A Navigator realizou a 18ª edição do Fórum da Sustentabilidade em novembro passado. Quais os desafios discutidos, isto numa altura em que 2030 está mais perto?
Como sabemos, o ano de 2030 fechará um período a que se chamou Década de Ação, focado na capacidade de os países-membros das Nações Unidas cumprirem os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
A proximidade de 2030 intensifica a urgência em abordar questões centrais como as novas regras europeias de reporte de sustentabilidade, as tendências do contexto global e o seu efeito nas estratégias de sustentabilidade das empresas ou a dupla materialidade na resposta às crescentes exigências de transparência no reporte de informação não financeira, ou informação ESG (ambiental, social e de governo societário).
Tendo presente que estamos a meio desse horizonte temporal, dedicámos a 18ª sessão do Fórum de Sustentabilidade da Navigator ao tema “Agenda 2030 de Gestão Responsável – compromisso com o futuro”. Este foi um momento essencial de reunir especialistas nacionais e internacionais num debate enriquecedor sobre as exigências empresariais no contexto de macrotendências e desafios globais em constante transformação. Além disso, proporcionou a oportunidade para refletirmos sobre o papel das empresas no contributo para os ODS e para partilharmos com a audiência o nosso compromisso contínuo com a sustentabilidade, que é um pilar central da nossa estratégia de negócio.
Com o desafio da sustentabilidade em constante alteração, ainda faz sentido falar-se deste tema a um prazo de cinco ou 10 anos, em vez do ‘agora’?
A sustentabilidade exige uma abordagem que equilibre o presente com uma visão de longo prazo. Ações imediatas são essenciais para enfrentar os desafios mais urgentes e iniciar as transformações necessárias, mas a estratégia e as metas têm de ser de médio-longo prazo para garantir o desenvolvimento contínuo de tecnologias, modelos de negócio e investimentos que mitiguem riscos, potenciem oportunidades e criem um impacto positivo duradouro.
Por exemplo, transformações complexas e estruturais, como as associadas à transição energética e à gestão sustentável de recursos, dependem de um planeamento estratégico que se projete para o futuro, sempre guiado por objetivos concretos e ambiciosos, e que permita à empresa, perante alterações de contexto aceleradas ou difíceis de prever, ir fazendo as adaptações necessárias ao longo do caminho. Só assim poderemos garantir a resiliência do negócio.
A Navigator é uma das empresas portuguesas que se tem destacado pelas práticas sustentáveis. Quais os objetivos específicos que a empresa definiu em relação à Agenda 2030 da ONU?
Os resultados alcançados pela Navigator refletem uma estratégia em que a sustentabilidade é um valor essencial e uma parte integral do nosso modelo de negócio. Este compromisso com a sustentabilidade é assumido de forma clara e ambiciosa na nossa Agenda 2030, uma Agenda de Gestão Responsável do Negócio orientada pelo nosso propósito corporativo – “são as pessoas, a sua qualidade de vida e o futuro do planeta que nos inspiram e nos movem” – e desenhada com base numa análise de macrotendências globais e desafios para o negócio, e no contributo dos nossos stakeholders. Esta agenda foi construída com base no referencial dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas e está alicerçada em dois pilares estratégicos – “Sociedade” e “Clima e Natureza” -, através dos quais a Navigator assume um conjunto de 21 compromissos, que passam, por exemplo, pelo desenvolvimento de uma nova geração de bioprodutos sustentáveis, para reduzir a dependência de recursos fósseis, ou o investimento na mitigação das alterações climáticas, ambos contribuindo para a promoção de uma bioeconomia circular e de baixo carbono.
Neste percurso, as florestas plantadas que gerimos ao longo de cerca de 109 mil hectares em todo o país estão na origem não só de bens e serviços valorizados pelo mercado, mas também de externalidades positivas que as nossas práticas de gestão sustentável potenciam, tais como o sequestro de carbono, ou a promoção da biodiversidade.
De que forma é que a Navigator está a melhorar o seu rating de ESG?
