica da cultura afro-americana que surgem músicos singulares e revolucionários como John Coltrane, Thelonious Monk, Miles Davis, Ornette Coleman, Cecil Taylor, Archie Shepp e Sun Ra.
LeRoi Jones, mais tarde Amiri Baraka (1934-2014), foi poeta, dramaturgo, crítico de música, professor, ativista político e uma das vozes proeminentes da cultura norte-americana da segunda metade do século XX. Depois de terminar os estudos, Jones integrou a Força Aérea dos EUA, tendo sido dispensado ao fim de três anos por suspeita (que se provou errada) de ter simpatias comunistas.
Figura central do movimento beatnik dos anos 50 e do Black Power nas décadas posteriores, Amiri Baraka evidenciou-se pelo seu estilo inflamado e controverso, tendo contribuído para uma nova consciência do que significava ser negro nos Estados Unidos. Em 1958, fundou a revista de poesia “Yugen”, onde foram publicados textos de Allen Ginsberg ou Jack Kerouac.
LeRoi Jones escreveu numerosos artigos e ensaios sobre racismo, colonialismo e música afro-americana, tema a que se dedicou com maior empenho depois da morte de Malcolm X, em 1965. A sua posição de proeminente poeta seria posta em causa após a publicação de um poema, em 2001, onde insinuava que Israel teria tido conhecimento antecipado dos ataques de 11 de setembro desse ano.
Polémicas à parte, Amiri Baraka recebeu vários prémios pelo seu trabalho, incluindo o prestigiado PEN/Faulkner Award, e, com este livro, leva-nos por um belo passeio pela música e, portanto, por uma das componentes mais fascinantes da cultura norte-americana.
Uma edição Orfeu Negro que é também a sugestão de leitura desta semana da livraria Palavra de Viajante.
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