A Navigator tem intensificado os seus esforços para melhorar a sua performance ESG, focando-se em várias frentes, como investimentos em eficiência energética, inovação de produto e a adoção de práticas avançadas de gestão de pessoas e de governo da empresa. Para guiar e monitorizar o progresso face aos compromissos estabelecidos na nossa Agenda 2030, definimos o Roteiro 2030, uma ferramenta corporativa que nos permite acompanhar eficazmente o desempenho na gestão de impactes ambientais, sociais e de governança. Este roteiro é composto por objetivos claros e indicadores de progresso, promovendo a criação de valor sustentável e contribuindo para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Além disso, adotamos referenciais globais que apoiam e validam a nossa estratégia de sustentabilidade. Seguimos o GHG Protocol para calcular o nosso inventário de emissões e submetemos as nossas metas climáticas à Science Based Targets Initiative (SBTi). Incorporamos as recomendações da Task Force on Climate-related Financial Disclosures (TCFD), e estamos comprometidos com o United Nations Global Compact. Estes passos fortalecem a nossa gestão de riscos ESG e consolidam o nosso compromisso com as melhores práticas de um disclosure de informação transparente e responsável, o que se traduz, naturalmente, em boas avaliações neste tipo de ratings.
É público que a Navigator tem vindo a reforçar o investimento em projetos sustentáveis. É expectável que o volume de investimento neste âmbito se mantenha ou voltará a ser reforçado?
Só nos primeiros nove meses de 2024 o montante total de investimentos ascendeu a 151 milhões de euros, dos quais cerca de 81 milhões classificados como investimentos de cariz sustentável – o que representa 53% do nosso investimento total. Este compromisso abrange, sobretudo, iniciativas de descarbonização, modernização de equipamentos e instalações, e melhorias na eficiência operacional, assegurando valor acrescentado e alinhamento com as metas de sustentabilidade da Navigator.
Apenas para dar alguns exemplos, todas as fábricas têm planos de ação de eficiência energética e nos últimos cinco anos, investimos também mais de oito milhões de euros na eficiência energética nos nossos quatro complexos industriais em Portugal, que se traduziram numa poupança de aproximadamente 100 GWh/ano e permitiram evitar 23 mil toneladas de emissões de CO₂. Atuamos, igualmente, na eficiência hídrica, com um investimento de mais de 25 milhões de euros em projetos para reduzir o uso de água e promover a sua recirculação.
Paralelamente, investimos continuamente em inovação e I&D. Estamos a desenvolver e a fabricar novas soluções e produtos de elevado valor acrescentado que posicionam Portugal na vanguarda da bioindústria de base florestal.
A empresa tem feito alguns investimentos de cariz ambiental, nomeadamente em Setúbal e na Figueira da Foz. Quais os resultados esperados?
Os investimentos ambientais da Navigator em Setúbal e na Figueira da Foz reforçam o compromisso da empresa com a transição para uma economia de baixo carbono, proporcionando benefícios concretos tanto para a sustentabilidade como para a eficiência energética das suas operações.
Um dos principais projetos em curso é a instalação de uma caldeira de recuperação de alta eficiência no Complexo Industrial de Setúbal, com uma redução esperada de 136 mil toneladas de emissões de CO₂ anuais, o equivalente a 25% das emissões totais do Grupo em 2022. Este investimento é crucial para o nosso roteiro de descarbonização.
Além disso, a nova central fotovoltaica no Complexo Industrial da Figueira da Foz, prestes a entrar em operação, permitirá abastecer mais 4% das necessidades daquele complexo industrial, evitando mais de 7 mil toneladas de CO₂ por ano.
Recordo que a Navigator foi pioneira em Portugal, e uma das primeiras a nível mundial, na definição de um ambicioso compromisso de descarbonização dos seus complexos industriais até 2035, antecipando em 15 anos as metas nacionais e europeias. Em 2023, fruto dos investimentos realizados, a Navigator decidiu antecipar em três anos as suas metas intermédias de redução de emissões diretas CELE, pelo que irá alcançar, já em 2026, os objetivos inicialmente previstos para 2029. Em 2026 estas emissões diretas de CO2 fóssil serão cerca de 60% inferiores às de 2018, o ano de referência.
Que inovações é que a Navigator está a promover para atingir as suas metas sustentáveis?
A investigação, a inovação e a capacidade de industrialização do conhecimento representam os elementos mais estruturantes da identidade da The Navigator Company. Conscientes da relevância do conhecimento científico e tecnológico para as nossas atividades, criámos, em 1996, o nosso próprio centro de I&D, em parceria com universidades portuguesas: o RAIZ – Instituto de Investigação da Floresta e Papel. A investigação desenvolvida no RAIZ cobre toda a cadeia de valor, da floresta ao produto final, passando pelo processo industrial.
Numa altura em que a sociedade procura novos modelos de desenvolvimento mais sustentável, temos consolidado a nossa estratégia de inovação ao criar uma nova geração de bioprodutos sustentáveis, em linha com os nossos objetivos de descarbonização e de transição para uma bioeconomia, reduzindo a dependência de recursos fósseis. Para além de produtos papeleiros e energia, estamos a trabalhar na disponibilização de novos produtos celulósicos e biocompósitos. No nosso pipeline de inovação incluem-se bioprodutos para embalagem, higiene e cuidados pessoais, cosméticos, nutracêuticos, aditivos alimentares e saúde.
Um dos exemplos mais importantes é o da inovação em matéria de embalagens sustentáveis. No final de 2020, foi lançada uma nova linha de produtos de embalagem, através da marca gKRAFT™, apresentada no ano seguinte, com o objetivo de contribuir para acelerar a transição do uso do plástico para a utilização de fibras naturais, sustentáveis, recicláveis e biodegradáveis; recentemente, a Navigator iniciou a produção na nova unidade industrial de embalagens de celulose moldada, localizada em Aveiro, tornando-se assim a primeira empresa no mundo a produzir este tipo de embalagens numa unidade verticalmente integrada a partir de fibra de eucalipto. Esta nova linha, não só responde à necessidade global de reduzir o uso de plásticos descartáveis, como demonstra, uma vez mais, que é possível conciliar a proteção ambiental com eficiência e rentabilidade.
Que desafios é que a empresa tem enfrentado na implementação das iniciativas de sustentabilidade, e como está a superar esses obstáculos?
A implementação de iniciativas de sustentabilidade traz desafios que exigem uma abordagem integrada e contínua e, em grande parte, os desafios que se colocam à Navigator são comuns às restantes empresas. A necessidade de recolha e disponibilidade de uma enorme quantidade de dados, o acompanhamento dos diversos frameworks, obrigatórios ou não, de apuramento e reporte de informação de sustentabilidade que estão em mudança, e o envolvimento de todos os atores ao logo da cadeia de valor na partilha das mesmas exigências e responsabilidades, requerem das empresas um esforço permanente de otimização de processos, de desenvolvimento de equipas e soluções tecnológicas, e de atuação de proximidade junto de fornecedores e clientes.
O ESG ainda é visto de lado, e muitas vezes fala-se no greenwashing dos resultados apresentados. O ESG deve ser visto como vantagem competitiva ou como uma limitação?
No caso da Navigator, a sustentabilidade integra a nossa visão estratégica de negócio enquanto conceito que promove o equilíbrio no longo prazo entre três pilares essenciais – económico, ambiental e social – e condição indispensável para que um modelo de desenvolvimento que consegue suprir as necessidades do presente sem
comprometer o futuro das Pessoas e do Planeta. Porque a sustentabilidade orienta e é um dos valores fundacionais do nosso negócio, avaliamos continuamente a nossa performance através de um framework ESG, de caráter instrumental. Não confundimos conceitos de sustentabilidade e ESG, usamos o último para concretizar o primeiro. Nesta medida, podemos afirmar que encaramos a gestão de riscos ESG como uma oportunidade e uma vantagem competitiva na nossa jornada enquanto bioindústria no lado certo do futuro, cuidando das nossas áreas de negócio atuais e da nossa solidez financeira, e, em simultâneo, incrementando os investimentos estratégicos da Empresa.
As regras europeias vão voltar a apertar. Na visão da Navigator, quais os desafios que as empresas enfrentam com as novas exigências da Europa de reporte de sustentabilidade?
As novas normas europeias de reporte de sustentabilidade, como a Diretiva de Relato Corporativo de Sustentabilidade (CSRD), representam um desafio significativo e multifacetado para as empresas, principalmente pela complexidade na recolha de informação e processamento de dados ESG, mas, também, pela necessidade de envolvimento de toda a estrutura.
Atenta às transformações constantes do mundo em que vivemos, a Navigator avançou, logo no último trimestre de 2022, com um processo de revisão dos tópicos materiais da sua Agenda 2030 de Negócio Responsável, seguindo os princípios da “dupla materialidade”, de acordo com as indicações da Global Reporting Initiative (GRI) e antecipando a Diretiva sobre o Reporte Corporativo de Sustentabilidade da Comissão Europeia, que foi publicada no começo de 2023. Este processo envolveu um levantamento extenso, partindo de análises anteriores que contaram com a contribuição de cerca de 600 stakeholders internos e externos, especialistas nas suas atividades e negócios, bem como a Comissão Executiva e uma equipa externa de peritos em matérias de sustentabilidade. Em preparação do próximo relato de sustentabilidade, estamos, neste momento, a realizar uma nova revisão de materialidade, agora com um nível maior de granularidade.
Estes processos, que não são estáticos e requerem acompanhamento e supervisão sistemáticos, são bem elucidativos da complexidade destes temas e do envolvimento necessário de toda a organização.
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